Calçado acredita na América apesar da incerteza de Trump

O calçado português resiste na Europa, explode na Ásia e descobre na América a sua próxima rampa para a internacionalização. Em 2016 a exportação cresceu 3,3% e ultrapassou a barreira dos 1900 milhões de euros.

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Paulo Pimenta

As exportações da indústria portuguesa do calçado voltaram a crescer no ano passado e ultrapassaram os 1900 milhões de euros com a ajuda da fidelidade dos consumidores europeus e o empurrão do novo mercado-estrela do sector, os Estados Unidos. O país que mais calçado importa no mundo (absorve quase 20% das exportações mundiais) está ainda longe de ser decisivo para a indústria nacional, mas o crescimento das vendas nos últimos sete anos torna os Estados Unidos o principal objecto do desejo da “indústria mais sexy da Europa”, como o calçado gosta de afirmar. Se em 2009 as vendas para a América se resumiam a 12 milhões de euros, no ano passado chegaram aos 80 milhões. No mesmo período, as exportações nacionais aumentaram 461% e no ano registaram um crescimento de 14%.

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As exportações da indústria portuguesa do calçado voltaram a crescer no ano passado e ultrapassaram os 1900 milhões de euros com a ajuda da fidelidade dos consumidores europeus e o empurrão do novo mercado-estrela do sector, os Estados Unidos. O país que mais calçado importa no mundo (absorve quase 20% das exportações mundiais) está ainda longe de ser decisivo para a indústria nacional, mas o crescimento das vendas nos últimos sete anos torna os Estados Unidos o principal objecto do desejo da “indústria mais sexy da Europa”, como o calçado gosta de afirmar. Se em 2009 as vendas para a América se resumiam a 12 milhões de euros, no ano passado chegaram aos 80 milhões. No mesmo período, as exportações nacionais aumentaram 461% e no ano registaram um crescimento de 14%.

“Temos uma enorme esperança nos Estados Unidos”, diz Vasco Sampaio, líder do Grupo Sozé que tem como marca principal a DKODE, que exporta para 25 países. Os números ajudam a entender a expectativa. “Há três anos vendíamos zero para esse mercado e no ano passado as encomendas representaram já 10% do nosso negócio”, diz o administrador. No princípio, a empresa com três unidades industriais, 158 trabalhadores e um volume de negócios de dez milhões de euros, produziu apenas calçado com marcas de importadores; mas este ano vai começar a exportar com marca própria, depois de ter conseguido uma parceria com uma distribuidora norte-americana. Só assim, diz Vasco Sampaio, é possível entrar na imensidão do retalho da América.

“Não temos dúvidas que o mercado norte-americano é para nós o que mais potencial de crescimento oferece”, diz João Maia, director-executivo da APICCAPS, a associação empresarial que reúne e representa o sector do calçado. Nos mercados maduros da Europa, a exportação continua a registar crescimentos ligeiros; nos mercados emergentes como o da China ou dos Emirados Árabes Unidos as taxas de crescimento são fulgurantes (cerca de 3000 e os 600%, respectivamente), mas o volume de negócios é ainda relativamente reduzido – 13 milhões de euros para a China. Perante este cenário, a principal oportunidade do sector está no país que em 2012 importou 2300 milhões de pares de sapatos – 30 vezes mais do que toda a exportação nacional no ano passado (81 milhões de pares).

“Perante o baixo crescimento da Europa, os Estados Unidos são a alternativa, até porque culturalmente são muito mais próximos de nós do que a Ásia”, diz Vasco Sampaio. A eleição de Donald Trump e o regresso do discurso proteccionista vieram refrear alguma euforia. “É claro que temos alguma apreensão com a imprevisibilidade do regime de Trump”, diz Vasco Sampaio. Mas perante as oportunidades que se abrem, os riscos parecem compensar. “Há receios a emergir em vários países, mas não me parece que haja dificuldades que não sejamos capazes de vencer”, diz João Maia. De resto, em tempos de incerteza a indústria nacional tem um trunfo que pode fazer a diferença: a sua flexibilidade, que lhe permite responder a encomendas em muito pouco tempo.

A América é assim “a rampa de lançamento” com a qual a indústria tenta definir o potencial de crescimento no futuro. Depois do ritmo acelerado entre 2010 e 2014, o calçado entrou numa fase que os responsáveis da APICCAPS definem como “de consolidação”. “Estamos a falar de um produto maduro, não emergente”, diz João Maia, onde a competição é forte e no qual qualquer ganho de quota se faz principalmente à custa de perdas de concorrentes internacionais. “Precisamos de mais alguns anos de consolidação, não podíamos estar sempre a crescer 10% ao ano”, acrescenta o director executivo da APICCAPS. Ainda assim, 2016 foi um ano “muito positivo”. Em valor, a exportação, que representa 95% do total da produção, aumentou 3,3%, o triplo do registo no ano anterior.

Ao nível interno, espera-se que as empresas mantenham o seu dinamismo. Os dados dos últimos anos são usados pela APICCAPS como um exemplo da sua capacidade de adaptação. Desde 2010 foram criados cerca de 10 mil postos de trabalho. O recrutamento de quadros qualificados acelerou – no segmento dos quadros médios passou de 3 para 9% do total da força de trabalho. Entre 1996 e 2006 o sector criou 342 novas marcas. As empresas continuam a investir na internacionalização – nos próximos dias 94 empresas estarão na Micam, em Milão, a maior feita de calçado do mundo. No plano estratégico do calçado, estão previstos investimentos de 160 milhões de euros apoiados por fundos europeus até 2020.