O Japão é o primeiro a experimentar a “arte de negociar” com Trump

O primeiro-ministro Shinzo Abe chega a Washington para assegurar uma parceria comercial e garantir que os EUA vão continuar a ser um garante da segurança na Ásia.

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Shinzo Abe visita Trump na sequência do falhanço do acordo de comércio livre do Pacífico Yuya Shino/REUTERS

É uma oferta que nem o Presidente norte-americano, Donald Trump, pode recusar. Pelo menos assim espera o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, que inicia esta sexta-feira uma visita de Estado aos EUA. Na bagagem traz investimentos público-privados que pretendem criar 700 mil novos empregos, com a esperança de iniciar da melhor forma uma nova relação entre os dois países. O comércio internacional e a arquitectura de segurança do Pacífico são os temas que dominam a agenda dos dois líderes.

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É uma oferta que nem o Presidente norte-americano, Donald Trump, pode recusar. Pelo menos assim espera o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, que inicia esta sexta-feira uma visita de Estado aos EUA. Na bagagem traz investimentos público-privados que pretendem criar 700 mil novos empregos, com a esperança de iniciar da melhor forma uma nova relação entre os dois países. O comércio internacional e a arquitectura de segurança do Pacífico são os temas que dominam a agenda dos dois líderes.

A visita de Abe surge na ressaca da quebra das negociações do Tratado Trans-Pacífico (TPP, na sigla inglesa), um acordo de comércio livre que pretendia juntar 12 países da região e que, com a saída dos EUA, fica praticamente sem efeito. A decisão reflecte a animosidade de Trump em relação aos acordos  comerciais – o Presidente também prometeu a renegociação do NAFTA, que junta EUA, Canadá e México – e é a estas novas regras do jogo que os aliados de Washington têm de se adaptar.

Abe sabe disso e é por isso que um dos grandes objectivos da sua visita é lançar as bases para um acordo bilateral. “Há a possibilidade de sermos totalmente ignorados se mencionarmos sequer o ‘T’ do TPP”, disse ao jornal Asahi Shimbun uma fonte do gabinete do primeiro-ministro. Para jogar com as regras de Trump, Abe acredita ter reunido as cartas que mais lhe apelam – emprego.

“Quero falar com o Presidente Trump acerca das contribuições que podemos fazer para a criação de empregos” nos EUA, afirmou Abe, durante uma sessão parlamentar da comissão de Finanças, na semana passada. Em reuniões com empresários e investidores japoneses, Abe terá pedido "números tweetáveis" sobre potenciais investimentos que possa apresentar a Trump, de acordo com o Financial Times. Alguns destes números já foram sendo anunciados. O primeiro-ministro japonês espera poder apresentar um pacote de investimento público-privado a ser aplicado já este ano, que pode criar 700 mil postos de trabalho nos EUA, de acordo com a Reuters. O fabricante de aparelhos electrónicos Sharp deverá igualmente anunciar nos próximos dias a construção de uma fábrica no valor de sete mil milhões de dólares (6,5 mil milhões de euros).

A acompanhar Abe vai uma comitiva composta por elementos do mais alto nível do Executivo japonês, que inclui os ministros das Finanças, Economia e Negócios Estrangeiros. O Japão foi alvo de acusações semelhantes às que Trump dirigiu à China durante a campanha eleitoral – nomeadamente de que a moeda é artificialmente desvalorizada para tirar competitividade às exportações norte-americanas.

Abe e companhia pretendem defender a sua política agressiva de estímulos, conhecida como Abenomics, e tentar mostrar a Trump que a sua visão das dinâmicas económicas do Japão não é aplicável aos dias de hoje, escreve a Reuters.

Trump “parece olhar para o comércio como um jogo de soma-zero, e não como algo de positivo em que ambos os lados podem realmente ganhar”, disse ao Voice of America o professor do campus japonês da Universidade de Temple, James Brown.

A aliança militar

Em antecipação da visita de Abe a Washington, o secretário da Defesa, James Mattis, assegurou que os EUA estão empenhados em cumprir os compromissos de defesa mútua em vigor com o Japão. Este é um dos pontos mais sensíveis nas relações entre os dois países desde que Trump, ainda durante a campanha eleitoral, disse que os EUA não estavam dispostos a continuar a pagar pela segurança dos seus aliados asiáticos, Japão e Coreia do Sul, pondo em causa um pilar da política externa norte-americana do pós-guerra.

As declarações deixaram em suspenso os aliados asiáticos de Washington, que enfrentam uma Coreia do Norte que não não desiste de desenvolver o seu programa nuclear e uma China cada vez mais disposta a afirmar o seu poder, com reivindicações territoriais que chocam com a maioria destes países do Pacífico. Porém, desde então, Trump não voltou a pressionar os seus aliados asiáticos, provavelmente temendo deixar um vácuo na liderança do continente asiático que pudesse vir a ser ocupado por Pequim.

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Primeiro-ministro japonês durante uma partida de golfe em Agosto de 2015 Reuters

Perante um dos líderes mais imprevisíveis das últimas décadas a chegar à Casa Branca, a forma como o encontro entre os dois aliados vai decorrer pode também dar pistas para futuras visitas de outros chefes de Estado. Estabelecer uma relação pessoal forte com Trump parece ser uma das chaves.

Abe leva alguma vantagem, tendo visitado o magnata em Nova Iorque poucos dias depois da sua vitória eleitoral. Na ocasião ofereceu-lhe um taco de golfe banhado a ouro, explorando uma potencial afinidade entre ambos. É conhecido o gosto de Trump pelo golfe – terá ganho 18 troféus, segundo o próprio – mas Abe também é um praticante.

Durante o fim-de-semana, os dois líderes vão ter oportunidade de avaliar a técnica um do outro, durante uma partida no clube de que Trump é proprietário na Florida. O episódio tem um significado especial para Abe. Em 1957, o seu tio-avô, Nobusuke Kishi, na época primeiro-ministro, foi recebido por Dwight Eisenhower, contra quem também disputou um jogo de golfe. Na altura, era o líder japonês que queria uma alteração do status quo na relação entre os dois países. Kishi exigia uma revisão do tratado de segurança assinado com os EUA a seguir à II Guerra Mundial – considerado uma imposição dos vencedores do conflito –, para garantir a assistência militar norte-americana em caso de ataque. A reivindicação de Kishi foi recebida com protestos no Japão, que ainda receava o regresso do militarismo.