Era preferível mais bolsas em vez de propinas congeladas
“Os cortes foram fortíssimos e vão ser necessários muitos anos para recuperarmos”. O novo presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Politécnicos diz que a bem do país há cursos que se devem manter, mesmo que tenham um “reduzido número de estudantes”.
O novo presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP), Nuno Mangas, vê como positivo o acordo alcançado com o Governo para a manutenção do nível de financiamento público ao ensino superior até ao final da legislatura. Mas quer mais. Os cortes feitos dos últimos anos deixaram as instituições em dificuldades e a precisar de investimentos em infra-estruturas, equipamentos e pessoal.
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O novo presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP), Nuno Mangas, vê como positivo o acordo alcançado com o Governo para a manutenção do nível de financiamento público ao ensino superior até ao final da legislatura. Mas quer mais. Os cortes feitos dos últimos anos deixaram as instituições em dificuldades e a precisar de investimentos em infra-estruturas, equipamentos e pessoal.
PÚBLICO – O compromisso para a legislatura assinado com este Governo, que prevê a manutenção do financiamento público às instituições até ao final do mandato, é um patamar suficiente para garantir alguma estabilidade do sistema de ensino superior?
Nuno Mangas – Gostaríamos claramente de ter ido mais longe, mas acho que foi um passo importante. O acordo dá previsibilidade e permite uma planificação.
Ainda há instituições a viver com dificuldades financeiras?
Todas as instituições vivem ainda hoje com limitações. Os cortes foram fortíssimos e vão ser necessários muitos anos para recuperarmos.
Manter o nível de financiamento como foi agora acordado com o Governo permite essa recuperação?
Neste momento, estamos a tentar encontrar formas de financiamento alternativas, através dos fundos comunitários, por exemplo. É necessário potenciar um conjunto de actividades que permitam às instituições diversificar as suas fontes de financiamento e isso também está neste contrato que assinámos com a tutela. É evidente que seria desejável que o nosso nível de financiamento público atingisse o mesmo dos países da OCDE: 1,7% do PIB. E ainda estamos longe disso [1,4% em 2013, último ano para o qual havia dados no relatório Education at a Glance, da OCDE].
Há várias áreas identificadas pelas instituições como estando “no limite”: infra-estruturas, equipamentos, renovação do quadro docente...
Seria desejável criar condições, dentro de um ou dois anos, para que progressivamente pudesse voltar a existir verba no Orçamento de Estado – como acontecia com o PIDDAC – para responder a necessidades de conservação e manutenção. Só com as verbas geradas pelas instituições será muito difícil fazê-lo. Isso terá que ser feito de forma progressiva e contínua e não aos altos e baixos, como tem vindo a acontecer. Se for contínuo e progressivo, não onera demasiado o Orçamento do Estado.
Na discussão do Orçamento do Estado, os partidos que apoiam o Governo aprovaram alterações à lei do Orçamento que congela o valor das propinas para o próximo ano lectivo. Que impacto é que isto terá no ensino superior?
Na minha visão, seria mais importante que aumentássemos os apoios sociais aos estudantes. A actualização do valor das propinas representa 4 ou 5 euros anuais que toda a gente poupa, independentemente de poder ou não pagar. É mais uma medida simbólica. O que era importante era conseguirmos alargar a base social do ensino superior e isso aumenta-se por via da acção social e das bolsas. Por vezes, há muitos estudantes que, por terem mais dez euros no rendimento do seu agregado familiar, ficam fora dos apoios sociais.
Desapareceu definitivamente a discussão sobre a necessidade de uma reorganização da rede de ensino superior?
Tornou-se evidente que precisamos da capacidade instalada. Fizemos um investimento muito significativo em instalações, em laboratórios e em pessoas, temos uma população que é menos qualificada do que a dos países congéneres, por isso, não faz sentido não pormos tudo isto ao serviço das pessoas e dos territórios. Isto não invalida que não haja muita articulação e parcerias entre as instituições, sejam os politécnicos ou as universidades.
A redução do número de cursos no ensino politécnico feita nos últimos anos foi suficiente?
Foi feito um grande trabalho, mas não está todo feito. É importante que continue, de forma contínua. Mas é preciso também ter em conta que é importante que exista determinado tipo de formações, mesmo quando têm um reduzido número de estudantes. Às vezes, as instituições têm que ter também capacidade de antecipar necessidades [do país, em termos de formação] e isso pode não ser percepcionado no mesmo momento pela sociedade e pelos nossos estudantes. Fez-se um trabalho grande nessa matéria, muito por auto-regulação e também, em alguns aspectos, isso foi induzido.
Chegamos ao dia das colocações no ensino superior e vemos sempre os politécnicos a ficarem com mais lugares vazios do que as universidades. Isso é um problema do lado da oferta ou da procura?
Por vezes comparam-se coisas que não são comparáveis. A oferta das universidades e dos politécnicos é diferente. Há um conjunto de formações que são normalmente as mais procuradas nas universidades que não existem nos politécnicos. Além disso, o concurso nacional de acesso não pode ser visto como a única forma de captação de estudantes. Nas instituições do ensino superior politécnico, cerca de dois terços dos alunos vêm pela via do concurso nacional de acesso. Depois o outro terço de vagas é ocupado através dos concursos locais, concursos especiais, alunos com mais de 23 anos ou alunos que fizeram cursos técnicos superiores profissionais. O que lhe garanto é que todas as instituições têm taxas de ocupação que, na generalidade dos cursos, é superior às vagas iniciais.
O país precisa de atrair mais alunos para o ensino superior?
Claramente. Tivemos um percurso muito bom, mas quando nos comparamos com a média da União Europeia e da OCDE ainda estamos abaixo em termos de qualificações. Uma das coisas que é preciso fazer é mostrar que vale a pena estudar.
As regras de acesso ao ensino superior também têm que mudar para que isso aconteça?
Há um relatório sobre isso em discussão. O CCISP ainda não tomou posição sobre essa matéria e, portanto, não irei pronunciar-me em relação às questões em concreto. Eu acho que há sempre margem para melhorias, mas temos um sistema de acesso muito estabilizado e temos que ser muito cuidadosos nas alterações que se façam. Não é desejável que haja mudanças radicais.
No início do ano passado, o CCISP apresentou uma proposta de alteração das regras de acesso que reduzia o peso dos exames nacionais do secundário [na nota de candidatura ao superior]. Essa proposta ainda está em cima da mesa?
Essa não foi uma questão minimamente consensual e hoje está completamente colocada de lado.
No seguimento dessa proposta, os politécnicos do Porto, Lisboa e Coimbra desvincularam-se do CCISP. Em que ponto está essa relação?
Acho que é importante olhar para a frente e isso faz-se gerando consensos. Hoje é evidente para todos que somos mais fortes se estivermos unidos. Procurarei criar condições para que seja possível reestabelecer essa relação.