Ainda o Orçamento do Estado
O Orçamento do Estado (OE) é apreciado, todos os anos, em versão a preto-e-branco, com os seus defensores a só falar da parte branca e os seus opositores a só falar do lado preto. O OE para 2017 não foge à regra. Também se ouve muitas vezes “Orçamento de Estado” em vez de Orçamento do Estado, conceitos nem sempre convergentes, bem pelo contrário.
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O Orçamento do Estado (OE) é apreciado, todos os anos, em versão a preto-e-branco, com os seus defensores a só falar da parte branca e os seus opositores a só falar do lado preto. O OE para 2017 não foge à regra. Também se ouve muitas vezes “Orçamento de Estado” em vez de Orçamento do Estado, conceitos nem sempre convergentes, bem pelo contrário.
Depois de lida a proposta, parece-me um OE resignado, apesar da redução dos défices nominal e estrutural. Do lado dos impostos, é mais do mesmo, quer dizer mais uns pozinhos de impostos e taxas, se possível, dissimulados, mais focos de instabilidade tributária que minam a confiança dos agentes económicos, “revogação de revogações” (sobretaxa do IRS). Aqui se constata o disparate de se ter reduzido a taxa do IVA sobre a restauração, impedindo o cumprimento pleno da eliminação da sobretaxa do IRS. Com que sentido social? Um “pormenor”: este ano não é apresentada a previsão dos impostos um a um. Porque será?
Do lado da despesa (com excepção de algumas boas iniciativas de simplificação administrativa) não se vê o efeito de nenhuma reforma estrutural. Continua tudo numa boa. E com optimismo. Por exemplo, como poupar 122 M€ na regra “2 por 1” de diminuição do emprego público, depois da reintrodução das 35 horas e sabendo-se que, na maioria, a saída conduz a um aumento do lado das pensões (CGA)?
A redução do défice em 0,8 pontos percentuais deve-se inteiramente a dois factores: aos estabilizadores automáticos (com a previsão de 1,5% de aumento do PIB real e de uma exagerada inflação de 1,5%), por via do aumento da receita tributária e diminuição do desemprego; e a “outros efeitos” que são o enorme valor dos dividendos do Banco de Portugal (305 M€) e uma possível recuperação da garantia do BPP (450 M€).
Um ponto que aplaudo é o do inadiável aumento de pensões. Mas é questionável não abranger as pensões não contributivas ou reduzidamente contributivas (pensão social e rural) e as pensões mínimas do regime geral. Diz o Governo que agora não são aumentadas nos tais 10 euros em Agosto (curioso mês para aumentos, antes das eleições autárquicas…) porque já tiveram acréscimos nos últimos 5 anos, ao contrário de todas as outras que foram congeladas. É um bom raciocínio aritmético, mas não é uma boa conclusão social. Afinal estamos a falar de prestações que, mesmo com os aumentos já verificados, se limitam a 202,34€/mês (pensão social, que tem condição de recursos) 242,79€ (rurais) e regime geral (263€) que poderiam ser sujeitos também a uma condição de meios. Lá está, voltamos às escolhas políticas: a redução do IVA da restauração (350 M€/ano) a limitar o aumento das pensões, desta forma tão pouco de “esquerda” …
Positivo é o alargamento aos 2º e 3º de vida das crianças do abono de família mais elevado que já existe nos primeiros 12 meses. Está também prevista uma nova prestação social única para deficientes, cuja ideia é meritória e simplificadora. Todavia, o modo como tal é anunciado no OE é, em bom português, intragável. Vejamos: “a configuração da nova prestação de deficiência materializar-se-á de forma a permitir uma integração de diferentes objectivos na arquitectura actual do sistema, tendo por referência a Lei de Bases, através de uma componente base, inspirada num princípio de cidadania, associada à compensação de encargos não específicos que derivam da condição de pessoa com deficiência ou incapacidade e de um complemento, que visa o reforço do princípio de solidariedade, enquanto elemento chave da cidadania[…]”. Percebido?