Mário Soares: o da História e o das histórias
Mário Soares sonhou um Portugal livre e democrático e lutou por tornar esse sonho realidade: e a História reconhecer-lhe-á sempre a dimensão do seu sonho!
Mário Soares é um homem da geração do meu avô. Quando terminou o seu último mandato, como eurodeputado, tinha eu 13 anos. Cresci quando Mário Soares era já o da História: estadista de renome, político central na luta contra a ditadura, obreiro de um Portugal livre e democrático, pluralista e europeísta.
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Mário Soares é um homem da geração do meu avô. Quando terminou o seu último mandato, como eurodeputado, tinha eu 13 anos. Cresci quando Mário Soares era já o da História: estadista de renome, político central na luta contra a ditadura, obreiro de um Portugal livre e democrático, pluralista e europeísta.
Como todas as pessoas da minha idade, não tenho a experiência de viver oprimido, não conheço o lápis azul da censura, não vivo ameaçado de que me prendam por razões políticas, não tenho medo de me expressar, de dizer o que penso, de ser livre – livre de dizer, de agir e de fazer. Não sei o que é não poder ser quem sou!
É natural para mim ter em Mário Soares um dos heróis do Portugal democrático. Quando leio a História é esse homem que encontro: o herói da liberdade e da democracia.
Não ignoro porém que este homem não foi um político consensual. Para as gerações dos meus pais e avós Mário Soares não é apenas o da História, é também o das suas histórias pessoais. Sendo o que é para mim, é também um homem controverso: muitos se lembram e discordam de muitas posições que assumiu, de decisões que tomou e de apoios que deu; alguns não o perdoam pela descolonização; outros tantos discordarão de atitudes que teve ou de candidaturas que entenderam que não deveria ter apresentado...
Não nego tudo isso também: num país republicano e democrático o poder não é sagrado e os políticos estão ao mesmo nível dos seus concidadãos. (A sacralização do poder é, de resto, uma construção dos absolutismos, das ditaduras e dos regimes totalitários.) Mário Soares sabia que todos esses discordavam e se lhe opunham, ou que simplesmente não gostavam dele: mas procurou sempre desempenhar os cargos públicos que lhe foram confiados como um serviço aos cidadãos, próximo deles e sujeito à crítica; ajudou a construir assim a nossa democracia e – estou certo – ele próprio não quereria que fosse de outra forma: de algum modo os seus detratores e antipatizantes acabam também por o homenagear sempre que em liberdade expressam a sua oposição. Poderem fazê-lo é também parte do seu legado.
Mário Soares, o das histórias, não foi certamente um homem perfeito; mas foi um homem autêntico. Porque todos os homens autênticos podem até ser menores do que os seus sonhos, mas são seguramente maiores do que a mera soma dos seus atos, exatamente porque os sonharam… Mário Soares sonhou um Portugal livre e democrático e lutou por tornar esse sonho realidade: e a História reconhecer-lhe-á sempre a dimensão do seu sonho!
Sobre as outras histórias, as do quotidiano, as dos pais e avós das pessoas da minha idade, dos apoiantes e dos opositores, tudo serão histórias contadas ou por contar. É certo que nem todos fazemos tudo bem. Mas se a História o lembra, o país o deve lembrar também quando o vê partir...
Entre a História e as histórias, sei que eu hoje posso escrever livremente a minha história... Mas só porque Mário Soares ajudou a escrever a nossa.