Para andarem de costas, as formigas têm um GPS próprio
Por vezes, estão tão carregadas que nem conseguem andar de frente até casa. Agora descobriu-se como é que as formigas regressam às suas colónias, mesmo que não vejam o caminho.
As formigas são conhecidas por andarem sempre atarefadas e serem autênticas recolhedoras de comida para as suas colónias. Mas às vezes transportam alimentos bem pesados. Como é que o fazem? Andam de costas. Um grupo de cientistas quis perceber melhor esta dinâmica e encontrou dois motivos que permitem às formigas andarem de costas: a sua memória e as nuvens do céu.
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As formigas são conhecidas por andarem sempre atarefadas e serem autênticas recolhedoras de comida para as suas colónias. Mas às vezes transportam alimentos bem pesados. Como é que o fazem? Andam de costas. Um grupo de cientistas quis perceber melhor esta dinâmica e encontrou dois motivos que permitem às formigas andarem de costas: a sua memória e as nuvens do céu.
Não é em vão que as formigas são descritas como animais trabalhadores nas fábulas. É mesmo real, elas conseguem percorrer longas distâncias entre a sua colónia e o sítio onde vão buscar a comida. Contudo, às vezes, a comida pesa tanto que as formigas não conseguem mudar de direcção, e têm de voltar a casa de costas.
Uma equipa de cientistas coordenada por Antoine Wystrach, da Universidade de Edimburgo (Reino Unido) e da Universidade Paul Sabatier (Toulouse, França), observou formigas, da espécie Cataglyphis velox, em ambiente natural, no deserto da Andaluzia, perto de Sevilha. O grupo analisou o movimento dessas formigas ao longo de três metros.
Se as formigas transportassem pedaços de bolachas pequenos conseguiam virar-se 90 graus para a direita e andar de frente, já se transportassem pedaços de bolachas grandes não conseguiam virar-se. Mas se não se conseguem virar, como voltavam para as suas colónias?
Uma bússola celestial
Há dois motivos para conseguirem regressar a casa “às escuras”. Primeiro, as formigas memorizam o caminho devido à sua visão “multifacetada”. E com o seu minúsculo cérebro, que não é maior do que uma cabeça de alfinete, conseguem reverter o caminho. Algo de surpreendente acontecia também durante este retorno em retaguarda. De vez em quando, as formigas largavam o pedaço de bolacha, viravam-se na direcção da sua colónia, olhavam o caminho e depois voltavam a pegar na bolacha e a andar de costas. Isto mostra que três partes da sua memória estão a funcionar: a memória visual para o caminho, a memória visual para seguir uma nova direcção, e a memória para pegar de novo no pedaço de bolacha.
Depois, a equipa ainda usou um espelho para reflectir a luz do Sol e perceber se o ambiente também tinha influência no andamento em retaguarda da formiga. E percebeu que sim: as nuvens do céu eram um elemento decisivo na orientação das formigas, quer seja a andar de costas, de frente ou de lado. Isto mostrou também que as formigas utilizam factores externos para se guiarem.
“Esperámos por um dia limpo para analisarmos o efeito da polarização da luz do céu azul e percebermos a sua manipulação quando o Sol estava claramente visível”, escrevem os autores no artigo científico que publicaram na revista Current Biology. Com isto puderam concluir: “Parece claro que as formigas que andam de costas usam a sua bússola celestial para se manterem no caminho [até às suas colónias]”, lê-se ainda no artigo.
“Foi algo ímpar quando percebemos como a memória dos sítios foi armazenado no cérebro destes insectos”, afirma Antoine Wystrach sobre este estudo, em comunicado do grupo Cell Press, que edita a Current Biology. “Os nossos resultados mostram que isto acontece devido a uma delicada orquestração de representações múltiplas e o envolvimento da memória na transferência de informação entre as diferentes áreas do cérebro”, explica ainda o coordenador do estudo.
A equipa já pensa em estudos futuros sobre as capacidades cognitivas das formigas. Será que têm noção do peso da bolacha? Será que se lembram que, quando arrastam a bolacha, têm de andar de costas? Estas são já algumas das questões colocadas pelos cientistas. Além disso, querem também perceber a interligação entre as diferentes partes do cérebro e como essa interacção torna possível que andem às arrecuas.