“Já não é possível usar outra vez a bazooka na política monetária”
O economista Motoshige Itoh, defensor da política de Abenomics, reconhece que o optimismo é menor do que no início, mas assinala a existência de melhorias na economia.
Motoshige Itoh, um dos membros do Conselho para a Política Económica e Orçamental do Japão, continua a acreditar que, apesar de o banco central estar agora mais limitado naquilo que pode fazer, a estratégia seguida nos últimos quatro anos vai conseguir retirar o Japão da deflação. E avisa a Europa: o melhor é mesmo conseguir evitar cair numa armadilha da qual é muito difícil sair.
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Motoshige Itoh, um dos membros do Conselho para a Política Económica e Orçamental do Japão, continua a acreditar que, apesar de o banco central estar agora mais limitado naquilo que pode fazer, a estratégia seguida nos últimos quatro anos vai conseguir retirar o Japão da deflação. E avisa a Europa: o melhor é mesmo conseguir evitar cair numa armadilha da qual é muito difícil sair.
O ambiente parece agora mais sombrio em relação ao sucesso da Abenomics do que no início do mandato de Shinzo Abe. Porquê?
No início houve uma mudança muito dramática. E agora, o que acontece é que as pessoas têm uma noção mais correcta do que é a realidade. O entusiasmo e o optimismo não são tão grandes como no início, é certo, mas as pessoas reconhecem que a política de Abenomics é completamente diferente do que vinha acontecendo. Antes de Abe, tivemos seis primeiros-ministros em seis anos a seguirem direcções diferentes. Agora há um rumo que está a ser seguido e as pessoas estão a sentir que há mudanças a acontecer.
Mas os dados do crescimento e da inflação mostram que o problema está por resolver.
Os dados não são tão bons como se esperava, mas no mercado laboral as pessoas estão a sentir que os salários estão a subir. Não para quem está protegido pelo sistema de emprego para a vida inteira, mas para quem tem emprego em PME - essas estão a sentir os seus salários a subir.
Uma das chaves para garantir o crescimento da economia tem sido manter o iene baixo. Mas a verdade é que agora está a um nível mais alto do que há dois anos. É um motivo para preocupação?
Antes de Shinzo Abe chegar a primeiro-ministro, o iene estava muito valorizado face ao dólar - um dólar valia 80 ienes. O que aconteceu logo ao início foi uma forte depreciação do iene – um dólar passou a valer 120 ienes. Isso foi muito positivo para as exportações japonesas. Agora está a regressar para os 100 ienes. É verdade que não está tão baixo como há dois anos, mas penso que está a estabilizar a um nível apropriado. E ultimamente assistiu-se mesmo a uma descida do iene, por causa da expectativa de subida das taxas de juro nos Estados Unidos.
O Banco do Japão mudou recentemente a sua estratégia monetária. Há quem diga que está a admitir que não consegue fazer a inflação subir muito rapidamente, passando a apostar numa estratégia de mais longo prazo... É isso?
O banco central está realmente a admitir que a subida da taxa de inflação não foi tão dramática como inicialmente pensavam. E agora tem uma estratégia mais paciente.
Foi um erro a estratégia muito agressiva no início?
Não creio. Inicialmente, o Banco do Japão avançou com compras de dívida pública muito maiores do que as dos outros bancos centrais, para introduzir mudanças nas expectativas das pessoas em relação aos preços. As pessoas tinham-se habituado tanto à deflação que adaptaram as suas expectativas com base na sua experiência passada. E foi para quebrar isso que foi utilizada a bazooka.
Conseguiu-se mudar as expectativas?
Foi um sucesso parcial. Antes do Sr. Kuroda ser governador do Banco do Japão, a taxa média de inflação de três anos tinha sido de -0,6%. Com Kuroda, o mesmo indicador chegou a 0,5%. Não foram os 2% desejados inicialmente pelo banco central , mas houve um efeito positivo.
E agora, o que se vai fazer?
Agora o que se está a reconhecer é que já não é possível usar outra vez a bazooka. Há tantos títulos de dívida neste momento no balanço do banco central que se torna difícil comprar ainda mais. Mas é possível manter as taxas de juro negativas, e isso pode ser suficiente para continuar a produzir resultados.
Como é que os bancos japoneses estão a lidar a estas taxas de juro negativas?
Ao princípio entraram em pânico. Não só as taxas de juro de curto prazo estão muito baixas, como as de longo prazo também. Isto faz com que seja muito difícil para eles obterem lucros. O último anúncio do governador Kuroda foi o de tentar tornar a curva das yields japonesa mais inclinada, com uma subida das taxas no longo prazo. Se tal acontecer, os bancos podem conseguir lucros.
É uma medida muito inovadora, não será arriscada?
É uma coisa que nunca foi tentada, temos de ver se resulta. Mas até agora está a funcionar bem.
Aquilo que está a acontecer ao Banco do Japão é uma boa lição para a Europa?
É uma prova de como pode ser difícil para um país sair da armadilha da deflação. É uma tarefa mesmo muito complicada, por isso, o melhor mesmo é conseguir evitar que isso aconteça. Penso que é a melhor lição que o Japão dá.
E acha que o BCE está a conseguir fazer isso?
Pelo menos está a fazer bastante mais do que fez o Banco do Japão no passado. Penso que ao nível da política monetária, a zona euro tem estado a reagir bem.
E na política orçamental?
Aí, não compreendo porque é que aplicam uma política tão restritiva numa conjuntura como a actual. Penso que está relacionado com a Alemanha, mas não creio que seja a política mais adequada.