Trump prepara derrota e põe em causa a legitimidade do vencedor
O sistema eleitoral está viciado e existe um complot internacional para a eleição de Clinton - no Twitter, Trump desfere feroz ataque à adversária. Esta noite, a Universidade do Nevada acolhe o último debate presidencial (às 2h em Portugal).
Em menos de 24 horas, a conta do Twitter do candidato do Partido Republicano à Casa Branca, Donald Trump, tornou-se um imenso repositório de mensagens a alertar os seus apoiantes para a fraude eleitoral que se prepara para o dia 8 de Novembro. É a sua nova táctica de campanha: preparar o terreno para uma previsível derrota nas urnas, distribuindo as culpas pelo establishment conservador e o sistema eleitoral “viciado”, e pondo em causa à partida a legitimidade democrática do vencedor da votação.
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Em menos de 24 horas, a conta do Twitter do candidato do Partido Republicano à Casa Branca, Donald Trump, tornou-se um imenso repositório de mensagens a alertar os seus apoiantes para a fraude eleitoral que se prepara para o dia 8 de Novembro. É a sua nova táctica de campanha: preparar o terreno para uma previsível derrota nas urnas, distribuindo as culpas pelo establishment conservador e o sistema eleitoral “viciado”, e pondo em causa à partida a legitimidade democrática do vencedor da votação.
Como manobra política, é totalmente inédita. Já não se trata de evocar algo de sensacional para virar o jogo, o que no caso do republicano implica corrigir o rumo de uma campanha indisciplinada e desorganizada, que está na defensiva desde a divulgação de uma gravação com comentários ofensivos que sugerem um comportamento de predador sexual. O que Donald Trump está efectivamente a dizer, quatro semanas antes de os norte-americanos exprimirem a sua vontade nas urnas, é que não vai aceitar nem respeitar as regras do jogo democrático – isto é, se estas interferirem com a sua ambição de tornar-se o Presidente dos Estados Unidos.
Com o favoritismo da sua adversária democrata Hillary Clinton a crescer nas sondagens, com o aparelho republicano a virar a agulha para as corridas do Congresso, e sob intensa pressão dos media, a campanha de Donald Trump tem reforçado uma narrativa que, dos dois lados do espectro político, tem sido denunciada como “perigosa”. Assenta por um lado nas teorias da conspiração – de que existe um complot internacional entre empresários estrangeiros e bancos de investimento, os jornais e a família Clinton para a eleição de Hillary, por exemplo – e por outro na suspeição das instituições, através da estigmatização e demonização dos seus dirigentes e de eleitores afro-americanos ou latinos.
O ruído que as novas alegações de Trump está a provocar dificilmente será ignorado no terceiro e último debate presidencial televisivo, esta noite. O derradeiro duelo acontece em Las Vegas, no estado do Nevada, território outrora solidamente conservador apesar da chamada Sin City e que por força da imigração e demografia tem virado à esquerda – elegeu Barack Obama em 2008 e 2012 com mais de 50% dos votos. Este ano, ainda está classificado como “estado indeciso”: na véspera do debate, as sondagens dão uma vantagem de quatro pontos a Trump.
Perante a desorientação da campanha de Trump, as expectativas de uma boa prestação são baixas. Os analistas dizem que o mais interessante será perceber se Hillary Clinton consegue manter a postura dos anteriores confrontos, atingindo o republicano com pequenas provocações que o fazem entrar em combustão espontânea. Experiente e disciplinada, sabe que nesta altura, basta-lhe não cometer erros.
O guião do debate, que será moderado pelo jornalista Chris Wallace da Fox News, inclui a economia, a imigração, as nomeações para o Supremo tribunal, política externa, e ainda questões sobre a aptidão dos candidatos para o cargo. O republicano será seguramente chamado a justificar as suas suspeitas e alegações de fraude eleitoral. Até agora não apresentou nenhuma prova concreta, e todos os estudos científicos – bem como todas as experiências eleitorais passadas – desmentem que esse risco exista: nos 834.065.926 boletins de voto depositados em todas as eleições realizadas nos Estados Unidos entre os anos 2000 e 2014, só foram encontradas 35 alegações credíveis de fraude.
Mas a campanha de Trump já provou que tanto o candidato como a grossa parcela de indefectíveis que tem consigo são indiferentes ou impermeáveis aos factos e ao contraditório. E como assinalam vários comentadores políticos, a fúria e divisão que a sua candidatura tem alimentado e promovido, poderá ter consequências muito nefastas, tanto no dia da votação, como no rescaldo eleitoral e nas condições para o exercício do mandato do futuro Presidente.
Questionado sobre as declarações de Trump na Casa Branca, o actual ocupate da Casa Branca, Barack Obama, tentou esvaziar a ansiedade que tomou conta de Washington. Se Hillary Clinton perder, fará um discurso de concessão cumprimentando o vencedor e disponibilizando-se para trabalhar com ele; se Donald Trump ganhar, será convidado para a Casa Branca para dar início à operação de transição do poder, garantiu o Presidente, lembrando que é assim que a democracia funciona na América há mais de 200 anos e que é impensável que não seja assim no próximo mês. Surpreendido pelas queixas – “irresponsáveis e sem precedentes” – do republicano contra o sistema eleitoral, Obama sugeriu que Donald Trump “se deixe de queixinhas sobre resultados viciados” e “apresente as suas ideias para obter votos”.
Trump passou todo o dia em comícios no estado do Colorado, onde está sete pontos atrás nas sondagens e nada indica que possa recuperar. A sua fúria no Twitter obscureceu a ronda de entrevistas da sua mulher Melania, que passou pela CNN e a Fox News para defender Trump das acusações de assédio sexual que têm vindo a público na sequência da divulgação do vídeo do Access Hollywood (e sugerir que o marido foi incentivado a fazer declarações chocantes pelo apresentador desse programa, Billy Bush, que entretanto foi despedido).
Com uma campanha tão errática, não admira que não convençam os sucessivos desmentidos de que a sua candidatura é apenas uma mega jogada de marketing para o lançamento das fundações de um novo império mediático de Trump.