Receita de 1400 milhões do "perdão fiscal" inclui dívidas já dadas como incobráveis
Plano de regularização de dívidas ao fisco e Segurança Social rende 550 milhões este ano. IRC e IVA foram os impostos mais regularizados. Medidas para facilitar pagamentos ao fisco deviam ter sido lançadas há mais tempo, diz Rocha Andrade.
O plano de regularização de dívidas ao fisco e à Segurança Social vai render aos cofres públicos 1434 milhões de euros ao longo de mais de uma década, somando pagamentos de dívida na íntegra e planos até 150 prestações. O fisco encaixa 1144 milhões e a Segurança Social 290 milhões.
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O plano de regularização de dívidas ao fisco e à Segurança Social vai render aos cofres públicos 1434 milhões de euros ao longo de mais de uma década, somando pagamentos de dívida na íntegra e planos até 150 prestações. O fisco encaixa 1144 milhões e a Segurança Social 290 milhões.
Só para as contas deste ano o Estado já encaixou 551 milhões de euros (ou seja, mais de um terço do total) e o valor ainda pode ser superior porque o pagamento das dívidas na íntegra e da primeira prestação à Segurança Social só termina na sexta-feira, embora a adesão a este programa excepcional já tenha terminado.
Uma das surpresas do Peres, como é conhecido o Programa Especial de Redução de Endividamento ao Estado, é o facto de o Estado ter conseguido captar dívidas que até agora a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) já tinha dado como incobráveis, revela em entrevista ao PÚBLICO o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Fernando Rocha Andrade, admitindo que para isso ajudou a possibilidade de as empresas e as famílias pagarem a prestações.
Essa é uma das razões que levam o secretário de Estado a fazer um balanço positivo da medida e a justificar o facto de ter lançado um novo plano de regularização apenas três anos depois do anterior programa, que apenas permitia o pagamento de uma só vez.
O Governo não sabe ainda quanto foi possível arrecadar de dívidas que estava classificada como “incobrável” – em que a cobrança coerciva poderia já não resultar em receita. Mas Rocha Andrade garante que uma parte das adesões vem daqui: de famílias ou empresas sem bens penhoráveis mas que poderão ter conseguido mobilizar recursos financeiros (crédito ou dinheiro dos accionistas no caso das empresas, por exemplo) e que viram “uma possibilidade de regularizarem a sua situação” através de prestações. Por isso diz que há mais tempo deviam ter sido lançadas medidas para facilitar os pagamentos ao fisco.
93 mil contribuintes
Quem aderiu ao Peres, teve de escolher entre duas modalidades: ou pagando imediatamente este ano (com isenção dos juros de mora, juros compensatórios, custas do processo de execução fiscal e encargos com o processo de contra-ordenação); ou entrando num plano até 150 prestações mensais (beneficiando de uma redução dos juros e das custas, maior quanto menor for o tempo de pagamento – até 36 prestações, com uma redução é de 80%, de 37 até 72 prestações com uma diminuição de 50%, e de 73 a 150 prestações com um corte de 10%).
Dos sujeitos (singulares ou empresas) com dívidas tributárias, acabaram por aderir ao Peres 93 mil contribuintes; à Segurança Social mais de 48.500. E tanto num caso como no outro a maior parte optou por entrar num plano a prestações (ou converter no Peres um plano já em curso).
No fisco, o pagamento faseado foi escolhido por 60% dos contribuintes, uma opção que foi ainda mais expressiva no caso da Segurança Social, onde dois terços (66%) vão pagar a prestações.
Os mais de 1100 milhões de euros de dívida tributária abrangida no Peres correspondem a “cerca de 573 mil processos por dívidas fiscais, com a dívida média por processo a fixar-se nos 1997 euros e a dívida média por contribuinte nos 12.323 euros”, segundo o balanço feito pelo Ministério das Finanças.
Ajuda ao défice
O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais ainda não tinha na terça-feira em mãos a distribuição da receita do Peres por imposto. Apenas soube adiantar ao PÚBLICO que a maior fatia dos mais de 1100 milhões de receita prevista se referem a empresas. “O imposto em que existe maior volume é o IRC, seguido do IVA”, porque as empresas têm, por natureza, um volume de dívidas maior, diz Rocha Andrade.
A receita vem ajudar a corrigir as contas públicas no primeiro ano de Governo de António Costa, ainda que Rocha Andrade garanta que, mesmo sem o Peres, as metas do défice prometidas à Comissão Europeia seriam atingidas. E para 2017, já com um primeiro balanço do Peres, o Governo mantém a previsão de conseguir aqui 100 milhões de euros.
O Governo tinha previsto arrecadar mil milhões de euros ao longo de dez anos, mas esta projecção sempre foi assumida como conservadora, tendo em conta a experiência dos planos de regularização anteriores, desde logo o de 2013. O valor da receita do Peres supera em alguns milhões esse anterior programa, o RERD de 2013, que obrigava ao pagamento integral e com o qual o Estado conseguiu arrecadar 1253 milhões de euros (fisco e Segurança Social).
O Peres arrancou a 4 de Novembro e o fim do período de adesão estava inicialmente previsto para 20 de Dezembro, mas o Governo acabou por dar mais três dias, para evitar problemas de processamentos no Portal das Finanças. O prolongamento, diz Rocha Andrade, teve pouca expressão nas adesões, mas permitiu “um volume de pagamentos muito significativo – um crescimento de quase 100 milhões de euros”.
Como a entrada no Peres não impede a existência de litígio fiscais (uma empresa pôde optar por regularizar a dívida e contestá-la), há receita que pode vir a ser restituída aos contribuintes, porque no caso de o Estado perder terá de devolver esse dinheiro. Rocha Andrade vinca, no entanto, que nas verbas da receita “normal” de qualquer imposto está também contabilizada “receita em que há pagamento e a seguir há a contestação judicial do pagamento e nisso o Peres não se distingue”.