Eram uma minoria escondida, agora saíram do armário
Há estudantes que vão como autopropostos a exame, mas que estiveram na escola quase até ao fim. O PÚBLICO passou a tê-los em conta.
Representam apenas 6% das provas de exame do ensino secundário realizadas em 2015/2016, mas mesmo sendo uma minoria são suficientes para alterar o ranking das escolas. Falamos dos alunos que vão a exame como autopropostos mas que frequentaram a escola quase todo o ano. Pela primeira vez, o PÚBLICO incluiu as notas destes alunos no cálculo dos resultados das escolas secundárias.
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Representam apenas 6% das provas de exame do ensino secundário realizadas em 2015/2016, mas mesmo sendo uma minoria são suficientes para alterar o ranking das escolas. Falamos dos alunos que vão a exame como autopropostos mas que frequentaram a escola quase todo o ano. Pela primeira vez, o PÚBLICO incluiu as notas destes alunos no cálculo dos resultados das escolas secundárias.
Que alunos são estes? Vamos por partes: tradicionalmente, o PÚBLICO utiliza nos seus rankings apenas as notas obtidas nos exames pelos alunos internos de cada escola — que são aqueles que frequentam as aulas ao longo de todo o ano lectivo. Os chamados "autopropostos" sempre foram excluídos desta análise no secundário.
Porém, este ano, pela primeira vez, o Ministério da Educação (ME) forneceu uma base de dados que permite distinguir os diferentes tipos de autopropostos que existem. De facto, há aqueles que só vão à escola para fazer exames (caso, por exemplo, dos que frequentam escolas artísticas, mas que precisam das provas para ingressar no ensino superior, pelo que vão a uma escola regular sujeitar-se a exame), e seria incorrecto incluí-los na avaliação do desempenho da escola onde só vão para fazer exames. Por isso, estes continuam a não ser contabilizados.
Mas há autopropostos de outro género: os que frequentam a escola ao longo de todo o ano lectivo e, chegando ao 3.º período, anulam a matrícula (podem fazê-lo até ao 5.º dia útil do 3.º período), inscrevendo-se nos exames; e os que frequentaram a escola até ao final do ano lectivo sem conseguirem uma classificação interna final de pelo menos 10 valores — que é a nota mínima para ir a exame nacional —, pelo que têm de se apresentar a essa avaliação como autopropostos (neste caso, a prova nacional vale 100% da nota final). Este ano, o PÚBLICO tem também em conta estes dois grupos de alunos. O Ministério da Educação reconhece que, por terem estado na escola durante todo o ano ou quase, os seus resultados devem ser creditados aos estabelecimentos que frequentaram.
Que impacto é que a inclusão destes alunos autopropostos tem? Em pelo menos seis escolas públicas bem classificadas, fá-las descer significativamente na tabela. Por exemplo, a Escola Secundária do Restelo, em Lisboa, fica na 48.ª posição (em 590) se se tiver em conta apenas os alunos internos; cai para o 60.º lugar se se incluir também na análise os resultados dos dois referidos grupos de autopropostos (que representam de 16,2% das provas realizadas nesta escola).
Não são poucos os relatos que dão conta de pressões de professores para que os alunos mais fracos anulem a matrícula e vão como autopropostos ao exame. Será uma das estratégias para garantir bons resultados das escolas nos rankings — que habitualmente, como se disse, só levam em linha de conta as notas dos alunos internos que prestam provas. Júlio Santos, director da secundária do Restelo, garante que tal não se passa no seu estabelecimento: “Não é prática da escola aconselhar os alunos a candidatarem-se como autopropostos, antes pelo contrário.”
Anulações começam antes
Nas públicas que costumam figurar no primeiro terço dos rankings, uma das maiores quedas registadas, por via da inclusão dos autopropostos, é protagonizada pela Escola Básica e Secundária Rainha D. Amélia, em Lisboa. Fica na 103.ª posição (em 590) se se tiver em conta apenas os alunos internos; cai para o 129.º lugar se se incluir também na análise os resultados dos referidos dois grupos de autopropostos (que representam de 15% das provas realizadas).
“Nunca foi política da escola levar os alunos a anular. Damos importância à avaliação externa, mas não ao ponto de levar a exame só os alunos com boas notas, como aliás se pode ver pelos lugares que costumamos ter nos rankings”, garante Isabel le Gué, directora da secundária Rainha D. Amélia.
Nesta escola, desde que a escolaridade obrigatória foi alargada para os 12 anos, todos os processos de anulação de matrícula passam pelas mãos da directora. E existem dois casos que a levam a mobilizar os directores de turma, os professores das disciplinas em causa e os alunos e encarregados de educação: os dos pedidos de anulação dos alunos com notas muito altas (que acham que vão conseguir ter melhores notas se ficarem só com a nota do exame), e que têm vindo a crescer nos últimos anos, e aqueles que estão com 9 ou 10 valores na avaliação interna. “Se depois de todo este processo o aluno insistir na anulação, então defiro o pedido porque esta possibilidade está prevista na legislação”, diz, admitindo que os alunos mais fracos acabam por ser maioritários entre os que anulam a matrícula.
Isabel le Gué alerta, contudo, para o facto de os dados agora disponibilizados pelo Ministério da Educação não darem conta de todo o retrato, por só revelarem o que se passa nos anos em que existem exames. “Há escolas que estão sempre muito bem colocadas nos rankings e onde as anulações de matrículas começam logo, em força, no 10.º ano”, revela. “Sou pela transparência, mas então que esta seja total.” Com Andreia Sanches