PT e Visabeira desfazem parceria em empresa polémica
A Visabeira vendeu 95% de uma empresa que recebeu fundos públicos para construir uma rede de fibra em zonas rurais, mas não revela a quem. A PT mantém a posição de 5%.
A Visabeira vendeu a participação de 95% que tinha numa empresa criada em 2010 com a PT Portugal (Meo) e cuja actuação está a preocupar o regulador e o Governo. A Fibroglobal construiu uma rede de fibra nas zonas rurais do centro e nos Açores com recurso a mais de 40 milhões de euros de fundos públicos e estava obrigada a abri-la a todos os operadores através de uma oferta grossista que permitisse levar ofertas retalhistas de telecomunicações aos habitantes destas regiões. E é aqui que surgem os problemas. A empresa é acusada pela Vodafone e pela Nos de definir condições de acesso à rede que beneficiam a PT – que, além de accionista, é a sua única cliente.
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A Visabeira vendeu a participação de 95% que tinha numa empresa criada em 2010 com a PT Portugal (Meo) e cuja actuação está a preocupar o regulador e o Governo. A Fibroglobal construiu uma rede de fibra nas zonas rurais do centro e nos Açores com recurso a mais de 40 milhões de euros de fundos públicos e estava obrigada a abri-la a todos os operadores através de uma oferta grossista que permitisse levar ofertas retalhistas de telecomunicações aos habitantes destas regiões. E é aqui que surgem os problemas. A empresa é acusada pela Vodafone e pela Nos de definir condições de acesso à rede que beneficiam a PT – que, além de accionista, é a sua única cliente.
A Visabeira confirmou ao PÚBLICO “a alienação da participação” na Fibroglobal, enquanto fonte oficial da PT informou que a empresa mantém a posição de 5%. Porém, nem o grupo liderado por Francisco Nunes, nem a operadora da Altice divulgam quem comprou as restantes acções correspondentes a 95% do capital. A Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom), que está a analisar o cumprimento das regras do concurso público e diz que “a matéria relativa aos preços da oferta grossista [da Fibroglobal] está em apreciação”, confirmou que não foi informada do negócio.
Mas também não tinha de sê-lo, a não ser por uma questão de cortesia. Apesar de haver dinheiros públicos envolvidos – os auxílios aprovados para os Açores e região centro foram de 43,8 milhões de euros – só haveria obrigações de reporte de alterações accionistas (ao Estado, não ao regulador) caso o contrato tivesse sido adjudicado a um agrupamento de empresas e uma delas mudasse, o que não é o caso.
O Ministério do Planeamento e das Infra-estruturas está a par das queixas da Nos e da Vodafone e já adiantou ao PÚBLICO que “o assunto está a ser analisado”. Os operadores queixam-se que a PT gere a rede da Fibroglobal como um “monopólio”. Ao contrário do que sucede com a rede da DST Telecom (que ganhou os concursos para o norte, Alentejo e Algarve) sobre a qual todas as empresas operam, na Fibroglobal a oferta grossista existe, mas só a Meo a usa para chegar aos habitantes abrangidos nos 42 concelhos da região centro e nos 12 dos Açores.
As queixas da concorrência
A Nos e a Vodafone garantem que os preços grossistas “são excessivos” e os níveis de qualidade de serviço oferecidos insuficientes e que isso explica que, apesar de haver negociações desde 2013, nenhuma tenha chegado a acordo com a Fibroglobal. Além disso, queixam-se de uma relação privilegiada desta com a PT (simultaneamente cliente e fornecedora), que torna as condições económicas de acesso à rede mais vantajosas para a empresa da Altice.
Os relatórios da Fibroglobal demonstram que todo o seu volume de negócios é originado na PT. Por exemplo, em 2014 as transacções com a Meo incluíram 8,5 milhões de euros “relativos a instalações e acessos de rede cliente e aluguer de cabo submarino”. Mas a Fibroglobal também fez pagamentos à Meo relativos “a trabalhos especializados, aluguer de condutas e postes e espaços técnicos” que somaram 2,9 milhões. A situação repetiu-se em 2015, ano em que o volume de negócios da Fibroglobal – originado exclusivamente na Meo – atingiu 9,3 milhões. Já a Meo recebeu três milhões pelos serviços de engenharia e aluguer de condutas e postes. Por outro lado, apesar de ser accionista minoritária, têm vindo da Meo os financiamentos da Fibroglobal: 13,7 milhões de euros até ao final de 2015.
A Fibroglobal (cujos relatórios não reportam quaisquer gastos com recursos humanos) tem como administradora delegada uma gestora com um percurso na PT, Graça Galvão. E, no conselho fiscal, está o actual administrador financeiro da PT, Guy Pacheco. À frente da direcção comercial está outro profissional com percurso na PT: Carlos Oliveira.
Em 2010, quando a Visabeira se aliou à PT (então gerida por Zeinal Bava) para concorrer aos fundos para as redes rurais, era sua accionista de referência. Ao longo dos anos, coube à Viatel (braço da Visabeira para as telecomunicações) executar a generalidade das obras de infra-estruturas da PT. Com a venda à Altice, entraram em cena outras empresas de engenharia ligadas ao actual líder da administração da operadora, Armando Pereira, a quem têm sido entregues as empreitadas de expansão da rede de fibra. O fim do acordo na Fibroglobal parece mostrar que os laços da Meo com a antiga accionista são mesmo para serem cortados.