Como é que as aves perderam os dentes? Um novo dinossauro ajuda a explicar
Encontraram-se na China fósseis de uma espécie de dinossauro invulgar: os seus indivíduos recém-nascidos tinham dentes, os adultos já não.
A descoberta de uma espécie de dinossauro cujos indivíduos iam perdendo os dentes à medida que cresciam, e que não voltavam a nascer, algo nunca visto antes em fósseis, pode ajudar a compreender o aparecimento do bico nas aves. Sim, porque as aves, as primitivas, já tiveram dentes.
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A descoberta de uma espécie de dinossauro cujos indivíduos iam perdendo os dentes à medida que cresciam, e que não voltavam a nascer, algo nunca visto antes em fósseis, pode ajudar a compreender o aparecimento do bico nas aves. Sim, porque as aves, as primitivas, já tiveram dentes.
Este dinossauro bípede, o Limusaurus inextricabilis, é do grupo dos terópodes, a partir do qual evoluíram as aves, referem os paleontólogos envolvidos neste trabalho publicado esta quinta-feira na revista científica Current Biology.
“Descobrimos um fenómeno muito raro e muito interessante num dinossauro [do grupo dos] ceratossauria, em que as mandíbulas dos juvenis com dentes passaram para mandíbulas bicudas sem dentes nos indivíduos mais maduros”, frisa Shuo Wang, da Universidade Normal de Pequim e outro dos autores do trabalho, citado num comunicado de imprensa.
A equipa estudou 19 esqueletos fossilizados e bem conservados do Limusaurus inextricabilis, que tinham morrido aprisionados num pântano no território que actualmente é a província de Xinjiang, no extremo Oeste da China. Entre os esqueletos encontram-se desde recém-nascidos até adultos.
Ora o esqueleto de um bebé Limusaurus tinha pequenos dentes afiados, enquanto os adultos já não os tinham. “Esta descoberta é importante por duas razões”, sublinha James Clark, professor de biologia na Universidade George Washington, na capital norte-americana, e outro dos autores do artigo científico. “Primeiro, é extremamente raro encontrar uma série de esqueletos da mesma espécie de dinossauros, distribuindo-se desde o nascimento até à idade adulta”, explica o investigador. “Segundo, estas modificações anatómicas invulgarmente drásticas sugerem uma mudança importante do regime alimentar dos Limusaurus ocorrida entre a adolescência e a idade adulta.”
Os fósseis indicam que os Limusaurus muito jovens poderão ter sido carnívoros ou omnívoros, enquanto os adultos seria apenas herbívoros e não precisariam assim de dentes, que serviriam principalmente para mastigar carne. As análises a substâncias químicas nos ossos confirmam esta hipótese, dizem os cientistas.
“Para a maioria das espécies de dinossauros dispomos de poucos exemplares, por isso temos uma compreensão muito incompleta do desenvolvimento da sua biologia”, acrescenta Josef Stiegler, também da Universidade George Washington e co-autor da descoberta.
Josef Stiegler nota ainda que o desaparecimento dos dentes nunca tinha sido observado antes em fósseis de animais extintos ou em répteis, mas este fenómeno encontra-se em certos animais existentes actualmente, como peixes e um anfíbio, bem como os ornitorrincos, um mamífero semiaquático da Austrália.
Em estudos anteriores, a equipa já tinha investigado as patas dianteiras do Limusaurus (cuja descoberta foi relatada pela primeira vez em 2001), determinando que o tamanho reduzido do que corresponde ao dedo indicador poderá ter marcado uma transição para a perda, mais tarde, deste dedo e do polegar entre os terópodes. De forma semelhante, as patas das aves têm cada uma três dedos, o equivalente nos seres humanos ao dedo médio, o anelar e o mindinho.