Mãe que matou as duas filhas na praia de Caxias condenada a 25 anos

“A culpa da arguida é enorme", disse a juíza. Crianças morreram na noite de 15 de Fevereiro do ano passado. Mãe sobreviveu, foi internada na ala psiquiátrica do Hospital de Santa Maria em Lisboa e depois ficou presa em Tires.

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A filha mais nova de Sónia Lima só foi encontrada sete dias depois de desaparecer Enric Vives-Rubio

Um último desejo, antes de uma condenação à pena máxima: “Não ser filmada”, pediu Sónia Lima. A mãe que lançou as duas filhas ao mar em Caxias foi condenada ontem à pena de 25 anos de prisão. “A culpa da arguida é enorme. Dificilmente se vê uma situação em que a culpa tenha sido maior do que neste caso”, disse a juíza Anabela Ferreira, que lembrou o “alarme social” causado por estes crimes e a necessidade de a justiça dar um sinal forte à sociedade. A magistrada permitiu a presença das televisões, em nome da transparência, mas sem ser consentida a captação de de imagens da arguida, da sua advogada e das juízas do colectivo a que presidiu.

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Um último desejo, antes de uma condenação à pena máxima: “Não ser filmada”, pediu Sónia Lima. A mãe que lançou as duas filhas ao mar em Caxias foi condenada ontem à pena de 25 anos de prisão. “A culpa da arguida é enorme. Dificilmente se vê uma situação em que a culpa tenha sido maior do que neste caso”, disse a juíza Anabela Ferreira, que lembrou o “alarme social” causado por estes crimes e a necessidade de a justiça dar um sinal forte à sociedade. A magistrada permitiu a presença das televisões, em nome da transparência, mas sem ser consentida a captação de de imagens da arguida, da sua advogada e das juízas do colectivo a que presidiu.

Anabela Ferreira não leu o acórdão, resumiu-o, falando com serenidade e justificando a sentença, como se nem os factos nem o que deles resultou pudesse, de alguma forma, ser reduzido a uma leitura. Várias vezes dirigiu o olhar a Sónia Lima. "A arguida não manifestou ter interiorizado o mal", disse.

Na noite de 15 de Fevereiro de 2016, Sónia Lima, de 38 anos, entrou com as duas crianças (de quatro anos e 19 meses) no mar, sobreviveu, e depois pediu ajuda. A filha mais nova foi resgatada sem vida nessa mesma noite, quando as equipas de socorro e buscas chegaram depois do alerta dado por um taxista que ali parou. O corpo da menina de quatro anos foi encontrado sete dias depois.

O Tribunal de Cascais deu como provado os dois crimes, fixando uma pena de 22 anos para cada uma das mortes, resultando na pena máxima de 25 anos. Sónia Lima foi condenada igualmente a pagar uma indemnização de 103 mil euros ao pai das crianças: 40 mil euros por danos ao pai, 60 mil euros pela retirada da vida das próprias filhas e três mil euros para despesas.

A forte ligação entre a mãe e as filhas, que viam nela uma protecção, e a idade das crianças, uma delas "de meses" e ambas “totalmente indefesas”, levaram o colectivo a concluir pela qualificação dos crimes.

“Não havia forma de elas se defenderem”, disse a juíza-presidente. “A maré estava alta, o mar estava muito agitado” e uma das meninas “tinha medo do mar”. “Mesmo em circunstâncias normais, na praia, pedia para não ir para o mar”, lembrou Anabela Ferreira a partir dos depoimentos das testemunhas.

Morte "intencional"

A conjugação de vários elementos levou, por outro lado, o colectivo de juízas a concluir que houve intenção de tirar a vida às filhas. E esta era a questão central do processo, disse Anabela Ferreira.

Primeiro elemento : “No dia 15 de Fevereiro o comportamento da arguida foi completamente atípico”, sublinhou a juíza. E explicou: Sónia Lima saiu de manhã e não levou, como habitualmente levava, a mala das primeiras necessidades das filhas, com fraldas, toalhetes e roupa.

O segundo foi “ter ficado incontactável a partir das 15h00”. Além disso, foi encontrado no seu carro um bilhete no qual pedia desculpa ao pai, e dizia não aguentar mais. Para o tribunal, não há dúvidas de que “aquele bilhete era um pedido de desculpas por aquilo que se tinha decidido a fazer e que fez".

Nessa noite, as ondas ultrapassaram os três metros de altura no pico da maré alta, pelas 20h50, hora a que a arguida entrou no mar com as duas crianças. A mãe levou as crianças, que viam nela a figura cuidadora, para “um sítio escuro, frio e agreste e forçou-as a entrar”.

 “A perda da vida é absolutamente irreparável”, referiu a juíza que enfatizou sobretudo a forma como a arguida "executou" estas mortes. "Foi tremenda", disse, lembrando que a morte por afogamento não é imediata, que houve sofrimento, e consciência dele, por parte das crianças, houve "padecimento", insistiu.

Neste momento, lembrou o depoimento do taxista que recordou ter ouvido gritos de uma das duas crianças, quando se aproximou da água para ver o que se passava. Conseguiu tirar a mãe da água à força, e levou-a ao colo, deitando-a numas rochas, enquanto esta dizia: 'Deixe-me ir. A dor é muito grande.' Além de ter negado a intenção de matar as filhas, a mãe disse, no seu depoimento, que tinha sido vítima de violência, física e psicológica, por parte do ex-companheiro.

“Pânico e dor”

O pai das duas meninas "tem momentos de pânico e profunda dor", justificou a juíza sobre a decisão relativa ao pagamento da indemnização. Nos primeiros meses a seguir à morte das filhas, Nélson Ramos "deixou de poder estar sozinho" e "teve necessidade de ajuda psiquiátrica".

Sobre a sentença, Rui Maurício, advogado de Nélson Ramos, assistente no processo, disse que "não se pode pedir mais" à justiça. "Foi a pena máxima. A justiça não repara estas tragédias."