Donald Trump nomeia Governo à sua imagem

Os nomes escolhidos para a futura Administração Trump são um reflexo do Presidente eleito: milionários sem experiência política e governativa, que nalguns casos nem sequer acreditam na missão dos departamentos que vão dirigir.

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TIMOTHY A. CLARY/AFP

Além de serem (quase todas) milionárias, as personalidades escolhidas pelo futuro Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, para integrar a sua Administração e governar o país distinguem-se por uma outra característica: a crítica feroz à organização e às políticas dos departamentos que vão dirigir, que nalguns casos inclui mesmo a defesa da sua extinção.

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Além de serem (quase todas) milionárias, as personalidades escolhidas pelo futuro Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, para integrar a sua Administração e governar o país distinguem-se por uma outra característica: a crítica feroz à organização e às políticas dos departamentos que vão dirigir, que nalguns casos inclui mesmo a defesa da sua extinção.

A política de nomeações de Trump mostra até que ponto o Presidente eleito tenciona romper com todas as convenções e tradições de Washington, e promover o “anti-sistema” à categoria de Governo. O corte com o passado vai para além da expectável mudança de orientação (ideológica) face às políticas da cessante Administração de Barack Obama.

Como referiu o consultor político republicano Ron Bonjean à rádio pública NPR, a maior diferença tem a ver com a abordagem de tábua rasa do futuro Presidente à missão de cada secretário e de cada departamento do Governo. “Cada nomeado vai poder remodelar, refazer e até demolir o seu departamento para o reconstruir tal como ele ou o Presidente entende”, declarou – é a interpretação literal da promessa de Trump de implodir o sistema por dentro e começar do zero.

Em quase todas as áreas, os nomes escolhidos por Donald Trump são um reflexo de si próprio. Tal como o futuro Presidente, são homens ricos e de sucesso, que se destacaram como “líderes” nos seus respectivos ramos de negócio mas que não têm qualquer experiência política e governativa e nenhuma ligação profissional às áreas que vão tutelar. Vários estão debaixo de suspeita – como aliás o Presidente eleito—, de ligações “perigosas” ao regime de Moscovo e ao líder russo Vladimir Putin. É o caso de Rex Tillerson ou do general Michael Flynn, que vão preencher os postos mais importantes da Administração, secretário de Estado e conselheiro de Segurança Nacional, responsáveis por definir a política externa e de segurança dos EUA.

Algumas das nomeações reforçam percepções relativas ao próprio Trump que alimentaram polémicas durante a campanha eleitoral: a promoção do seu controverso director de campanha, Stephen Bannon, ao cargo de principal conselheiro, consolida a imagem de racista, sexista, misógino e adepto de teorias da conspiração que se lhe colou; a profusão de milionários e dirigentes da alta finança que estende a influência de Wall Street e cava o fosso com a classe média e os trabalhadores blue collar que compuseram a sua base eleitoral.

Uma categoria de nomeados pode ser descrita como a dos “negacionistas” (de novo, à semelhança de Trump). Há os que não concordam com a existência do departamento que vão supervisionar – caso do governador Rick Perry, futuro secretário da Energia. E também existem aqueles que defendem políticas contrárias àquelas que são promovidas pelos seus departamentos: a secretária de Educação, Betsy DeVos, que quer desinvestir da escola pública; o secretário do Trabalho, Andy Puzder, que é contra o salário mínimo; o secretário da Saúde, Tom Price, que defende o fim do programa de acesso a cuidados médicos conhecido como Obamacare; ou o novo responsável pela Agência de Protecção do Ambiente, Scott Pruit, que não acredita nas alterações climáticas.

E finalmente há casos como o de David Friedman, indicado esta sexta-feira para o posto de embaixador dos Estados Unidos em Israel, e cuja escolha além de confirmar a mudança radical de política confirma o enorme potencial de instabilidade e conflito da futura Administração Trump. Não é difícil antecipar uma forte reacção no Médio Oriente à escolha de um diplomata que apoia a expansão dos colonatos judaicos na Cisjordânia e defende a mudança da capital para Jerusalém – a conclusão do processo de paz israelo-palestiniano, que Trump acredita estar ao seu alcance, tornou-se definitivamente uma miragem.

É este é apenas um exemplo das consequências que as decisões tomadas por Donald Trump (ao arrepio da tradição e às vezes até da legislação) podem vir a ter no funcionamento das instituições e nas relações internacionais. Tendo em conta que o futuro Presidente vai poder preencher o Governo com mais 4000 nomeados políticos, prevêem-se tempos conturbados em Washington.