Tomás Correia e Montepio arguidos em negócios de terrenos

Negócio imobiliário em Coimbra está no centro da decisão do juiz que levou à constituição de 14 arguidos, incluindo o banco Montepio. Em causa estão suspeitas de insolvência dolosa e de burla.

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No final de Janeiro os presidentes da Associação Mutualista Montepio Geral, Tomás Correia, do grupo industrial Martifer, Carlos Martins, do ex-presidente do Finibanco, Humberto Costa Leite, bem como outros gestores e sociedades envolvidas, foram constituidos arguidos. Sobre todos recaem suspeitas de insolvência dolosa e de burla qualificada, emissão de cheques sem provisão, acordos estabelecidos com intuito de não serem cumpridos e venda de terrenos, sem que estes tenham sido pagos ao proprietário inicial, para liquidar responsabilidades em incumprimento de terceiros.

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No final de Janeiro os presidentes da Associação Mutualista Montepio Geral, Tomás Correia, do grupo industrial Martifer, Carlos Martins, do ex-presidente do Finibanco, Humberto Costa Leite, bem como outros gestores e sociedades envolvidas, foram constituidos arguidos. Sobre todos recaem suspeitas de insolvência dolosa e de burla qualificada, emissão de cheques sem provisão, acordos estabelecidos com intuito de não serem cumpridos e venda de terrenos, sem que estes tenham sido pagos ao proprietário inicial, para liquidar responsabilidades em incumprimento de terceiros.

No epicentro da decisão está um negócio imobiliário de venda de 30 hectares situados à entrada de Coimbra, conhecidos por Colinas de Vale Meão. E que correu a par da Oferta Pública de Aquisição (OPA) lançada em 2010 pelo banco Montepio-Caixa Económica Montepio Geral, então presidido por Tomás Correia, sobre o antigo Finibanco, à data dos factos liderado por Humberto Costa Leite, do grupo Vicaima. Uma operação de 341 milhões de euros, 100 milhões acima das avaliações efectuadas.

Uma transacção com várias vertentes e cujos contornos foram revelados por uma investigação do PÚBLICO, publicada a 20 de Março de 2016 no suplemento de domingo P2 com o título: “A grande conspiração por detrás da OPA [...] do Montepio ao Finibanco”.

Histórias que se cruzam e que foram autonomizadas nas averiguações policiais: a operação de bolsa de 341 milhões de euros envolvendo dois bancos portugueses (Montepio e Finibanco); a aquisição de terrenos em Coimbra por 32,4 milhões, que é a matéria que consta do despacho judicial de 30 de Janeiro de 2017. E onde o tribunal Judicial da Comarca de Viseu constituiu 14 arguidos por alegados crimes de insolvência dolosa ou (e) de burla qualificada. 

Para além de Tomás Correia, o actual presidente da Associação Mutualista Montepio Geral, que chefiou até 2014 o banco Montepio, e de Fernando Magalhães (Montepio), as autoridades apontaram outros arguidos: o ex-presidente do Finibanco, Humberto Costa Leite, o director financeiro Bessa Monteiro e Ricardo Henriques, os três ligados à Vicaima, com sede em Vale de Cambra. E ainda Carlos Martins, presidente da Martifer, e o seu colaborador Ricardo Henriques, bem como o empresário da Prestige José Pucarinho.

A esta lista juntam-se várias empresas, entre elas a Caixa Económica Montepio Geral, neste momento presidida por Félix Morgado, o Montepio Imóveis, a Vicaima (que detinha o Finibanco) e a imobiliária Prestige. Sociedades que são visadas porque os seus dirigentes actuaram em seu nome.

A semana passada, na última reunião do Conselho Geral da Associação Mutualista Montepio Geral, que decorreu sem agenda, e na presença de 22 dos seus 23 elementos, o seu presidente, Tomás Correia, prestou informações a seu pedido sobre o facto de ser arguido em três dossiês. Para além da transacção imobiliária de Coimbra, é citado num processo deduzido pelo Banco de Portugal por, em 2014, enquanto presidente do banco Montepio, ter falhado a introdução atempada dos procedimentos necessários ao controlo de movimentos financeiros ilícitos.

A 29 de Janeiro deste ano, o Expresso noticiou que a justiça portuguesa acredita que Tomás Correia pode ter recebido 1,5 milhões de euros do construtor da Amadora, José Guilherme, conhecido pela “oferta” de 14 milhões de euros a Ricardo Salgado, num negócio imobiliário relacionado com o Marconi Parque, em Alfragide. Suspeitas que Tomás Correia já veio publicamente contestar.

O PÚBLICO tentou obter, junto do porta-voz de Tomás Correia, um comentário sobre o facto de o gestor ter sido novamente constituído arguido, mas agora pelas decisões tomadas no contexto do loteamento das Colinas de Vale Meão, em Coimbra. Até à hora de fecho desta edição, a fonte oficial não tinha respondido aos contactos estabelecidos. O mesmo aconteceu com o banco Montepio. Já o presidente da Martifer, Carlos Martins, optou por não prestar esclarecimentos sobre o tema.

O que está em causa é uma transacção imobiliária de 32,4 milhões de euros, marcada pela falta de transparência e que contou do lado vendedor com a Vilões (sociedade mais tarde rebaptizada de Apícula), que detinha os 30 hectares em Coimbra, conhecidos por Colinas de Vale Meão, vendidos mas não pagos. Uma empresa detida pelo jurista Tavares de Almeida, que à data dos factos acumulava as suas funções de empresário com as de administrador e auditor do Finibanco. E que foi aos tribunais reclamar o pagamento de uma dívida de 17 milhões de euros. 

O que dizem os factos? Para adquirirem as Colinas de Vale Meão, Costa Leite, Carlos Martins, Pucarinho e o próprio Tavares de Almeida criaram, a 21 de Agosto de 2008, a Cityprofit, que pediu um crédito ao Finibanco, o banco a que todos se encontravam ligados como accionistas, administradores ou auditores.

No final de 2009, no acto da transacção, o director financeiro da Vicaima (controladora do Finibanco) e o gerente da Cityprofit, Manuel Bessa Monteiro, entregou ao vendedor, a Vilões, um cheque de 32,4 milhões sem provisão.

Na sua qualidade de gestor e de auditor do Finibanco, Tavares de Almeida, a actuar na dupla condição de vendedor e de comprador, não levantou obstáculos, pois a falta de dinheiro na conta da Cityprofit foi-lhe justificada com o facto de o crédito não ter sido formalmente aprovado.

Tinham-se aberto, entretanto, negociações entre Tomás Correia e Humberto Costa Leite, que culminaram na OPA lançada pelo Montepio sobre o Finibanco, um banco cujos empréstimos ao principal accionista, a Vicaima, ultrapassavam largamente o limite permitido pelo Banco de Portugal, de 70 milhões de euros.

Com a OPA fechada, em 2010, a Cityprofit transfere os terrenos da Colina de Vale Meão para o Montepio, desiste do financiamento do Finibanco e declara falência furtuita. Mas continuava a dever 18 milhões de euros à Vilões, pois já liquidara 22 milhões.

Quando Tavares de Almeida foi ao Montepio pedir o pagamento dos 18 milhões que considerava estarem em falta, ou em contrapartida a devolução das propriedades, estas já tinham sido colocadas na esfera imobiliária do Montepio.

Em 2013, Tomás Correia reconhece dever à Vilões seis milhões, mas Tavares de Almeida continua a reclamar os restantes 12,5 milhões. E vai para a justiça acusar todos os envolvidos, nomeadamente o banqueiro por estar a usar os terrenos não pagos para valorizar o balanço do Montepio e regularizar dívidas da Vicaima ao Finibanco. 

Com o processo-crime arquivado pelo Ministério Público de Viseu, a 16 de Dezembro Tavares de Almeida avançou como uma reclamação hierárquica e solicitou a transferência do processo para o DCIAP de Lisboa. Mas o pedido é recusado pelo juiz que considera o tribunal de Viseu competente para avaliar a queixa.

Depois do advogado da Vilões/Apícula, Mário Fontemanha, solicitar a reanálise do processo, o juiz do tribunal de Viseu deu como válido o pedido e considera que existem indícios suficientes para constituir os 14 arguidos. A decisão foi comunicada a 30 de Janeiro de 2017.