A mesma Inspecção de Finanças, dois pareceres contraditórios sobre os passes sociais

Com um intervalo temporal de apenas três meses, as Finanças pronunciaram-se a favor e depois contra as novas regras de compensação dos operadores.

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Despacho foi assinado por Isabel Castelo Branco e Sérgio Monteiro RG RUI GAUDENCIO

O despacho em análise é o mesmo: o que, a 11 de Agosto de 2015, veio fixar uma nova fórmula de cálculo das compensações financeiras aos operadores públicos e privados pela venda de passes sociais e revogar um outro despacho que obrigava à revisão das verbas pagas no passado. Já as conclusões, embora partam da mesma entidade, são contraditórias. Num parecer emitido a 10 de Agosto do ano passado, a Inspecção-Geral de Finanças (IGF) dava luz verde ao despacho. Num outro de 18 de Novembro, a mesma IGF recomendava que o despacho fosse alterado. Os dois documentos são assinados pela mesma pessoa: o chefe de equipa Luís Marçal.

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O despacho em análise é o mesmo: o que, a 11 de Agosto de 2015, veio fixar uma nova fórmula de cálculo das compensações financeiras aos operadores públicos e privados pela venda de passes sociais e revogar um outro despacho que obrigava à revisão das verbas pagas no passado. Já as conclusões, embora partam da mesma entidade, são contraditórias. Num parecer emitido a 10 de Agosto do ano passado, a Inspecção-Geral de Finanças (IGF) dava luz verde ao despacho. Num outro de 18 de Novembro, a mesma IGF recomendava que o despacho fosse alterado. Os dois documentos são assinados pela mesma pessoa: o chefe de equipa Luís Marçal.

O primeiro parecer foi pedido pelo anterior Governo para poder avançar com o despacho. Aliás, a data dos dois coincide: 10 de Agosto de 2015, embora a publicação das novas regras em Diário da República só tenha acontecido um dia depois. No documento, a IGF refere estar a dar resposta a uma solicitação “para análise urgente” da ex-secretária de Estado do Tesouro do primeiro Governo de Passos Coelho, Isabel Castelo Branco. A conclusão é a seguinte: “pelo exposto e face à apreciação formal que foi possível efectuar ao projecto de despacho conjunto, entendemos que o mesmo se mostra conforme aos objectivos pretendidos”.

O parecer aprofunda que “da breve apreciação efectuada ao teor do projecto de despacho conjunto, verifica-se que este se encontra em conformidade” com a lei que, em 2015, veio definir o novo regime jurídico do sector público de transportes de passageiros, com as regras estabelecidas na portaria de 2013 que regula os passes intermodais e as condições de disponibilização desses títulos na Área Metropolitana de Lisboa (AML) e com as normas de compensação financeira dos operadores de transportes colectivos por parte do Estado. A IGF diz mesmo que o modelo de indemnizações que o anterior Governo criou com o despacho “responde genericamente às recomendações” que constavam de um relatório que publicou em 2014 sobre esta temática.

Já no que dizia respeito ao anexo remetido pela ex-secretária de Estado em que eram descriminadas as compensações por operador, a IGF alertava apenas para o facto de não ter tido “acesso a quaisquer dados do sistema de bilhética sem contacto, nem aos parâmetros subjacentes ao cálculo da antedita estimativa”, optando, por isso, por não se pronunciar concretamente sobre os valores.

Foi cerca de três meses depois, a 18 de Novembro, que Luís Marçal, agora a pedido da AML, adoptou uma posição totalmente diferente, recomendando num segundo parecer “uma eventual alteração do respectivo teor” do despacho de Agosto. Para suportar esta conclusão, o chefe de equipa da IGF suportou-se em dois fundamentos. O primeiro está relacionado com uma excepção que o despacho dá a alguns operadores no que toca aos tectos que estão na base da fórmula de cálculo da receita comercial. “A não observância do antedito limite traduzir-se-ia no facto de o operador ser remunerado por uma quantia superior ao definido (…), situação que não se nos afigura admissível”, conclui-se, defendendo-se que essa excepção fosse eliminada.

O segundo fundamento diz respeito à revogação da revisão que iria ser feita aos valores pagos em 2012 e 2013. “Tal revogação veio impedir a revisão das compensações já pagas, o que contraria o objectivo preconizado (…) na medida em que visava precisamente garantir que os montantes das compensações financeiras relativas aos anos de 2012 e 2013 pudessem ser revistos com base nos dados de bilhética sem contacto”. A IGF conclui, por isso, que “esta situação pode colocar em causa a boa aplicação de dinheiros públicos”.

Este último parecer das Finanças foi homologado, apenas em Setembro, pelo actual secretário de Estado, do Tesouro e Finanças, que o remeteu depois ao Ministério do Ambiente, onde está a ser analisado.