Em 78% das escolas metade dos alunos não faz um percurso de sucesso no 3.º ciclo
Em apenas um quinto das escolas mais de metade dos estudantes consegue ter êxito no final do ensino básico.
Há 23 escolas onde menos de 10% dos alunos conseguem fazer percursos limpos no 3.º ciclo, ou seja, conseguem passar sem reprovar no 7.º e no 8.º anos e ter positiva nos dois exames nacionais, de Português e de Matemática, no 9.º ano. Há mesmo uma escola onde apenas 1,1% dos alunos estão nesta situação, revela o indicador global dos percursos directos de sucesso fornecido pelo Ministério da Educação (ME), pelo segundo ano consecutivo para o ensino básico.
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Há 23 escolas onde menos de 10% dos alunos conseguem fazer percursos limpos no 3.º ciclo, ou seja, conseguem passar sem reprovar no 7.º e no 8.º anos e ter positiva nos dois exames nacionais, de Português e de Matemática, no 9.º ano. Há mesmo uma escola onde apenas 1,1% dos alunos estão nesta situação, revela o indicador global dos percursos directos de sucesso fornecido pelo Ministério da Educação (ME), pelo segundo ano consecutivo para o ensino básico.
Este indicador permite fazer o chamado "ranking de sucesso", ou seja, uma seriação que tenha em conta os alunos que fazem o 3.º ciclo sem mácula. No total das 1085 escolas analisadas – de fora ficam as que têm menos de 50 alunos, as dos Açores, da Madeira e as portuguesas no estrangeiro –, só em 237 mais de 50% dos alunos têm percursos de sucesso. Isso significa que em 78% das escolas metade ou menos de metade dos alunos não consegue ter um percurso limpo. Apenas 16 têm 90% dos alunos a transitar no 7.º e no 8.º anos sem repetições e com positiva nos exames – só uma pública figura neste quadro, a secundária Infanta D. Maria, em Coimbra.
O 1,1% de sucesso da básica Óscar Lopes, em Matosinhos, deixa irritada Margarida Soares, coordenadora desta escola, que pertence ao grupo de escolas com projectos especiais e que se encontram em contextos mais frágeis, as chamadas "escolas em Território Educativo de Intervenção Prioritária (TEIP)" – os três últimos lugares pertencem a TEIP, além da escola de Matosinhos, figuram duas de Lisboa, as básicas do Alto do Lumiar (1,8%) e Pintor Almada Negreiros (2,3%).
A coordenadora começa por dizer que “é preciso explicar muita coisa” e não é por telefone. Além disso, “não vê motivos para justificar o injustificável”, mas perante a insistência do PÚBLICO contesta os números, diz que não são reais, que há mais alunos com percursos de sucesso, embora a escola esteja num “contexto muito difícil”. “Estamos a remar, há muito trabalho e muita motivação”, adianta, sem concretizar o que faz a escola para o sucesso dos seus alunos, mas lembra que há alunos que saíram da sua escola e que fizeram Engenharia ou Medicina.
Vinte alunos com retenções
Além de o ME identificar a percentagem de alunos que consegue fazer percursos limpos, também compara esse valor com a percentagem média nacional para estudantes que, três anos antes, demonstraram um nível escolar semelhante aos da escola. O objectivo é perceber se o trabalho desenvolvido ao longo do ciclo conduziu a resultados iguais, ou se os alunos da escola se destacam pela positiva (ou pela negativa) dos seus colegas nacionais. E há escolas onde a disparidade é enorme, como a básica Padre João Rodrigues em Sernancelhe, onde 22,7% dos alunos fazem percursos de sucesso, mas o expectável (face à média nacional) seria 57,6%. O PÚBLICO contactou insistentemente esta escola, sem sucesso.
Segue-se a secundária de Vila Verde, com uma diferença de 26,9% entre os percursos dos seus alunos (15,8%) e a média nacional (42,6%) – uma das razões por que tal acontece é transitarem para a secundária os alunos mais velhos do agrupamento. “Do grupo que se apresentou a exame, entraram 20 no 7.º ano com retenções e, destes, três com retenções repetidas, não raras vezes com um perfil problemático do ponto de vista disciplinar, ou com necessidades educativas especiais, portanto, alunos com mais dificuldades, o que se traduz, como é normal, num abaixamento dos resultados globais”, justifica a direcção por email, sublinhando que, se assim não fosse, “os resultados estariam em linha ou acima da média nacional, como sucede na generalidade das disciplinas do ensino secundário nesta escola”.
A básica alentejana Frei António Chagas, na Vidigueira, é a quarta desta lista das maiores disparidades e a directora Isabel Contente consegue explicá-las. A escola está numa zona desfavorecida com muitas famílias que recebem rendimento social de inserção e 12% de alunos de etnia cigana. As retenções começam logo no 2.º ano e a escola tem trabalhado para contrariar estes números – com turmas do projecto Fénix, com professores em coadjuvação, com planos de melhoria, mas "não é fácil" quando as famílias não colaboram, lamenta a directora. Quando os alunos começam a faltar, a escola informa a Comissão de Protecção de Menores e o conselho local de Acção Social. “Eles lá voltam à escola, mas depois voltam a ausentar-se. E assim é difícil”, revela.
Do outro lado da tabela, aquele onde estão as escolas que superam as médias nacionais, está o Colégio do Vale, na Charneca da Caparica, em Almada. Um privado que recebe alunos desde a creche, de famílias de classe média e média alta. Uma escola que aposta nas línguas estrangeiras e nas novas tecnologias, onde uma mensalidade de 500 euros paga a escolaridade e as actividades extracurriculares. Aqui, a percentagem de alunos que consegue percursos limpos é de 74,5, quando a média nacional é de 48,7%. A directora pedagógica Cristina Raposo diz que o segredo está no acompanhamento e apoio individualizado.
Depois do Colégio do Vale seguem-se duas públicas, a n.º2 da Pampilhosa, na Mealhada; e a de Manhente, em Barcelos – que já no ano passado ficavam nas primeiras posições neste indicador. A terceira pública surge em 14.ª posição e é a básica D. Maria II, Gavião, Vila Nova de Famalicão (53%, quando o expectável seria 37,4%) e que explica os resultados com os apoios aos alunos, bem como as reuniões periódicas que a direcção faz com os pais – estes não precisam de ter estudos (os dados do ME revelam que as mães têm 9,4 anos de escolaridade) para acompanhar os filhos em casa, defende a directora Cândida Pinto. Neste agrupamento os professores trabalham em colaboração, os do 2.º e 3.º ciclos vão às escolas de 1.º ciclo e é desde o primeiro que foi lançado o projecto Fénix.
Na básica Campo Aberto, em Beiriz, onde nasceu o Fénix – um projecto de apoio aos alunos assim que estes têm dificuldades –, a diferença entre os percursos de sucesso dos seus alunos (44,1%) e a média (65,8%) preocupa a directora Ana Marques, que atribui esse insucesso aos alunos que vêm de outras escolas a meio dos ciclos. "Sabem que temos o Fénix, procuram o agrupamento em desespero de causa, mas os alunos já deveriam ter entrado há mais tempo", diz, defendendo currículos "mais apelativos". "Somos uma escola básica e o que se pretende para o ensino básico é dar as bases que, mais tarde, poderão ser aprofundadas no secundário", diz.
Ranking de sucesso vs tradicional
O ME olha ainda para 1149 escolas para as quais tem um indicador de progressão dos resultados dos alunos entre os exames de Português e Matemática do 6.º e do 9.º anos, quando comparados com os outros alunos do país. Neste caso estão três escolas públicas à frente: as secundárias Marques de Castilho, em Águeda, e Carlos Amarante, em Braga; e a básica Rainha Santa Isabel, em Leiria.
Francisco Vitorino, director da Marques de Castilho, diz que o segredo está nas turmas homogéneas, que não é o mesmo que turmas de nível, ressalva. “Temos tentado que os bons alunos cheguem mais longe e isso é possível quando temos turmas equilibradas.” Além disso reúne-se regularmente com os pais – “A única pessoa que fala com os pais sou eu”, reforça – para os envolver na vida da escola e explicar os resultados passados e o que se pretende no futuro. “A estratégia está na informação”, revela. Embora seja uma escola de cidade, também tem “casos complicados” que se diluem nas turmas. A aposta é na avaliação contínua e não nos exames. “Nos últimos anos a retenção é residual para evitar o divórcio entre os miúdos e a escola.”
“Temos o cuidado de dar as mesmas condições a todos os alunos”, aponta Eusébio Fertusinhos, director da Carlos Amarante. Quando têm problemas, os estudantes são “identificados para ter apoio individualizado ou tutorias”. E as coadjuvações que existem no 1.º ciclo foram alargadas aos ciclos seguintes.
Se no chamado "ranking de sucesso" é o Colégio do Vale que está em melhor posição, no "ranking tradicional" é o Colégio Novo da Maia, onde os seus alunos obtiveram uma média aos dois exames de 4,30 (numa escala de 1 a 5). A média nacional foi de 2,87. O projecto diferencia-se por ser "inovador e assente em metodologias activas". O sucesso deve-se ao "empenho e dedicação dos seus docentes, alunos motivados" e famílias envolvidas, escrevem os directores Marina Torres Pinto e David Pinto.
No ranking tradicional, feito com base nos resultados dos exames nacionais, são as escolas privadas das principais cidades que se concentram no topo da tabela e as públicas, muitas TEIP, que ocupam as últimas posições. No ensino público foram feitas 162.299 provas e no privado 24.085.
As 74 privadas com contratos de associação com ensino básico, aquelas que são pagas pelo Estado para receber alunos que poderiam estar no ensino público, caso esse existisse no seu local de residência, estão espalhadas um pouco por toda a tabela, mas há 12 nos 100 primeiros lugares. Sete tiveram menos de 2,50 valores na média dos dois exames do secundário.
No 9.º ano, as raparigas (2,91 de média nacional) saem-se melhor do que os rapazes (2,72) e estão em maioria (91.704 contra 88.098).