O Governo minoritário cria muito mais problemas ao PSOE do que ao PP
As actuais circunstâncias políticas não parecem favoráveis a uma cultura de pactos.
Mariano Rajoy declarou há dias que a falta de uma maioria no Congresso pode criar uma situação que, “por ser difícil, pode converter-se numa grande oportunidade para resolver alguns dos grandes desafios que a Espanha tem de afrontar no futuro”. Não indicou a prioridade das reformas. Mas, para garantir a estabilidade de um governo minoritário, apontou o senso comum: “Incidir nos pontos em que maior possibilidade há de acordo e deixar de lado aqueles em que o desacordo mais difícil é de superar.”
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Mariano Rajoy declarou há dias que a falta de uma maioria no Congresso pode criar uma situação que, “por ser difícil, pode converter-se numa grande oportunidade para resolver alguns dos grandes desafios que a Espanha tem de afrontar no futuro”. Não indicou a prioridade das reformas. Mas, para garantir a estabilidade de um governo minoritário, apontou o senso comum: “Incidir nos pontos em que maior possibilidade há de acordo e deixar de lado aqueles em que o desacordo mais difícil é de superar.”
Não é assim tão simples. Basta um exemplo. A sustentabilidade do sistema de pensões depende da política fiscal em que os principais partidos estão em simétrico desacordo. Num debate promovido pelo El País em Junho, o PP e o Cidadãos defenderam a prioridade de uma redução de impostos, enquanto o PSOE e o Podemos propunham subidas fiscais. Comentou o jornal que “deveria ser claro para os eleitores que baixar a carga fiscal e ao mesmo tempo reduzir o défice e manter um financiamento folgado da protecção social, é impossível”. A negociação com Bruxelas do calendário da redução do défice e a aprovação do Orçamento serão a primeira prova de fogo do novo executivo e das suas relações com as oposições.
Outros dois pontos críticos são o sistema de financiamento das comunidades autonómicas e o desafio separatista da Catalunha. São temas a que, pela urgência, já não se pode aplicar o princípio de “deixar de lado” aquilo em que prevalece o desacordo. “Se o futuro Governo Rajoy não encontrar um ponto comum para acordar um referendo com as garantias necessárias [num quadro constitucional], o choque entre a Catalunha e a Espanha será cada vez mais inevitável”, escreve o comentador catalão Lluís Foix.
Num Parlamento fragmentado, em que o Governo já não tem maioria absoluta, a necessidade de fazer pactos torna-se crucial. Todos terão de fazer concessões, diz Rajoy. O próprio PP terá de dar o exemplo, aceitando rever leis impostas pela sua anterior maioria, como as da Educação e as laborais. Ontem, no discurso de investidura, Rajoy insistiu na necessidade de uma cultura de pactos, “um modelo de governo ainda inédito na Espanha, mas similar aos que funcionam em muitos países da Comunidade Europeia”.
O ponto crucial é outro. As actuais circunstâncias políticas não parecem favoráveis a uma cultura de pactos. O PSOE atravessa uma fase imprevisível, dominado pelas fracturas internas, sem uma direcção legitimada e sob intensa acossa do Unidos Podemos (UP). Pablo Iglesias, que acaba de anunciar uma nova fase de luta que combinará a mobilização de rua e o combate institucional, não perderá nenhuma oportunidade para explorar todas as concessões que o PSOE faça. E tentará provocar divisões dentro das divisões dos socialistas. O mesmo farão os independentistas catalães.
Rajoy tem na sua mão um trunfo perante o PSOE: pode dissolver o Parlamento a partir de Maio de 2017, o que não daria tempo aos socialistas para restabelecer a coesão interna. Mas, se os socialistas não estão interessados em eleições a médio prazo, há pelo menos uma força interessada na dissolução e que a exigirá no Congresso e nas ruas: o Unidos Podemos. Este quer, e o momento é propício, disputar a hegemonia da esquerda ao PSOE e assumir-se no Congresso como líder da oposição.
O PSOE está numa encruzilhada. Se não pactua, dá argumentos a Rajoy. Se teme eleições, perde poder negocial perante o PP. Rajoy estará à vontade na sua nova imagem de “presidente dialogante”, pois poderá conseguir passar para a oposição o “ónus da ingovernabilidade” e dela tirar futuros dividendos eleitorais.