Costa sobre Mário Soares: "Foi o rosto e a voz da nossa liberdade”
O primeiro-ministro assinalou a entrega "às gerações futuras da memória de um grande português de quem tivemos o privilégio e a honra de ser contemporâneos".
O primeiro-ministro juntou-se esta terça-feira à sessão evocativa de homenagem a Mário Soares no Mosteiro dos Jerónimos, através de uma mensagem em vídeo, em que o recordou como "o rosto e a voz" da liberdade em Portugal.
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O primeiro-ministro juntou-se esta terça-feira à sessão evocativa de homenagem a Mário Soares no Mosteiro dos Jerónimos, através de uma mensagem em vídeo, em que o recordou como "o rosto e a voz" da liberdade em Portugal.
"Mário Soares foi, em momentos decisivos, o rosto e a voz da nossa liberdade. Desse título, que era certamente aquele que mais lhe agradaria, raros homens se podem orgulhar", afirmou António Costa, numa intervenção de cerca de dez minutos que gravou na Índia, onde se encontra em visita de Estado.
Dirigindo-se aos "familiares, amigos, admiradores e camaradas de Mário Soares", e em especial aos seus filhos, "cara Isabel, caro João", o primeiro-ministro e secretário-geral do PS começou o seu discurso declarando: "Entregamos hoje às gerações futuras a memória de um grande português de quem tivemos o privilégio e a honra de ser contemporâneos".
"Mário Soares construiu a história e, por isso, a história guardará o seu nome, a sua obra, o seu exemplo. É um exemplo de combate constante por aquilo em que acreditava. É um exemplo de coragem de dizer o que pensava e de fazer o que devia, ainda que fosse o único a dizê-lo e a fazê-lo, mesmo que ficando por uns tempos, mas apenas por uns tempos, sozinho. É um exemplo de génio político, que alcançava o que parecia impossível de alcançar", acrescentou.
De gravata preta, tendo ao seu lado uma bandeira nacional, António Costa apontou o fundador do PS também como "um exemplo de amor à vida e de energia criadora" e "um exemplo de político que, até ao fim, se assumiu integralmente como tal, consciente de que a política, feita com idealismo e com convicção, é uma das mais nobres actividades humanas, por ser um serviço prestado à comunidade e ao país".
O primeiro-ministro relembrou o seu percurso, antes e depois do 25 de Abril de 1974: "Resistente à ditadura, deportado e exilado, preso político, fundador e secretário-geral do PS, ministro dos Negócios Estrangeiros, primeiro-ministro, vice-presidente da Internacional Socialista, deputado e líder da oposição, Presidente da República, presidente do Movimento Europeu, deputado ao Parlamento Europeu, presidente da Comissão Mundial dos Oceanos, presidente da Comissão de Liberdade Religiosa, presidente da Fundação que tem o seu nome, autor de dezenas de livros".
Segundo António Costa, em todas essas circunstâncias, Soares foi inspirado pela mesma "grande visão humanista". "Com ela, configurou o Portugal democrático e foi o autor das suas opções fundamentais, tornando-se o principal fundador da nossa democracia e um dos portugueses mais prestigiados no mundo. Com esta visão, construiu o Estado de direito social e fez reformas que tornaram Portugal um outro e melhor país", considerou.
Sobre os valores de Mário Soares, declarou que, "actualizados pela evolução das ideias e do mundo, foram sempre os da sua vida: a liberdade, a igualdade e a fraternidade". "Republicano, laico e socialista, assim se disse e assim se quis. E poderíamos acrescentar: humanista universalista - português, europeu e cidadão do mundo", completou.
O primeiro-ministro defendeu que "Soares pode ter-se enganado às vezes no acessório, mas nunca se enganou no que era fundamental, e o fundamental para ele era a visão que tinha do país, da Europa e do mundo". António Costa assinalou que foi no Mosteiro dos Jerónimos, "neste lugar histórico e simbólico", que Portugal assinou em 1985 o tratado de adesão à Comunidade Económica Europeia (CEE), com Soares na chefia do Governo.
Numa abordagem mais pessoal, lembrou "o seu amor pela vida e pelas coisas boas da vida", louvou "a sua coragem ímpar" e "o optimismo que nunca desistia" e contou que "conversar com ele era uma experiência exaltante, inesquecível", resumindo: "Como tantos dissemos tantas vezes, Soares é fixe!".
Nesta mensagem, o primeiro-ministro evocou também "a figura ímpar e inseparável de Maria de Jesus Barroso", mulher de Mário Soares, e dirigiu à família a sua "solidariedade amiga".
No final, invocando "Os Lusíadas", afirmou: "A única consolação que podemos ter, nesta hora de tristeza, é a de que, para homens como Mário Soares, a morte existe menos do que para os outros homens. Da lei da morte, como disse Camões, eles se libertaram pelas obras valorosas da sua vida".
"Com a memória de Mário Soares presente entre nós, continuaremos o seu combate por um Portugal melhor. Obrigado, Mário Soares. Viva a liberdade, viva a República, viva Portugal", concluiu.
Mário Soares morreu no sábado, aos 92 anos, no Hospital da Cruz Vermelha, em Lisboa. O Governo português decretou três dias de luto nacional, até quarta-feira.
O corpo do antigo Presidente da República esteve em câmara ardente no Mosteiro dos Jerónimos entre as 13h10 de segunda-feira e as 11h00 nesta terça-feira. O funeral realiza-se logo a seguir, pelas 15h30, no Cemitério dos Prazeres, em Lisboa, após passagem do cortejo fúnebre pelo Palácio de Belém, Assembleia da República, Fundação Mário Soares e sede do PS, no Largo do Rato.