Banda sonora para o Halloween: tenham medo, tenham muito medo
Não podiam ser mais, nem menos. Para uma banda sonora do Halloween, com as máscaras de Halloween e todo o imaginário de Halloween, era necessário um número adequado à data: 13, naturalmente, é esse número. Para um "santo" Halloween, nem mais, nem menos.
John Carpenter - Halloween (banda sonora de Halloween)
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John Carpenter - Halloween (banda sonora de Halloween)
John Carpenter, o mestre do cinema de terror, era escolha obrigatória para figurar nesta lista, ou não fosse ele também o compositor das bandas-sonoras dos seus filmes. As possibilidades de escolha eram, de resto, quase tão vastas quanto a sua filmografia. Mas neste caso, fugir ao óbvio seria contraproducente. Halloween, o seu clássico de 1978, evoca todo o ambiente associado à data e é o início perfeito para lançar a viagem. De braços abertos, mergulhemos no terror. Fica-nos muito bem.
Michael Jackson - Thriller
A esta distância no tempo pode parecer estranho que tantos de nós sentissem um susto daqueles de cada vez que a curta-metragem criada por John Landis para Michael Jackson aparecia no ecrã (e aparecia cerca de duas vezes por dia, pelo menos, em 1984). A verdade é que era precisamente isso que acontecia quando víamos Michael e restante trupe transformar-se em bando de zombies destinados a perturbar as nossas noites de sono descansado. Três décadas depois, é difícil acreditar que houve um tempo em que Thriller e teledisco respectivo não existia. É essa a marca de um clássico. Especialmente numa noite de Halloween.
Screaming Jay Hawkins - I put a spell on you
Screaming Jay Hawkins queria ser cantor lírico. O seu sonho era maravilhar espectadores no Metropolitan, em Nova Iorque, ou no Scala, em Milão, com a sua voz de trovão e a expressividade dos seus gestos. Falhou essa ambição, mas ganhámos todos. I put a spell on you é a história de um amor obsessivo, é uma feitiçaria, é canção assombração cantada por um homem que irrompia em palco de dentro de um caixão, que vestia roupa de xamã sem origem definida, que cantava enquanto segurava na mão um bastão decorado com uma caveira. Para Screaming Jay Hawkins, o Halloween não era um feriado, era um dia como todos os outros.
The Cramps - I was a teenage werewolf
Se quiséssemos organizar uma festa de Halloween privada, a primeira escolha para banda convidada seria, por esta ordem, The Cramps, The Cramps e The Cramps. A banda de Lux Interior e Poison Ivy resgatou novamente para o rock'n'roll o seu sentido de perigo e a sua existência subterrânea. E fê-lo enquanto polvilhava o rock'n'roll, o punk, o garage ou o rockabilly de delírios sci-fi ou de imagens de clássicos de terror série B. Eram absurdamente inspiradores e muito sérios na fantasia que criavam. Adequadíssimos, portanto, para festa Halloween que se preze.
Dirty Coal Train - Two zombies
Infelizmente, não vamos poder convidar os Cramps para a nossa festa de Halloween privada. A banda terminou em 2009, quando Lux Interior foi traído por um ataque cardíaco. Mas, não tendo os Cramps, não é necessário olhar para muito longe em busca dos substitutos ideais. Temos mesmo aqui ao lado os Dirty Coal Train, banda sedeada em Lisboa que acelera na rota rock'n'roll enquanto canta sobre invasores de outros planetas, robots demoníacos, mutantes ameaçadores ou zombies (vindos de paragens diversas). A festa está montada. Venham daí os Dirty Coal Train.
Robert Johnson - Hellbound on my trail
Diz a lenda que Robert Johnson, no cruzamento de duas estradas no Mississipi, vendeu a alma ao Diabo em troca da mestria no blues. Pagou um preço alto. A morte chegou cedo, aos 27 anos, conta-se que fruto de envenenamento pelo marido traído de uma amante, e a sua obra, fundamental na história do blues, parece ser a de um homem em fuga, constantemente acossado por demónios nem sempre visíveis. Não são conhecidos relatos da participação de Robert Johnson em festas de Halloween ou semelhantes, mas a sua história de vida e o ambiente das suas canções deveriam garantir-lhe um lugar de destaque onde quer que o Halloween se celebre.
Howling Wolf - Evil
Howling Wolf não vendeu a alma ao Diabo para se tornar um gigante do blues. Não precisou de o fazer. Dono de uma voz de trovão que impressiona qualquer um que lhe ponha os ouvidos em cima, já era certamente um bluesman quando, à nascença, agitou as cordas vocais pela primeira vez. Arriscamos até dizer que, quando começava a entoar esta canção sobre um mal indefinido que se insinua e nos corrói o andar normal dos dias, o Diabo correria a esconder-se nas profundezas do Inferno. Nunca estaria longe o suficiente. Onde quer que se refugiasse, o senhor das trevas ouviria uma voz ecoando desde a distânica: "That's evil! Evil is goin' on wrong. I am warnin' you brother, you better watch your happy home".
Wanda Jackson - Funnel of Love
Wanda Jackson é a rainha do rockabilly. Wanda Jackson, brevemente namorada de Elvis e sua igual na capacidade de agitar as hormonas do público que a ouvisse, cantava sobre a força transformadora do rock'n'roll, cantava sobre mulheres adoravelmente teimosas, sobre tipos que não mereciam a sua confiança, sobre essa ideia salvadora que é fazer uma festa, sem mais r porque sim. Wanda Jackson era uma mulher furacão sem tempo para tretas delicodoces. Quando cantava a impossibilidade de fugir a um amor obsessivo era como se lutasse contra uma inevitabilidade, altiva, mas certa da derrota. Maravilhosa fantasmagoria, esta de Funnel of love. Uma assombração mais para noite de Halloween.
Danny Elfman - This is Halloween (banda sonora de O Estranho Mundo de Jack)
O adorável Jack queria descobrir coisas sobre o Natal. O adorável Jack foi criado pelo adoravelmente delirante Tim Burton, logo, é protagonista de uma história de Natal nada de acordo com a norma da quadra. Habitante de uma dimensão paralela, subterrânea, onde a felicidade e as agruras são as mesmas que nosso mundo, mas vividas por seres de aspecto consideravelmente diferente, Jack há-de encontrar o seu Natal. Mas, neste exacto momento no tempo (é dia 31 de Outubro, recordemos), o Natal vivido aqui é muito menos interessante que o Halloween vivido lá em baixo, no mundo de Jack. Bem-vindos ao Halloween, então (outra vez).
Kanye West - Monster
Kanye West não é o primeiro nome de que nos recordamos quando pensamos em elaborar uma colectânea para o Halloween. Mas Kanye West, dono de um talento de uma dimensão equivalente à sua capacidade para irritar meio mundo em cada nova demonstração de que é realmente dono de um ego do tamanho do mundo, tem música para todas as situações. Kanye West e Halloween? Claro que não é união despropositada. Recuemos a 2010 e ao álbum My Beautiful Dark Twisted Fantasy. É nele que descobrimos Monster, canção pesadelo, canção duelo entre West e Nicki Minaj. Verdadeiramente monstruoso (no melhor dos sentidos).
Mão Morta - Cão da morte
"Sinto o cão da morte a bafejar no meu pescoço". Mais assustador que ouvir esta frase uma vez, é ouvir esta frase repetida duas, três, quatro, cinco vezes. E ouvi-la na voz grave e rouca de Adolfo Luxúria Canibal, enquanto os restantes Mão Morta criam a massa sonora apocalíptica que nos garante que, não só este não é certamente o melhor dos mundos possível, como é muito provável que isto não vá acabar bem. Ou melhor, a verdade é que acaba mesmo bem. Pensem no velhinho conto infantil d'O Capuchinho Vermelho. Pensem que o Capuchinho, se calhar, não é a presa. "Sinto o cão da morte a bafejar no meu pescoço". É Halloween e isto vai acabar muito bem.
Bauhaus - Bela Lugosi’s dead
Bela Lugosi, o eterno Drácula do cinema dos anos 1930, morreu em 1956 aos 73 anos. 26 anos depois, os Bauhaus de Peter Murphy resgataram-no do limbo para lhe prestarem justa homenagem. Em longos minutos de música feita tensão, criam um monumento gótico, polvilhado de boas partículas dub, para que o velho húngaro regresse com estrondo. Tudo indica que Bela Lugosi esteja realmente morto e os Bauhaus reafirmam-no uma e outra vez, mas enquanto Peter Murphy continua a cantar naquele dramatismo pop muito bem encenado, somos assaltados pela dúvida. E se o velho Lugosi estiver só à espera do momento certo para regressar? Hoje seria o dia.
B Fachada – Pifarinho
Certamente que José Afonso não esperaria ver-se nestes preparos de Halloween. Porém, aqui o temos por interposta pessoa, através do sample do Coro da Primavera que B Fachada usou como base para Pifarinho. E como é que isto não há-de ser matéria perfeita para Halloween? Temos garbosas feiticeiras teutónicas entregues a rituais na serrania. Temos pastores que as surpreendem entre fogueiras. Temo-los todos entregues a rituais profaníssimos na escuridão da noite estrelada. Se a globalização assegurou que o Halloween invadisse vastos territórios mundo fora, contra-ataquemos com nova aculturação, neste momento em que já ninguém parece lembrar-se do "pão-por-deus" e dos "bolinhos e bolinhós". Tenham um santo Halloween.