Entre o belo e o monstro: as duas faces do homem mais procurado de Portugal

Suspeito de dois homicídios já foi condenado por violência doméstica e por ofensas à integridade física. Mas em Arouca quase todos destacam a sua simpatia e educação.

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Suspeito conseguiu a guarda da filha de 10 anos há cerca de um mês. Rui Farinha/NFactos

Simpático e educado parecem adjectivos pouco compatíveis com duas condenações criminais: violência doméstica e ofensas à integridade física. Mas são duas faces que encaixam na mesma pessoa, Pedro João Ribeiro e Costa Pinho Dias, 44 anos, que por estes dias possui o rótulo de “homem mais procurado de Portugal”.

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Simpático e educado parecem adjectivos pouco compatíveis com duas condenações criminais: violência doméstica e ofensas à integridade física. Mas são duas faces que encaixam na mesma pessoa, Pedro João Ribeiro e Costa Pinho Dias, 44 anos, que por estes dias possui o rótulo de “homem mais procurado de Portugal”.

O suspeito de dois homicídios, um deles civil e o outro militar da GNR, nasceu em Luanda, Angola, a 13 de Fevereiro de 1972 no seio de uma família abastada e, segundo o próprio contou a um médico que lhe fez uma perícia psiquiátrica em 2010, no âmbito de um processo de violência doméstica, a família regressou a Portugal quando tinha dois anos. Estudou até ao 12º ano em Arouca e aos 19 anos, lê-se na perícia, “ingressa nas forças armadas, onde faz o curso de detecção aérea, mantendo-se em funções durante cerca de três anos e meio”.

Depois decide explorar algumas propriedades da família, nomeadamente a Quinta dos Guardais, em Várzea, uma freguesia de Arouca, onde é originária a família paterna. É nessa quinta que tenta fazer uma criação intensiva de coelhos, um negócio que acaba por abandonar. À entrada da quinta não há vestígios dessa actividade. Uma placa, com a indicação Lusitanos, remete-nos para outro negócio, a criação de cavalos, que ainda hoje mantém.

Um vizinho, António Barbosa, que comprou o terreno onde fez a casa à avó de Pedro João, explica que já não há cavalos por estas bandas. “Agora só há patos, pássaros e um burro”, afirma o bombeiro reformado, que garante que o “rapaz” era educado e estava sempre disponível para ajudar.

José Augusto Sousa, professor reformado e pai da actual companheira de Pedro João, adianta que os cavalos estão numa outra propriedade em Mangualde, onde também são criadas ovelhas e gado. A compra e venda de animais, diz, era uma actividade que o “genro” acumulava até há uns meses com a de piloto de aviões de transporte de mercadoria, uma licença que terá tirado há uns anos na África do Sul. Estranho é que Autoridade Nacional de Aviação Civil não tem qualquer registo desta habilitação, que teria que ser validada em Portugal para que um piloto operasse a partir de cá. Fonte oficial da instituição garante que a único registo que tem deste cidadão é como “aluno no Aero Club de Coimbra” inscrito num curso de pilotos de avião desde 2015.

José Augusto garante que viu várias vezes Pedro João fardado. Fala de forma pausada. Parece querer escolher bem as palavras. Sem reparar, trinca os lábios, denunciando nervosismo. Não é caso para menos. Pedro João é também o pai do seu neto, actualmente com 10 meses. Um pai irrepreensível, garante o antigo professor de Matemática. Explica que começou a conviver com Pedro João há uns anos, quando este iniciou a relação com a filha, jurista na Câmara de Leiria. “Em termos de convivência é cinco estrelas. Muito simpático”, sintetiza. A versão é repetida múltiplas vezes em Arouca. Mesmo assim, o professor fala das “travessuras” do Pedro João em miúdo. “Já em pequeno se metia em alhadas”, reconhece. Muitas vezes, diz, quem lhe valeu foram os pais. “Quando estava em dificuldades a família cobria-o”, constata.

Quando perguntamos a que dificuldades se refere, José Augusto fala em dívidas. Só isso. Desconhecia que em Fevereiro de 2010, o pai do neto fora condenado a pagar uma multa de 480 euros por um crime de ofensa à integridade física. E uns meses mais tarde, em Março de 2011, a um ano e 10 meses de prisão, com pena suspensa, por violência doméstica. Conhecia apenas que há cerca de dois anos as autoridades lhe apreenderam na Quinta dos Guardais alguns animais exóticos que teriam sido roubados.

Nada sabia sobre os insultos e as perseguições que visaram uma anterior companheira, veterinária em Aveiro, mãe da filha mais velha de Pedro João, uma menina de 10 anos. “O arguido, com a finalidade de assustar e limitar a liberdade de movimentos da ofendida e atemorizá-lo, durante largo período de tempo, estacionou, várias vezes, o veículo automóvel, em frente à [sua] residência (…) permanecendo, por vezes, horas no interior da viatura”, lê-se na sentença do tribunal de Aveiro.

Quando conheceu a veterinária, Pedro João já estava divorciado de uma enfermeira, que conhecera num internamento motivado por uma queda de cavalo. Estes animais proporcionam-lhe um novo amor: a veterinária dos cavalos da família. A união dura seis anos e dela nasce uma menina.

Em 2008 separam-se e, no ano seguinte, a antiga companheira apresenta uma queixa-crime que resultará, em 2011, numa condenação, confirmada nesse ano pela Relação de Coimbra. A discussão da guarda da menor não foi pacífica, mas em 2009, a menina é entregue à mãe. A decisão foi alterada há cerca de um mês. “A menina optou por ficar com o pai. Foi por vontade dela”, garante José Augusto. Facto é que a 20 de Setembro, o tribunal de Aveiro validou um acordo entre os pais que atribuiu a guarda da menor ao pai. “Face aos últimos acontecimentos, o tribunal efectuou diligências, tendo concluído que menina está muito bem cuidada, preservada das notícias que envolvem o pai”, afirma o juiz-presidente da comarca de Aveiro, Paulo Brandão, que confirma que a menor está a cargo dos avós paternos.

São eles um engenheiro agrónomo reformado e uma antiga professora de biologia, na casa dos 70 anos, que vivem no centro de Arouca. Além de Pedro João tem uma filha mais nova, bióloga marinha. “A família do pai era proprietária de metade da freguesia da Várzea”, conta Dario Pinto, antigo professor primário, amigo da família. “A mãe do pai era uma das donas de uma farmácia, que foi vendida há meia dúzia de anos”, explica Carlos Esteves, que foi comandante dos voluntários de Arouca mais de 30 anos e vizinho da família.

Confirma que montar a cavalo é uma das paixões de Pedro João, a par dos desportos radicais e da caça. Júlio Capela, não poupa elogios ao amigo, como ele, um aficionado pelas duas rodas. “Ultimamente ele tinha uma Honda 750 cc todo terreno”, precisa. De Pedro João recorda uma imagem: no dia da festa da Senhora da Lage, a ir de cavalo até à capela, em plena Serra da Freita. Com um adereço: um chapéu à cowboy.