UE diz que Durão Barroso não furou regras, apesar da falta de "sensatez"

Durão Barroso garantiu em carta que não vai fazer lobby a favor da Goldman Sachs em Bruxelas e que não foi contratado para ser conselheiro para o "Brexit". Comité de ética aceitou argumentos.

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Ricardo CasteloNFACTOS

O comité de ética ad hoc da Comissão Europeia concluiu que o antigo presidente Durão Barroso não violou as regras dos tratados ao aceitar o cargo de presidente não executivo do Goldman Sachs, ainda que tenha demonstrado falta de “sensatez”. A decisão da Comissão surgiu na sequência de um pedido de Jean-Claude Juncker e depois da argumentação do próprio Durão Barroso. Numa carta enviada ao seu sucessor, Barroso garantia que não vai fazer lobby a favor do banco de investimento em Bruxelas.

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O comité de ética ad hoc da Comissão Europeia concluiu que o antigo presidente Durão Barroso não violou as regras dos tratados ao aceitar o cargo de presidente não executivo do Goldman Sachs, ainda que tenha demonstrado falta de “sensatez”. A decisão da Comissão surgiu na sequência de um pedido de Jean-Claude Juncker e depois da argumentação do próprio Durão Barroso. Numa carta enviada ao seu sucessor, Barroso garantia que não vai fazer lobby a favor do banco de investimento em Bruxelas.

Em Setembro, Juncker solicitou um parecer relativamente à designação do seu antecessor para o cargo de presidente não executivo do banco de investimento norte-americano Goldman Sachs. No parecer divulgado nesta segunda-feira pelo executivo comunitário, o comité de ética considera que José Manuel Durão Barroso “não demonstrou a sensatez que se poderia esperar de alguém que ocupou o cargo de presidente durante tantos anos”, mas “não violou o seu dever de integridade e discrição”. E, como tal, fica livre das sanções financeiras impostas pelo Tratado de Funcionamento da União Europeia.

A comissão de ética avaliou sobretudo três aspectos da contratação de Durão Barroso: sobre as críticas de que foi alvo por ter ido especialmente para o Goldman Sachs e de isso criar má imagem à Comissão Europeia; sobre o facto de haver uma relação entre o Goldman Sachs e os assuntos da Comissão, nomeadamente o "Brexit"; e por fim o facto de haver uma "porta-giratória" entre o sector público e privado e de ter levado informações para o banco de investimento.

Sobre os três parâmetros a Comissão diz que foi chamada a fazer uma avaliação legal e não sobre a sensatez; contudo, não deixa de dizer que Barroso devia ter tido a noção que, ao tomar a iniciativa de aceitar o cargo, "daria azo à crítica e ao risco de causar danos reputacionais à Comissão e de modo geral à União"– ou seja, teria "a este respeito demonstrado negligência". "Justificado ou não, este dano já foi feito."

Depois, a Comissão acrescenta que de "certeza" que há uma relação entre as funções anteriores e as actuais e que o Goldman Sachs vai beneficiar com isso. "A sua experiência e conhecimento nestas matérias vão ser preciosos para o Goldman Sachs", lê-se. Todavia, lembram os peritos, não pode ser considerado ilegal, até porque o próprio banco de investimento é autorizado a trabalhar no espaço da União, sujeito a regras.

Como também não pode ser considerado ilegal a sua passagem para o sector privado, sobretudo porque os comissários são livres de ir para o privado e continuar as suas carreiras, depois de respeitados os18 meses de período de nojo.

A análise dos três parâmetros leva a Comissão a considerar que o simples facto de a escolha de Durão Barroso ter provocado tanta agitação, causando danos à reputação da Comissão e da UE, pode ser um indicador relevante de uma violação dos seus deveres, “mas por si só não é suficiente”, até porque, lembra o comité, “o Goldman Sachs pode ser considerado a vanguarda do capitalismo agressivo, mas, enquanto respeitar a lei, não é contra a lei aceitar um cargo no banco”.

Barroso diz que não vai ser lobbyista

Na decisão do comité de ética pesou o facto de o ex-presidente da Comissão Europeia garantir que não vai fazer lobby para o banco, ou seja, de não ser “representante de interesses” do Goldman Sachs, e que essa garantia responde ao dever de integridade e discrição imposto pelo tratado.

Na carta que enviou à Comissão, Barroso dizia que iria desempenhar funções não executivas no banco, como conselheiro na relação com os clientes, mas que não iria fazer "lobby a favor do Goldman Sachs", negando que o banco o contratava para ser conselheiro para as questões relacionadas com o "Brexit".

"Apesar de a minha contratação ter sido anunciada depois do referendo do Reino Unido, a direcção resolveu contratar-me antes de o referendo ter lugar. Aliás, na altura do referendo, a minha contratação esperava aprovação dos reguladores britânicos", escreveu numa carta dirigida ao seu sucessor, Jean-Claude Juncker. Na mesma carta, avança o relatório da Comissão, Barroso garantiu o seu compromisso com as instituições europeias e que por isso ia manter o seu compromisso no que respeita às regas de integridada e discrição.

Durão Barroso foi contratado em Julho pelo gigante norte-americano e foi alvo de críticas de vários responsáveis europeus pela decisão.