Serviços de assistência da EDP e da Galp entre o inútil e o "abusivo"

Condições dos contratos EDP Funciona e Galp Confort são desajustados às necessidades de muitos clientes e contêm várias cláusulas consideradas abusivas. A fiscalização parece cair “em terra de ninguém”.

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Serviços de reparação das duas empresas têm gerado queixas na Deco nelson garrido

As duas maiores comercializadoras de electricidade e gás, a EDP e a Galp Energia, estão a vender serviços de assistência técnica, incluindo de reparação de electrodomésticos, cujos contratos têm inúmeras exclusões, como as de não abranger equipamentos dentro da garantia ou já com algum tempo de utilização, o que limita muito a sua validade. Os contratos têm ainda cláusulas, como a da renovação automática ou a da alteração unilateral de condições, incluindo o preço, que são prejudiciais para os consumidores, segundo juristas consultados pelo PÚBLICO.

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As duas maiores comercializadoras de electricidade e gás, a EDP e a Galp Energia, estão a vender serviços de assistência técnica, incluindo de reparação de electrodomésticos, cujos contratos têm inúmeras exclusões, como as de não abranger equipamentos dentro da garantia ou já com algum tempo de utilização, o que limita muito a sua validade. Os contratos têm ainda cláusulas, como a da renovação automática ou a da alteração unilateral de condições, incluindo o preço, que são prejudiciais para os consumidores, segundo juristas consultados pelo PÚBLICO.

O pacote de “serviço mínimos” do EDP Funciona tem um custo anual de 94,8 euros (7,90 euros mensais) e o mais completo, que inclui revisão de caldeira e do ar condicionado, de 262,8 euros (21,90 mensais). A Galp tem duas ofertas, o Comfort Home, com um custo anual de 46,80 euros (3,90 euros mensais) e o Galp Comfort Care (assistência gás), a 70,80 euros anuais (5,90 mensais).

O EDP Funciona garante a revisão das instalações de gás e electricidade, assistência técnica em caso de avaria e, nos pacotes mais caros, serviços urgentes. Na assistência a electrodomésticos, onde há um período de carência nos primeiros 30 dias, as deslocações do técnico e a mão-de-obra são gratuitos até ao limite de 600 euros ou de três serviços por ano.
Entre a lista de exclusões, bem mais longa que os serviços abrangidos, está a não reparação de avarias provocadas por falta de manutenção do equipamento e quando se considere economicamente inviável, ou seja, quando o valor do arranjo é superior ao do valor comercial do equipamento.

Também estão excluídas avarias provocadas por agentes externos (roedores, aves, aranhas (...), fenómenos atmosféricos e ou geológicos, assim como as derivadas de pressão de água excessiva, e alimentação eléctrica inadequada). O serviço de urgências também inclui várias exclusões, como as intervenções em situações em que não exista risco iminente e elevado de perda de bens na instalação do cliente.

Em traços gerais, o Galp Comfort Home garante a deslocação gratuita de um profissional a casa para serviços de canalização, electricidade, serralharia, electrodomésticos (exceptos fornos, micro-ondas, placas e pequenos electrodomésticos), televisores e pequenas obras. Também pode incluir assistência a instalações de gás natural e disponibiliza ainda assistência informática, por exemplo. A deslocação do técnico é gratuita, assim como as primeiras duas horas de trabalho.O serviço de urgência pode ser requisitado em risco de inundação, quebra de vidros, extravio e roubo de chaves, entre outros. Nas exclusões, nenhum bem será reparado se estiver dentro da garantia.

Informação enganosa

Os serviços das duas operadoras são assegurados por empresas externas e são, habitualmente, comercializados juntamente com os contratos de fornecimento de gás e electricidade. Estão muitas vezes associados a períodos iniciais sem custos ou com descontos.

Partindo das reclamações que chegam à Deco, Carolina Gouveia não tem dúvidas de que a comercialização destes produtos configura, muitas vezes, “vendas agressivas, com clara falta de informação ou mesmo informação enganosa”. A jurista da associação de defesa do consumidor destaca que muitos clientes não se recordam de terem subscritos os serviços e o facto de os custos destes produtos aparecerem na factura geral de gás ou electricidade, “quase escondidos”, diminui a percepção quanto a custos. 

Em resposta ao PÚBLICO, as empresas rejeitam que os seus contratos tenham cláusulas abusivas e frisam que a relação com os clientes se pauta pela “transparência”. A Galp assegurou que “antes de formalizarem a contratação, os clientes recebem informação adequada para compreenderem os serviços que estão a adquirir”. A EDP frisou que tem vários “mecanismos de proteção do cliente”, como o SMS de pedido de confirmação de adesão ao Funciona em todas as vendas que realiza.

A Deco também diz que o facto destes serviços estarem na factura da energia cria problemas aos consumidores quando os querem cancelar ou mudar de operador, sendo obrigados a pagar até ao fim do prazo. “Há casos de clientes que deixam de pagar a factura de energia, garantindo que não subscreveram o produto, e é-lhes cortado o fornecimento de gás ou electricidade”, refere Carolina Gouveia.

“Quando o cliente não está de acordo com os valores de serviços complementares pode reclamar e pagar apenas a parte da energia”, diz a Galp, assegurando que “não corta o fornecimento de energia por falta de pagamento” dos outros serviços. “Nunca existe interrupção do serviço de fornecimento de energia (...) desde que o cliente liquide os valores relativos a estes fornecimentos”, frisa a EDP. A separação das facturas tem sido uma das reivindicações da Deco, a que o regulador, a ERSE, ainda não deu resposta. A EDP e a Galp notam que a factura única visa a comodidade dos clientes.

Os contratos das duas operadoras não são totalmente comparáveis, mas ambos têm cláusulas que “não são benéficas para o consumidor”, de acordo com análise feita para o PÚBLICO por Sara Luísa Gouveia, especialista em direito do consumidor. A jurista alerta para o facto de as duas operadores não garantirem a prestação do serviço, uma vez que funcionam como meros angariadores de terceiros. As situações mais graves, que podem configurar cláusulas abusivas, prendem-se com a possibilidade de os dois contratos poderem ser modificados, substituídos ou extintos unilateralmente pelo prestador do serviço.

No caso da EDP, as alterações serão comunicadas com uma antecedência de apenas cinco dias úteis antes da alteração, e o cliente tem apenas cinco dias para exercer o direito de rescisão (terminar o contrato). Se não exercer esse direito, considera-se renovado. Na Galp, as alterações nem sequer são comunicadas ao cliente, “o que é prejudicial para o consumidor, porque não oferece nenhuma certeza sobre o que é que o consumidor está, de facto, a contratar”, destaca a especialista, acrescentando que, “por ironia, pode dizer-se que é um contrato em transformação”.

Os preços também podem ser alterados unilateralmente, sendo que na EDP considera-se aceite a alteração se, no prazo de 20 dias a contar da comunicação, o cliente não proceder à rescisão. Na Galp, a actualização do preço deve ser comunicada por escrito ao consumidor com a antecedência mínima de dois meses relativamente ao termo do prazo inicial ou de prorrogação do contrato em curso.

A especialista em direito do consumidor considera ainda prejudicial para o consumidor a renovação automática dos dois contratos por idêntico período (12 meses), caso nenhuma das partes o termine com a antecedência mínima de 30 dias. Recorda que a legislação estabelece como “abusivas as cláusulas que têm como objectivo ou efeito renovar automaticamente um contrato de duração determinada na falta de comunicação em contrário por parte do consumidor. A Galp defende que este prazo corresponde a uma “prática normal no sector”. A EDP garante que “aceita pedidos” de não renovação mesmo já depois dos 30 dias.

Factura “segura” só para alguns

Associado ao contrato de fornecimento de energia, a EDP comercializa ainda um outro produto, a que chama de Factura Segura, e que consiste num seguro de pagamento da electricidade em caso de morte acidental, invalidez absoluta e definitiva, desemprego involuntário, entre outras situações. O seguro custa 1,40 euros por mês (16,8 euros por ano) e está limitado a um plafond que depende de factores, como a idade, ou o tipo de sinistro. As exclusões incluem duas situações particularmente penalizadoras, e para as quais, de acordo com as queixas chegadas à Deco, os clientes não são devidamente alertados, embora constem da apólice: o seguro não poder ser accionado no caso de desemprego por mútuo acordo ou por caducidade do contrato de trabalho a termo.