Ferro Rodrigues e PSD, uma relação crispada até ao fim?

Sociais-democratas acusam presidente da Assembleia da República de "fazer o jeito" ao PS.

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Pedro Elias

Diz o provérbio que "o que nasce torto tarde ou nunca se endireita" e este pode muito bem ser o caso das relações entre o presidente da Assembleia da República e o PSD. Esta semana, Eduardo Ferro Rodrigues voltou a agitar os sociais-democratas com um comentário sobre o líder da bancada do PSD durante o debate quinzenal. Foi a segunda fricção em plenário, em poucas semanas, depois da troca de palavras azeda com um vice-presidente da bancada social-democrata a propósito da comissão de inquérito à Caixa Geral de Depósitos.

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Diz o provérbio que "o que nasce torto tarde ou nunca se endireita" e este pode muito bem ser o caso das relações entre o presidente da Assembleia da República e o PSD. Esta semana, Eduardo Ferro Rodrigues voltou a agitar os sociais-democratas com um comentário sobre o líder da bancada do PSD durante o debate quinzenal. Foi a segunda fricção em plenário, em poucas semanas, depois da troca de palavras azeda com um vice-presidente da bancada social-democrata a propósito da comissão de inquérito à Caixa Geral de Depósitos.

No PSD somam-se as vozes que olham para o presidente da Assembleia da República como uma figura que “veste a camisola” do seu partido, o PS. Foi essa, aliás, a mensagem que o próprio Luís Montenegro, líder da bancada do PSD, deixou no momento em que Ferro Rodrigues foi eleito, em Outubro de 2015, com os votos da esquerda e quebrando a tradição de o presidente da Assembleia da República pertencer ao partido mais votado em urna nas legislativas – o PSD (em coligação com o CDS). O social-democrata ouviu o discurso de tomada de posse e observou: “Não começou bem o seu mandato. Quero dizer com toda a franqueza e frontalidade, porque fiquei com a sensação de que as garantias de isenção que devem estar na base da função estão ainda longe de serem garantidas”.

O líder da bancada do PSD não quis fazer declarações ao PÚBLICO sobre a relação da direcção da bancada com a segunda figura do Estado, mas é visível a indignação de muitos deputados sobre a forma de Ferro Rodrigues intervém na condução dos trabalhos.

Carlos Abreu Amorim, independente eleito pelo PSD, foi um dos deputados que mais mostraram a sua irritação quando Ferro Rodrigues, há três semanas, disse a Passos Coelho que o Governo é livre de responder num momento em que o líder social-democrata insistia repetidamente na pergunta ao primeiro-ministro sobre o valor da dívida. Na resposta, Passos Coelho sugeriu que o ex-ministro socialista estava a “ajudar” António Costa.

Carlos Abreu Amorim, também vice-presidente da bancada, assume que este primeiro ano “deixa muito a desejar”. Não só pelo despacho sobre o inquérito à CGD mas também sobre a condução dos trabalhos em plenário: “Parece que há uma atitude pressurosa em ajudar o primeiro-ministro sempre que ele está em dificuldades, o que é lamentável”.

A deputada e ex-ministra da Justiça do PSD, Paula Teixeira da Cruz, considera que “a condução dos trabalhos não é adequada”. “Quando há por parte das bancadas à esquerda uma reacção mais violenta, faculta mais tempo. Temos uma condução parcial”, afirmou ao PÚBLICO.

Outro deputado do PSD que não esconde a sua indignação nos plenários é Duarte Marques. “É o primeiro presidente que me recorde que não se coíbe de, às claras e publicamente, fazer o jeito ao PS”, disse, lembrando, no entanto, que já elogiou publicamente Ferro Rodrigues em algumas das suas intervenções. O deputado recorda que “todos os outros presidentes até prejudicavam o seu próprio partido para reafirmarem a sua independência”.

Contactado pelo PÚBLICO, o assessor de imprensa do gabinete de Ferro Rodrigues não quis comentar o assunto. Para alguns sociais-democratas, "mais grave" do que os embates nos plenários foi o tal despacho em que recusou alargar o âmbito da comissão de inquérito à à Caixa Geral de Depósitos à recapitalização do banco público, que disse ser baseado num parecer da auditora jurídica que deputados do PSD interpretaram noutro sentido. A decisão de Ferro levou Hugo Soares, vice-presidente da bancada do PSD, a acusar o presidente de “alinhar na narrativa” de ser desnecessário “contar a verdade aos portugueses". Foi um “ataque de carácter”, respondeu Ferro Rodrigues, na conferência de líderes em que a questão foi discutida.

Há quem desvalorize ou simplesmente não veja motivo para acusar o presidente de estar ao lado do PS no exercício das suas funções. “Não se pode imputar parcialidade”, defende Fernando Negrão, que foi o candidato apoiado pelo PSD para Presidente da Assembleia e que foi derrotado. Outros lembram que Ferro esteve ao lado do PSD em questões como a falta dos quadros anexos ao Orçamento do Estado para 2017 ou ainda na decisão sobre o pagamento dos subsídios de campanha aos partidos. 

Na bancada do CDS, também na oposição, o líder parlamentar Nuno Magalhães não quer alimentar polémicas, mas lembra que "o problema original de tudo isto foi o facto de se terem quebrado tradições" e que isso "traz naturais desconfianças". Resta saber se perduram até ao fim da legislatura. 

Montenegro lamentou decisão solitária

Houve outro episódio a motivar um protesto por parte do PSD contra a actuação de Ferro Rodrigues. Foi mais discreto, mas ainda assim não terá contribuído para apaziguar as relações. O presidente da Assembleia da República decidiu atribuir o nome de António Almeida Santos, ex-presidente do PS e ex-presidente da Assembleia da República, ao auditório do Edifício Novo, mas não consultou nem as direcções das bancadas nem os vice-presidentes nem o conselho de administração da assembleia.

No dia em que a placa foi descerrada, a 20 de Janeiro, o líder da bancada do PSD, Luís Montenegro, condenou a forma,"lamentável", como o assunto foi tratado, ressalvando que não estava em causa “a valia da atribuição” do nome de Almeida Santos a um espaço parlamentar. E disse-o a Ferro Rodrigues na conferência de líderes dessa manhã. Ferro Rodrigues disse que “interpretara que se trataria de uma decisão absolutamente consensual”, recusou a ideia de pretender decidir sozinho e justificou a falta de informação com o momento vivido nas semanas anteriores, com a preparação das cerimónias fúnebres de Mário Soares.