Eleições, Brexit e Web Summit
Os liberais são um perigo para a sociedade e inimigos públicos do Estado.
Quando escrevo estas linhas o mundo ainda vive um momento de enorme suspense e incerteza em relação ao resultado das mais polémicas eleições na história dos Estados Unidos da América. Os mercados, os políticos e os jornalistas ainda não sabem como reagir ou antecipar um resultado que pode impactar na nossa vida quotidiana de forma dramática. Para o bem ou para o mal, os EUA foram nos últimos 50 anos, e ainda hoje, um fiel da balança em termos de equilíbrio geopolítico e económico à escala universal. O Financial Times, duas horas depois de abrirem as urnas, na “sondagem das sondagens”, apontava para uma liderança de Clinton. No fundo o desejo do mundo progressista, livre e tolerante sobre uma visão protecionista e populista de um mundo compartimentado e estanque, que Trump vende aos seus potenciais eleitores.
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Quando escrevo estas linhas o mundo ainda vive um momento de enorme suspense e incerteza em relação ao resultado das mais polémicas eleições na história dos Estados Unidos da América. Os mercados, os políticos e os jornalistas ainda não sabem como reagir ou antecipar um resultado que pode impactar na nossa vida quotidiana de forma dramática. Para o bem ou para o mal, os EUA foram nos últimos 50 anos, e ainda hoje, um fiel da balança em termos de equilíbrio geopolítico e económico à escala universal. O Financial Times, duas horas depois de abrirem as urnas, na “sondagem das sondagens”, apontava para uma liderança de Clinton. No fundo o desejo do mundo progressista, livre e tolerante sobre uma visão protecionista e populista de um mundo compartimentado e estanque, que Trump vende aos seus potenciais eleitores.
É nesta dicotomia Liberalismo vs Protecionismo que o mundo vive, parecendo esquecer que a política, como a vida, não é nem nunca será a preto e branco. Como já afirmei no passado, sou um liberal em muitas vertentes da nossa vida, da economia à sociedade, porque acredito na liberdade de escolha, de opinião ou de intervenção, mas com mecanismos de proteção dos direitos, liberdades e garantias conquistados com sangue, suor e lágrimas por gerações e gerações nos últimos 200 anos.
A diabolização, quase estigmatização, de quem se diz liberal, é fruto da radicalização e da divisão da sociedade em que vivemos. Ninguém é autorizado a usar positivamente a palavra liberal, quanto mais a intitular-se como tal. É motivo para fatwas radicais e condenações sumárias na praça pública. Os liberais são um perigo para a sociedade e inimigos públicos do Estado. Quanto a mim, que milito num Partido Social Democrata, acredito que uma sociedade mais próspera é aquela que coloca o crescimento económico ao serviço da construção de um Estado Social que garanta uma maior coesão e que combata as desigualdades, dando liberdade de escolha, de associação e de expressão a todos os cidadãos. Porque não é incompatível, esta visão social-democrata com as minhas posições liberais em termos económicos ou mesmo sociais. Por isso mesmo não alinho quando me tentam rotular ou etiquetar com um qualquer palavrão vindo diretamente dos compêndios da ciência politica.
É esta visão sectária que devemos combater. Precisamente porque vamos vivendo enredados nesta disputa estéril e pseudointelectual sobre quem é afinal o maior dos social-democratas ou o maior dos liberais, vamos desperdiçando oportunidades de construir uma democracia mais forte e madura. E era nessa que deveriam estar focadas as nossas atenções.
Temos a obrigação de combater os populismos intolerantes e protecionistas que tentam artificialmente remar contra a maré, querendo construir ou reconstruir os muros e barreiras que conseguimos derrubar no passado mais recente. Nunca me cansarei de dizer que a União Europeia é o projeto de sociedade mais avançado que a humanidade já experimentou. É o mais inclusivo, coeso e culto. Mas sabemos hoje que nem por isso é o mais forte economicamente. Há barreiras nesta Europa que têm de ser derrubadas. Temos de sentir que vivemos numa nação una, onde as oportunidades e a economia são democráticas e, por isso, contaminam positivamente todo o espaço europeu dando escala às pequenas e médias empresas que queiram expandir e usufruir do maior mercado livre mundial. Aí sim, poderemos dizer que vivemos num mercado único.
E o que é que as eleições americanas têm a ver com o Brexit ou o Web Summit? O título deste texto sumariza o exemplo da nossa incapacidade de transformar adversidades em oportunidades - e consequentemente em vantagens competitivas em relação aos nossos adversários externos. Olhamos para as eleições americanas como a novela das nove, rindo das palhaçadas de Trump, aplaudindo a brandura de Hillary. Confortavelmente recostados no sofá, nem compreendemos que temos uma oportunidade à nossa frente.
Choramos a saída do Reino Unido da Europa e não nos mentalizamos que é altura de aprofundarmos ainda mais a nossa União. Ficamos extasiados, pequeninos e quase sem fôlego perante os números e a grandiosidade da Web Summit. E também não somos capazes de mudar de lente ou de perspetiva, percebendo que este encontro nada mais é que um potente despertador para os que ainda não acordaram para o mundo da globalização. O caminho para um mundo sem barreiras e pleno de oportunidade para todos, dos mais pequenos aos gigantes, é inexorável. A nós, como indivíduos ou comunidade, pede-se o mínimo: a ambição de erguer a cabeça, de acreditar nas nossas capacidades e de colocar a nossa inesgotável criatividade ao serviço da construção do sonho de um mundo melhor.