Escritor de notícias falsas no Facebook: “Acredito que Trump está na Casa Branca por minha causa”
O que têm em comum o lobby amish, as carrinhas de casamento gay e a proibição do hino nacional? Nenhum deles existiu e todos foram inventados pelo mesmo homem.
Paul Horner, o empresário de 38 anos que detém um império de notícias falsas no Facebook, ganha a vida desta forma. Convenceu a Internet duas vezes de que era o street artist britânico Banksy; publicou também no ano passado a notícia altamente viral e falsa sobre um processo judicial entre a Yelp e a série televisiva South Park.
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Paul Horner, o empresário de 38 anos que detém um império de notícias falsas no Facebook, ganha a vida desta forma. Convenceu a Internet duas vezes de que era o street artist britânico Banksy; publicou também no ano passado a notícia altamente viral e falsa sobre um processo judicial entre a Yelp e a série televisiva South Park.
Mas nos últimos meses, Horner deparou-se com um ecossistema de notícias falsas a crescer, mais político e muito mais influente: em Março, o filho de Donald Trump, Eric Trump, e o seu gestor de campanha da altura, Corey Lewandowski, chegaram a partilhar ligações no Twitter de um dos artigos falsos de Paul Horner. As suas histórias também apareceram enquanto notícias no Google.
Tendo em conta as questões que se levantaram sobre histórias como as de Paul Horner, que podem ter influenciado as eleições presidenciais, e no seguimento dos anúncios de que a Google e o Facebook vão tomar medidas contra estes meios enganosos, o The Washington Post falou com ele para debater a sua perspectiva sobre notícias falsas.
Já escreve notícias falsas há algum tempo – é uma espécie de pioneiro dos rumores noticiosos no Facebook. Bem, eu diria que são rumores falsos ou notícias falsas. Você diria que são uma paródia ou sátira. De que forma a situação é diferente do que era há três ou cinco anos? Por que razão a sua história sobre Obama invalidar os resultados eleitorais, que tem quase 250.000 partilhas no Facebook, se tornou tão viral?
Para ser sincero, as pessoas estão claramente mais tolas. Limitam-se a partilhar artigos. Já ninguém faz a prova dos factos e foi assim que Donald Trump foi eleito. Ele dizia o que queria e todos acreditavam nele. E quando se mostrava que a notícia era falsa, ninguém se importava porque já a tinham aceitado. É muito assustador. Nunca vi nada assim.
Falando em Donald Trump, provavelmente já ouviu o argumento de que as notícias falsas ajudaram, de certa forma, a elegê-lo. O que pensa disso?
Os meus websites foram usados pelos apoiantes de Donald Trump durante toda a campanha. Acredito que Donald Trump está na Casa Branca por minha causa. Os seus seguidores não verificam histórias, publicam tudo e acreditam em qualquer coisa. O gestor de campanha dele publicou a minha história sobre um manifestante a quem foi pago 3500 dólares (3265 euros). Eu inventei essa história. Coloquei um anúncio falso no Craiglist.
Porquê? Qual a razão para escrever isso?
Simplesmente porque os apoiantes de Donald Trump acreditavam que as pessoas eram pagas para protestar nos seus comícios e isso é de loucos. Já estive em protestos anti-Trump e acreditem, ninguém precisa de ser pago para protestar contra Trump. Só queria fazer uma piada sobre isso e a história pegou. Acreditaram mesmo nela.
Pensava que iam verificar a notícia e que isso faria com que a imagem deles fosse denegrida. É assim que funciona: alguém publica algo que eu escrevo e depois descobrem que é falso e ficam a sentir-se mal. Mas os apoiantes de Donald Trump continuam a partilhar estas histórias e nunca as verificam! E agora ele está na Casa Branca. Em retrospectiva, creio que ajudei a campanha em vez de a prejudicar. E não é bom saber isso.
Acredita que teve influência directa na eleição de Donald Trump?
Não sei. Não sei se tive ou não. Não sei mesmo.
Como curiosidade, se acreditou que podia ter um impacto injusto nas eleições – especialmente se esse impacto fosse na direcção contrária das suas convicções políticas – porque não parou de fazer isto? Porquê continuar a escrever?
Não acreditei que fosse possível que ele fosse eleito. Pensava que estava a baralhar a campanha, e talvez não o estivesse a fazer tanto quanto queria, mas nunca pensei que ele realmente fosse eleito. Nem pensei sobre isso. Olhando para trás, devíamos ter previsto que isto ia acontecer mas partimos do princípio de que Hillary Clinton iria ganhar. Não foi isso que aconteceu e agora Donald Trump é presidente.
A falar de Hillary Clinton, publicou notícias falsas sobre ela ou sobre os seus apoiantes? Ou sobre Gary Johnson (na sua foto de Facebook, John Horner está num comício de Gary Johnson)?
Não. Detesto Donald Trump.
Há algumas semanas escreveu no Facebook que tinha várias ideais para satirizar Hillary Clinton e outras personalidades mas que “não estou a brincar… faço isto há seis anos e são os republicanos quem mais clicam nos anúncios publicitários.” Parece ter descoberto que os conservadores, enquanto público-alvo, são uma maior fonte de rendimento.
Sim, são. Eles não verificam as histórias.
Do ponto de vista do negócio, a presidência de Donald Trump é boa para si, certo?
É boa para todos os que usam a sátira para ganhar a vida. As pessoas vão acreditar em tudo o que for escrito. Posso escrever as coisas mais impensáveis sobre Donald Trump e todos vão acreditar. Escrevi muita coisa anti-muçulmana que era absurda – Donald Trump querer identificar muçulmanos com emblemas, não permitir que eles entrassem em aeroportos ou criar filas separadas para eles – e as pessoas acreditaram!
O Facebook e a Google anunciaram recentemente que não vão permitir mais que sites de notícias falsas usem as suas plataformas de publicidade. Os seus rendimentos provêm destes serviços. Como reage a esta situação?
Tudo isto sobre o Google AdSense e sobre o Facebook é assustador. Grande parte dos meus rendimentos vem do AdSense. É inacreditável o dinheiro que ganho a partir dali. Neste momento recebo, mensalmente, 10.000 dólares (9931 euros) do AdSense.
Conheço maneiras de usar nomes e sites diferentes. Portanto, mesmo que eles impusessem restrições, iria experimentar outros métodos. Neste momento tenho, pelo menos, dez websites. Se acabarem com alguns, uso outros. Podem suspender a publicidade em todos os meus sites e acho que não vai haver problema. Além disso, o Facebook e o AdSense ganham demasiado dinheiro com a publicidade de sites de notícias falsas para, simplesmente, acabarem com tudo isto. Iriam perder muito dinheiro.
Mas se pusessem um fim a tudo isto, não seria bom. Não sei o que faria.
Mas pensando sobre esta situação de uma forma menos individualista, seria bom se o Facebook e a Google tomassem medidas, certo? Porque os efeitos que descreve são assustadores.
Sim, claro. Muitos desses sites são lixo. Não têm criatividade nem objectivo. Fico satisfeito que esses sites acabem. Não gosto de ser associado ao Huzlers. Gosto de ser associado ao The Onion. Cada vez passo mais tempo a fazer isto. Existe um objectivo e um sentido. Não escrevo notícias falsas só por escrever.
Portanto, vejo muitos dos sites que estão a ser listados pelo Facebook e pela Google e gosto do que vejo. Há muitos sites terríveis por aí e fico satisfeito que estejam a tomar medidas contra eles.
Só espero que também não acabem com o meu.
Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post
Tradução de Francisco Ferreira