Paulo Núncio empurra a responsabilidade dos offshores para a AT

O antigo secretário de Estado diz que a Autoridade Tributária tinha autonomia para publicar os dados relativos às transferências de quase 10 mil milhões de euros.

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Paulo Núncio é ouvido pelo Parlamento na próxima quarta-feira Enric Vives-Rubio

Depois de ter sido dito ao PÚBLICO que “o importante é olhar à substância” e que “a divulgação das estatísticas nada tem a ver com o tratamento e a utilização efectiva da informação sobre transferências para paraísos fiscais por parte da inspecção da Autoridade Tributária (AT)”, Paulo Núncio, antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, remete para a AT a decisão de não divulgar as estatísticas relativas às transferências para offshores no valor de quase 10 mil milhões de euros, realizadas entre 2011 e 2014, para contas sediadas em paraísos fiscais que não foram alvo de qualquer tratamento por parte do Fisco, conforme o que o PÚBLICO noticiou.

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Depois de ter sido dito ao PÚBLICO que “o importante é olhar à substância” e que “a divulgação das estatísticas nada tem a ver com o tratamento e a utilização efectiva da informação sobre transferências para paraísos fiscais por parte da inspecção da Autoridade Tributária (AT)”, Paulo Núncio, antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, remete para a AT a decisão de não divulgar as estatísticas relativas às transferências para offshores no valor de quase 10 mil milhões de euros, realizadas entre 2011 e 2014, para contas sediadas em paraísos fiscais que não foram alvo de qualquer tratamento por parte do Fisco, conforme o que o PÚBLICO noticiou.

“A divulgação não estava dependente de aprovação expressa a posteriori do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais”, responde o antigo responsável pela tutela da pasta do fisco, em declarações ao Diário de Notícias, argumentando que a instituição aduaneira e tributária tinha autonomia para avançar.

Paulo Núncio, actual consultor da sociedade Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados, reconhece a existência um despacho que obriga a divulgação no Portal das Finanças de estatísticas com os dados enviados pelos bancos e instituições financeiras ao Fisco, mas recorre a ele mesmo para justificar a ausência de indicação para a publicação dessas transferências.

"O despacho do meu antecessor [Sérgio Vasques] determina que a DGCI [actual AT] divulgue na sua página a informação relativa a transferências financeiras para paraísos fiscais”, argumentou Núncio.

A justificação de Núncio surge depois de José Azevedo Pereira, director da AT no período em que foram feitas as transferências que escaparam ao controlo do fisco, ter garantido que a “Autoridade Tributária efectuou em devido tempo, quer o tratamento e o acompanhamento inspectivo que lhe competia, quer a preparação dos elementos necessários à efectiva divulgação pública dos elementos em causa”.

O DN escreve ainda que apurou junto do Ministério das Finanças que em 2012 as estatísticas foram enviadas a Núncio para publicação e este terá escrito apenas um "visto" no seu despacho, Os serviços interpretaram a resposta como ausência de instrução para publicação. Mas Paulo Núncio tem uma interpretação diferente. Para o antigo secretário de Estado, o “visto” não é uma oposição à publicação, “uma vez que a AT já estava obrigada a publicar a estatística com base no despacho”.

O ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais será ouvido no Parlamento na próxima quarta-feira, juntamente com o actual titular da pasta, Fernando Rocha Andrade, numa audiência parlamentar aprovada por unanimidade por todos os partidos.

Marcelo Rebelo de Sousa pronunciou-se sobre o assunto para dizer que a situação “merece ser investigada para que se evitem situações idênticas no futuro”.