Adiós, Dictador
A morte de um ditador é sempre uma boa notícia
Ditador não é uma palavra bonita. Por isso os românticos sempre preferiram apelidar Fidel Castro de El Comandante, que ia melhor com a figura heróica que levou a revolução comunista até Havana. Depois disso, Castro passou cinquenta anos a esmagar a liberdade do seu povo em nome de um ideal, eternizando-se como um déspota que nunca olhou a meios para segurar o poder.
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Ditador não é uma palavra bonita. Por isso os românticos sempre preferiram apelidar Fidel Castro de El Comandante, que ia melhor com a figura heróica que levou a revolução comunista até Havana. Depois disso, Castro passou cinquenta anos a esmagar a liberdade do seu povo em nome de um ideal, eternizando-se como um déspota que nunca olhou a meios para segurar o poder.
Fez da ilha um paraíso para turistas em busca de praias baratas, comida em conta, prostitutas desesperadas e ruínas charmosas. Com isso dividiu a nação cubana entre os que tinham acesso à economia do turismo, que vivia de dólares, e os cidadãos comuns, dependentes de uma moeda quase inútil.
Em nome da igualdade construiu um charco de pobreza onde as senhas de racionamento eram o ícone infeliz de uma vida à beira do desespero. Não seria nunca a alfabetização dos cubanos ou os míticos cuidados de saúde ao dispor dos estrangeiros que desculpariam a brutalidade do regime, até porque vale de pouco saber ler quando um livro custa três vezes o salário do mês. E de nada adianta ter cuidados de saúde gratuitos quando se arrisca a vida para fugir, a nado, em busca da liberdade americana a 145 quilómetros de distância. O extraordinário povo cubano merecia muito melhor.
Castro foi, e ainda é, um ídolo para os ditadores de pacotilha sul-americanos que levam os povos à miséria – como se vê na Venezuela. E é também um ícone para os românticos do Maio de 68, tão prontos a fechar os olhos aos crimes desde que o alinhamento ideológico aparente batesse certo com o pensamento de riguer. Mas nunca o argumento da luta anticapitalista pode justificar o registo terrível de direitos humanos sempre assinalado pela Amnistia Internacional.
Fez questão de colocar tropas cubanas nas disputas independentistas africanas – não por acreditar nos direitos soberanos dos outros povos, mas por fervor ao credo comunista. Foi esse mesmo fervor que o levou a defender todos os crimes soviéticos, recebendo em troca os rublos necessários à sustentação de um regime economicamente inviável. Quando chegou a hora de importar a guerra fria para o hemisfério Norte, não hesitou – e com isso foi um dos principais responsáveis pelo momento em que a guerra nuclear esteve mais próxima de acontecer.
A morte tem o condão de oferecer a quase todos uma trégua benévola na análise crítica, mas a História dificilmente esquecerá os muitos crimes de Castro. E ainda bem.