Quando a dança e o cinema trocam de lugares
Em Íris, o coreógrafo Marco da Silva Ferreira e o realizador de cinema Jorge Jácome exploram o conceito de movimento do corpo e da imagem. Estreia esta sexta-feira no CCB, em Lisboa, na recta final do festival Temps d’Images, e chega ao Porto para a semana.
Em dias normais, Marco da Silva Ferreira é coreógrafo e bailarino, Jorge Jácome realizador de cinema. Mas em Íris – espectáculo apresentado esta sexta-feira e sábado no Centro Cultural de Belém (CCB), no âmbito do festival Temps d’Images, seguindo depois para o Teatro Campo Alegre, no Porto, no próximo dia 17 –, as águas movem-se, as funções misturam-se. Marco e Jorge são os dois intérpretes e criadores, “quer de dança quer de cinema”, num trabalho onde se pensa coreograficamente as imagens, e cinematograficamente os corpos.
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Em dias normais, Marco da Silva Ferreira é coreógrafo e bailarino, Jorge Jácome realizador de cinema. Mas em Íris – espectáculo apresentado esta sexta-feira e sábado no Centro Cultural de Belém (CCB), no âmbito do festival Temps d’Images, seguindo depois para o Teatro Campo Alegre, no Porto, no próximo dia 17 –, as águas movem-se, as funções misturam-se. Marco e Jorge são os dois intérpretes e criadores, “quer de dança quer de cinema”, num trabalho onde se pensa coreograficamente as imagens, e cinematograficamente os corpos.
Tudo começou em 2015, numa residência da Companhia Instável, no Porto, em que Jorge Jácome, cúmplice habitual das artes performativas (colabora regularmente com a companhia mala voadora, por exemplo), deu algumas palestras sobre filmes que de algum modo se relacionam com dança.
“Nessa semana desenvolvemos alguns exercícios de cruzamento entre as duas áreas e decidimos dar continuidade a isso”, explica Marco da Silva Ferreira. “Concorremos à Box Nova [projecto do CCB que apoia novas criações em dança] e a proposta foi escolhida, o que nos permitiu avançar com este trabalho”, acrescenta o coreógrafo de 30 anos, que se tem vindo a tornar num dos nomes mais valiosos (e internacionais) da nova geração da dança portuguesa.
Para chegar até aqui, os dois criadores entraram num processo de descascar e depurar as suas disciplinas. “O nosso objectivo foi perceber qual é o conceito mais básico de ambas. Centrámo-nos na ideia de que o cinema usa imagens paradas e lhes dá uma sequência que lhes confere movimento e continuidade, e que a dança trabalha o movimento quase como uma tentativa de não fixar ou de descolar imagens”, diz Marco.
A partir daqui, inverteram as regras do jogo. Imprimiram coreografia às imagens – os corpos estão lá, mas o movimento é atribuído sobretudo pela montagem –, e esvaziaram o ritmo dos corpos em cena, aplicando à dança uma ideia de imobilidade. Ou gerando movimento a partir de artifícios exteriores ao corpo.
“A coreografia da peça é muito a energia que lhe é atribuída pelo movimento acrescentado no vídeo ou pelo movimento acrescentado cenograficamente. O corpo não tenta fazer dança por si”, nota o criador. “O único momento em que temos uma coreografia em cena de movimento é quando criamos um jogo quase de câmara obscura.”
Em Íris, tal como o nome indicia, há uma fusão do humano, do tecnológico, da ilusão – e há inclusive um momento onde a coreografia é accionada por um elemento cénico, a luz, “em que o corpo não está lá, mas existe a ideia de que aquilo parece tão sensível quanto um corpo a dançar.”
Para Marco da Silva Ferreira, isto significou sair da sua zona de conforto – sobretudo se tivermos em conta a fisicalidade, a vibração e a audácia rítmica de Hu(r)mano (2014), a sua primeira criação oficial como coreógrafo, que o lançou nacional e internacionalmente. “Nesta peça questiono o modo como tenho vindo a trabalhar a coreografia, muito com corpos vivos. Aqui o ponto fulcral é o conceito de movimento de um corpo, mas não necessariamente humano”, aponta o coreógrafo, que apresentará a sua próxima criação, Brother, em Janeiro no Teatro Rivoli.
No fundo, Íris “foi sair da dança para falar nela, para pensar sobre ela”.