“Não é viável fazer no Barreiro um porto de águas profundas”

Na defesa de um plano que prevê aumentar em 200% a capacidade de movimentação de carga dos portos nacionais, Ana Paula Vitorino, ministra do Mar está a renegociar quatro concessões e pretende lançar três novos concursos. O prazo de duração das concessões não é o mais importante, afirma

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Ana Paula Vitorino, ministra do Mar Adriano Miranda

Anunciada em pacote e para concretizar nos próximos dez anos, a Estratégia para o Aumento da Competitividade Portuária tem como meta aumentar em 200% a movimentação de contentores nos portos comerciais do continente e em 50% o volume de negócios nas actividades conexas e transversais, impulsionando toda a economia do mar. Atingir esse objectivo implica renegociar os actuais contratos de concessão dos portos e lançar, pelo menos, três novos concursos – isto numa altura em que a legislação sobre a concorrência no sector ainda está a ser discutida. A maior fatia do investimento vai para o terminal de contentores do Barreiro, investimento de que Ana Paula Vitorino não abdica. A ministra do Mar quer introduzir alterações face ao projecto do governo anterior e garante: “É para construir, desde que haja viabilidade ambiental e interesse dos privados”. 

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Anunciada em pacote e para concretizar nos próximos dez anos, a Estratégia para o Aumento da Competitividade Portuária tem como meta aumentar em 200% a movimentação de contentores nos portos comerciais do continente e em 50% o volume de negócios nas actividades conexas e transversais, impulsionando toda a economia do mar. Atingir esse objectivo implica renegociar os actuais contratos de concessão dos portos e lançar, pelo menos, três novos concursos – isto numa altura em que a legislação sobre a concorrência no sector ainda está a ser discutida. A maior fatia do investimento vai para o terminal de contentores do Barreiro, investimento de que Ana Paula Vitorino não abdica. A ministra do Mar quer introduzir alterações face ao projecto do governo anterior e garante: “É para construir, desde que haja viabilidade ambiental e interesse dos privados”. 

Anunciou investimentos de 2,5 mil milhões de euros nos próximos dez anos, dos quais 1,6 mil milhões serão aplicados em novos terminais de contentores. É esta a prioridade do sector?
Esta estratégia tem várias vertentes, mas o que me parece essencial é preparar os nossos portos para as perspectivas de crescimento do trafego e para as alterações das frotas dos navios. A carga que está a crescer mais a nível mundial é a contentorização. Os investimentos são para resolver problemas de capacidade imediata, como é o caso de Sines e de Leixões, mas também para [os portos] se prepararem para receber esses navios maiores, como é urgente em Leixões, mas também em Setúbal e em Viana do Castelo. Leixões é um porto muito competitivo e eficiente mas, efectivamente, não pode receber os navios maiores. Por isso, teremos de fazer novo terminal com fundos a -14 [metros].  Setúbal não tem o problema imediato de capacidade, mas tem o mesmo problema dos fundos – é, aliás, mais grave do que Leixões, porque os fundos são menos dez metros e com -12 à maré. E queremos passar para -14. O outro caso é Viana do Castelo, onde queremos aumentar não só a movimentação da carga mas, acima de tudo, fazer crescer a indústria naval.

Tem-se dito que Portugal pode aproveitar esta reorganização da indústria marítima e a sua posição estratégica na confluência de rotas. Acredita que há lugar para um porto de águas profundas em Sines e outro no Barreiro?
A perspectiva de crescer 200% não é sequer muito optimista. É moderada - nós já crescemos 180% nos últimos dez anos. Mas o projecto para o Barreiro não é para um porto de águas profundas. Isso não é viável. O que é tecnicamente viável é fazer no Barreiro um terminal como o que existe em Alcântara, por exemplo. Se cumprir os critérios ambientais e houver privados interessados o terminal avança.

No estudo da Associação Comercial do Porto o investimento no Barreiro é questionado e os autores dizem que o critério não pode ser o interesse dos privados, porque esses aparecerão sempre, se o parceiro público lhes der garantias de rentabilidade.
O estudo fala de um terminal de águas profundas e, repito, não é esse o projecto que temos em cima da mesa. Sobre o resto, o que tenho a dizer é que no funcionamento da economia existe a presunção de que um privado só se candidata a um negócio, sem compensação de nenhuma natureza que não a prática de poder exercer essa actividade, quando já tem a certeza que o investimento vai ser rentabilizado.

A Autoridade da Concorrência defende que a duração dos contratos de concessão nos portos, de 30 anos, é demasiado longa. A Autoridade para a Mobilidade e Transportes (AMT) admite que esse prazo pode, até, ser curto para a amortização de algum tipo de investimentos. Qual é a posição do Governo?
Essa questão ainda não está fechada. Mas, na minha opinião, não tem de haver necessariamente um limite definido, nem há nenhum problema se ele se mantiver nos actuais 30 anos. O que acho é que temos de encontrar um ponto de equilíbrio, mesmo nas novas concessões, entre aquilo que é a necessidade de manter a concorrência e a necessidade de amortizar o investimento. Só há duas hipóteses. Ou é o Estado que investe tudo, e o privado fica com uma concessão para exploração, que pode ser mais curta, ou então continuamos neste modelo em que associado a um concurso para a concessão existe investimento, em equipamento ou infra-estruturas, e o período da concessão deve ser ajustado a essa necessidade de investimento.

Acata, portanto, a recomendação da AMT, quando diz que cada caso é um caso.
Ainda existem muitas discussões no sector e muitas sensibilidades mesmo no âmbito da Comissão Europeia. O que eu digo é que mesmo que haja um limite e que 30 anos, por exemplo, não sejam suficientes para amortizar o investimento, o Estado pode obrigar-se a ressarcir a concessionária do montante que estiver em falta para amortizar no final da concessão. Porque se não, no limite, poderemos estar sempre a adicionar investimentos a investimentos, e a concessão nunca. Não é obrigatório que assim seja. A amortização que falta poderá ser feita pelo concessionário seguinte. 

Como justifica “sensibilidades” tão diferentes?
Porque é um tipo de serviço público diferente. Estamos habituados a raciocinar em termos de concessões de transportes em que existe, acima de tudo, um serviço público que é prestado e que, normalmente, tende a não ser equilibrado do ponto de vista financeiro. Por isso as questões que se colocam são relativas a qualidade de serviço, ao bem-estar e ao funcionamento das cidades. Mas quando chegamos à operação portuária estamos a falar de investimentos que só são feitos porque são rentáveis, por isso, é natural que o sector privado avance. O sector público tem de fazer outro tipo de investimentos. Por exemplo, os que fez há dez anos na janela única portuária. Agora está mais do que na hora de investir na janela única logística. 

O porto de Lisboa já recuperou das perdas que sofreu com a greve dos estivadores?
Já voltaram praticamente todos os armadores, mas ainda não voltaram todas as linhas. Mas como já passaram alguns meses desde que foi assinado o acordo de paz social, e como de facto essa paz social tem sido mantida, começa a haver confiança dos armadores e, portanto, estão a regressar. Os resultados já são positivos. Espero muito sinceramente que durante este ano o Porto de Lisboa volte à normalidade. Cada vez é mais importante fazer acções comerciais agressivas (não só para o porto de Lisboa mas para todos os outros). Por isso, pedi à Associação de Portos de Portugal para identificar os carregadores, os portos e os agentes de navegação a quem devemos bater à porta, ou receber cá, para mostrar a qualidade dos nossos portos.