Autarcas da Área Metropolitana do Porto recusam descentralização sem verbas
Rui Moreira pede cuidado na análise à proposta do Governo, na qual a ausência de garantias quanto ao financiamento assusta outros autarcas.
Os autarcas do Porto não conseguiram articular um parecer sobre o diploma de descentralização de competências proposto pelo Governo mas mostraram, na reunião desta sexta-feira do conselho metropolitano, que estão muito preocupados com a ausência de garantias de financiamento das tarefas de que o Estado pretende abdicar, recusando dar “um cheque em branco” ao executivo de António Costa.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Os autarcas do Porto não conseguiram articular um parecer sobre o diploma de descentralização de competências proposto pelo Governo mas mostraram, na reunião desta sexta-feira do conselho metropolitano, que estão muito preocupados com a ausência de garantias de financiamento das tarefas de que o Estado pretende abdicar, recusando dar “um cheque em branco” ao executivo de António Costa.
Na Área Metropolitana do Porto ninguém contesta a urgência de uma reforma descentralizadora e o esforço do ministro Adjunto, Eduardo Cabrita. Ninguém contesta que os municípios podem assumir mais competências – embora não haja consenso quanto ao âmbito destas. Mas nenhum autarca assumiu o acordo com a proposta legislativa em discussão, por vários motivos, sendo o primeiro deles o facto de ela não ser acompanhada de alterações à Lei das Finanças Locais ou pelo fim das restrições orçamentais que limitam a reorganização dos quadrados de pessoal e as contratações por parte das autarquias.
Foi Rui Moreira, um independente, quem inaugurou as críticas ao diploma. “Temos de olhar para isto com cuidado”, alertou, notando desde logo que o Orçamento de Estado deste ano contraria, na questão dos quadros de pessoal, esta intenção de reforço das competências municipais. Mas outros autarcas do PSD e do PS o acompanharam nos reparos, como o socialista José Ribeiro (Valongo) ou Elisa Ferraz, eleita pelo mesmo partido em Vila do Conde, que considerou “assustador” o âmbito das competências a descentralizar num período curto e sem noção das contrapartidas financeiras.
O Conselho Metropolitano tem sido liderado pelo PSD. Hermínio Loureiro saiu, ao renunciar ao mandato na Câmara de Oliveira de Azeméis, e, no final da reunião desta sexta-feira, conduzida excepcionalmente pelo socialista Joaquim Couto (Santo Tirso), foi eleito, com um único voto branco, o social-democrata Emidio Sousa, da Feira. Que fez questão de mostrar que, na região, as divisões, neste tema, mais do que partidárias, são de substância. Emídio Sousa assumiu que discorda também das propostas do seu partido sobre esta matéria, e exige que o debate seja acompanhado de um outro, sobre o aumento da participação dos municípios nas receitas do Estado.
A análise à proposta do Governo, pedida à área metropolitana pela Associação Nacional de Municípios, para apresentar no passado dia 9, ocupou, apesar do atraso em relação àquele prazo, boa parte da ordem de trabalhos do conselho metropolitano. Este organismo chegou a organizar, no ano passado, um grupo de trabalho para apresentar contributos para o debate, mas os três autarcas nomeados nunca chegaram a reunir-se sequer, o que, face à suposta importância do tema, mereceu críticas do socialista José Ribeiro.
Mesmo assim, Emídio Sousa propôs que, agora, fosse pedido o apoio das universidades da região, para a análise jurídico-financeira de uma proposta de descentralização alternativa – e mais ambiciosa – a desenhar pela própria área metropolitana, apesar de ser evidente que não há um consenso, entre os autarcas, sobre as competências que estariam dispostos a assumir.
Rui Moreira ou o próprio autarca da Feira consideram exígua a proposta da tutela, com o independente a exigir mais do que a mera gestão dos funcionários operacionais e administrativos dos serviços e da respectiva “hotelaria” – termo que usou para descrever a limpeza, vigilância e manutenção dos equipamentos - mas, de Arouca, o autarca Artur Neves considerou que a gestão da “hotelaria” já lhe bastava. Diferentes visões que justificariam, segundo Moreira ou Joaquim Couto, que a legislação não tratasse todos os municípios da mesma forma, como acontece.
Superautarcas ou directores-gerais nas CCDR?
Os autarcas da Área Metropolitana do Porto não conseguiram também chegar a um acordo sobre a proposta de Decreto-Lei que altera a Lei Orgânica das Comissões de Coordenação, e apenas concordaram em propor uma alteração ao colégio eleitoral que vai passar a escolher, em cada região, o futuro conselho directivo das CCDR. A maioria seguiu uma opinião expressa por Rui Moreira que considera que a lei deveria indicar que têm direito a voto os membros “eleitos” das câmaras e das assembleias municipais, deixando de fora os presidentes de junta, que fazem parte das assembleias por inerência. Para o autarca do Porto, de outra forma os municípios com muitas freguesias ficariam sobre-representados no colégio eleitoral.
Os autarcas vão, segundo a proposta do Governo, passar a eleger o líder da respectiva comissão regional, mas o presidente da Câmara da Póvoa de Varzim, o social-democrata Aires Pereira, questionou qual a importância dessa mudança, se os presidentes das CCDR continuarem a responder perante o Governo, e não perante a região. Rui Moreira preferia também que o responsável por este organismo fosse mais do que um “director-geral”, embora, ao contrário do seu homólogo da Póvoa, não considere exagerada a proposta de concentração de competências de diversas direcções regionais nestes organismos.