Reforma florestal: consenso para mais asneira é mesmo não!
Sem desmerecer o contributo doutros agentes, não se poderá fazer prevenção de incêndios sem sapadores florestais. Com medidas assim está a cavar-se a sepultura das brigadas de sapadores que ainda vão resistindo.
Em 3 de Novembro passado este jornal publicou um artigo de opinião meu intitulado “Reforma Florestal: consenso para a asneira, não!”. A ideia central desse artigo que continuo a manter é que o pacote legislativo que resultou do Conselho de Ministros de 27 de Outubro persiste num erro que perdura na política florestal há cerca de dois séculos, pelo menos, que é o de privilegiar “instrumentos de política de comando e controlo, em vez de incentivos à melhoria da organização dos produtores florestais privados para a gestão dos seus espaços florestais.”
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Em 3 de Novembro passado este jornal publicou um artigo de opinião meu intitulado “Reforma Florestal: consenso para a asneira, não!”. A ideia central desse artigo que continuo a manter é que o pacote legislativo que resultou do Conselho de Ministros de 27 de Outubro persiste num erro que perdura na política florestal há cerca de dois séculos, pelo menos, que é o de privilegiar “instrumentos de política de comando e controlo, em vez de incentivos à melhoria da organização dos produtores florestais privados para a gestão dos seus espaços florestais.”
Apesar desta divergência de fundo, restava ainda uma esperança sobre o que poderia vir num programa que não faz parte deste pacote legislativo, mais precisamente o dos sapadores florestais. É que, se, com alguma benevolência, quisermos procurar na política florestal algum ténue esboço do que poderia ser o regime de contratos programa entre o Estado e as organizações de produtores florestais que é advogado nesse artigo, isso seria o programa de sapadores florestais. Com vários defeitos que é preciso corrigir, e sem se dirigir em exclusivo às organizações de produtores florestais, apesar de tudo, este programa é a medida de política que, há mais anos (desde Agosto de 1999) tem providenciado co-financiamento público para os custos de investimento e de funcionamento de acções de produção de um bem público (prevenção de incêndios) providenciado pelas organizações com sapadores florestais.
Essa esperança de que, pelo menos, daqui poderia vir alguma coisa de positivo era alimentada pela informação que circulava sobre a actualização de 35000 para 40000 euros do co-financiamento do Estado para os custos do “serviço público” prestado pelas brigadas de sapadores florestais, co-financiamento esse que nunca actualizado desde o início deste programa, ou seja, desde ... 1999!!! Se o tivesse sido, agora o seu valor deveria ser não de 40000, mas de 47000 euros.
Apesar do valor de 40000 euros ficar aquém do necessário, situação que ainda se poderia aceitar dada a situação em que se encontram as contas públicas, esta actualização poderia ser o sinal do início de uma mudança gradual no sentido de levar o valor desse co-financiamento público para os níveis em que deverá estar. A esperança sobre esta mudança morreu com a publicação do Decreto-Lei N.º 8/2017, de dia 9 de Janeiro, onde se diz, no n.º 6 do artigo 19.º, que o valor da comparticipação do Estado que, de facto, passa para 40000 euros, será "atualizado com periodicidade não inferior a cinco anos". Com as subidas no salário mínimo que têm repercussões directas nos gastos de pessoal das brigadas de sapadores este aumento de 5000 euros por brigada já estará todo absorvido por essas subidas de salários em 2018. O que fazer, então, nos três, ou mais anos seguintes em que a comparticipação pública não vai ser actualizada?
Há mais situações que oneram os custos das brigadas de sapadores e que este decreto deveria ter corrigido, mas não corrigiu, como, por exemplo, contar com se fossem dias úteis, sem contar a correspondente folga a que os sapadores têm direito, os fins-de-semana em que eles estão de “serviço público”. A consequência para as organizações com brigadas de sapadores florestais que respeitem este direito dos trabalhadores é que lhes têm que dar folgas, por sua conta e sem nenhuma comparticipação do Estado, correspondentes a cerca de um mês de trabalho por brigada e por ano!
Sem desmerecer o contributo doutros agentes, não se poderá fazer prevenção de incêndios sem sapadores florestais. Com medidas assim está a cavar-se a sepultura das brigadas de sapadores que ainda vão resistindo. Por isso, não me venham falar de “reforma” da política florestal, nem de que se está a dar prioridade à prevenção de incêndios. Face à realidade que se vive no terreno por quem lá está a trabalhar por esta causa, não só no Verão, mas no Inverno e no resto do ano, essas “reformas” e essas declarações de prioridade são só conversa. Desta conversa, já estamos cansados!