A ministra pediu as escutas e a procuradora deu-lhas
A ministra da Justiça Francisca Van Dunem pediu acesso às escutas em que o seu nome é referido pelos arguidos. Não justificou a razão por que o fez, mas a procuradora acedeu.
No meio dos 80 volumes e mais uma série de apensos que constituem o processo dos vistos dourados uma folha amarela e mais espessa destaca-se no meio das resmas de ofícios, descrições de diligências e interrogatórios. É um requerimento enviado a 2 de Fevereiro do ano passado enviado ao director do Departamento Central de Investigação e Acção Penal pela cidadã Francisca Van Dunem, ministra da Justiça. Solicita a governante que lhe sejam facultadas cópias certificadas das transcrições das intercepções telefónicas e das declarações do arguido António Figueiredo — o principal arguido do caso — que mencionem a sua pessoa.
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No meio dos 80 volumes e mais uma série de apensos que constituem o processo dos vistos dourados uma folha amarela e mais espessa destaca-se no meio das resmas de ofícios, descrições de diligências e interrogatórios. É um requerimento enviado a 2 de Fevereiro do ano passado enviado ao director do Departamento Central de Investigação e Acção Penal pela cidadã Francisca Van Dunem, ministra da Justiça. Solicita a governante que lhe sejam facultadas cópias certificadas das transcrições das intercepções telefónicas e das declarações do arguido António Figueiredo — o principal arguido do caso — que mencionem a sua pessoa.
Não apresenta qualquer justificação para o pedido. A data, porém, é a da data de saída de uma notícia no PÚBLICO dando conta de que o ex-presidente do Instituto de Registos e Notariado tinha sido apanhado nas escutas da Polícia Judiciária a gabar-se de também ter prestado favores à então procuradora-geral distrital de Lisboa.
O PÚBLICO noticiou que em 2013, quando estava prestes a expirar a autorização de residência do filho de um sobrinho da hoje governante, uma reputada advogada angolana, Paula Godinho, ligou a António Figueiredo para que este tratasse do assunto. Quando este soube quem era a tia do rapaz pôs-se em campo, e com sucesso. Mas antes ainda teve de se aborrecer com a demora com que lhe tratavam do assunto. “Já não tenho paciência para isto, é uma coisa inacreditável (...) Vou ter de falar com o Manuel Palos, tenho a criatura Francisca Van Dunem a dizer que o sobrinho tinha avião marcado para Angola, que não vai passar o Natal a casa porque tenho o raio de uma informação pendente há um mês”, ouviram-no dizer os inspectores da Judiciária. A ministra já negou ter alguma vez tido interferência no caso.
Queria nacionalidade portuguesa para familiar
Noutro episódio, Van Dunem tinha tido uma dúvida em relação ao direito de uma familiar sua obter a nacionalidade portuguesa. António Figueiredo conseguiu-lhe uma audiência com uma conservadora experiente, que lhe tirou as esperanças, como o PÚBLICO também noticiou há um ano.
Questionada pelo jornal sobre o seu requerimento ao director do DCIAP para ter acesso aos autos do processo que a mencionam, o gabinete de imprensa da ministra esclareceu que a governante se sentiu “publicamente exposta” no artigo relacionado com o seu sobrinho, que foi “objectivamente lesivo da sua imagem e honorabilidade pessoal e profissional”. “À data em que foi solicitado o acesso à referida documentação, o processo já não se encontrava em segredo de justiça”, refere ainda o mesmo gabinete, “motivo pelo qual era susceptível de ser obtida autorização de acesso quer pela comunicação social, quer por qualquer pessoa que nisso revelasse interesse legítimo”. Em resposta ao requerimento da ministra, a procuradora titular do processo indicou-lhe em que partes dos autos do mesmo se encontravam as referências a ela. O pedido da ministra, que teve autorização para as cópias certificadas serem levantadas por outra pessoa, demorou uma semana a ser deferido.