Quem tem medo dos palhaços maus?
Há uma partida assustadora que começou nos EUA e está a dar a volta ao globo: a dos palhaços assassinos. A polícia está preocupada.
Sente um arrepio na espinha. Alguém está a observá-lo. A rua está mais ou menos deserta, é de noite. Vira-se. E ao dobrar da esquina está um palhaço com sorriso malévolo desenhado a vermelho no rosto pintado de branco e uma faca de trinchar na mão, que pára por um momento e logo começa a correr com grandes passadas na sua direcção, com a mão da faca levantada. Não é um filme de terror, está mesmo a acontecer, a duas ruas da sua casa!
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Sente um arrepio na espinha. Alguém está a observá-lo. A rua está mais ou menos deserta, é de noite. Vira-se. E ao dobrar da esquina está um palhaço com sorriso malévolo desenhado a vermelho no rosto pintado de branco e uma faca de trinchar na mão, que pára por um momento e logo começa a correr com grandes passadas na sua direcção, com a mão da faca levantada. Não é um filme de terror, está mesmo a acontecer, a duas ruas da sua casa!
Esta é uma partida que pode estar a chegar perto de si em breve. É difícil dizer-lhe para não se assustar, porque o susto é quase garantido. Mas a “piada” que começou em Agosto no Sul dos Estados Unidos e já fez até a Casa Branca manifestar a sua preocupação, está a dar a volta ao planeta, e chegou recentemente à Europa. A coulrofobia – o termo psiquiátrico usado para o medo de palhaços está a conquistar o globo.
A polícia britânica tem tido várias alertas de avistamentos de palhaços assustadores, armados com facas, junto a parques, residências e até escolas, e já fez até detenções. Outros países têm alertas idênticos, como a Holanda ou até a Austrália e a Nova Zelândia. Já foram feitas algumas detenções.
Em Durham, no Norte de Inglaterra, quatro crianças, com idades entre 11 e 12 anos, foram seguidas no caminho para a escola na última sexta-feira por um homem vestido de palhaço que tinha uma faca na mão. “É muito assustador que tivesse uma faca, no entanto não acreditamos que tivesse a intenção de fazer mal às crianças. Tanto quando entendemos este fenómeno, isto faz parte da partida”, disse o sargento Mel Sutherland, da polícia local, citado pela Reuters.
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Tudo começou em Greenville
A partida que se tornou global, com o aproximar da noite de Halloween (31 de Outubro), começou em finais de Agosto, em Greenville, na Carolina do Sul. A polícia começou a receber queixas de que havia palhaços à beira das estradas, parados e silenciosos, a observar quem passava, ou perto de lavandarias, e que tentavam atrair crianças para ir para o bosque com sacos de dinheiro e luzes de laser verdes.
É uma história estranha. “Alguns tinham correntes, outros tinham facas, e alguns mostravam dinheiro, dizendo ‘venham cá, temos doces para vocês”, contou ao Washington Post James Arnold, morador numa urbanização de Greenville, sobre o que diziam estes palhaços aos filhos, de dez e 13 anos. Foi a sua mulher, Donna, que apresentou queixa à polícia sobre o incidente – e referiu expressamente a adaptação televisiva de It de Stephen King, sobre uma criatura sobrenatural, chamada Pennywise, que assume a forma de um palhaço para assombrar crianças e aterrorizar uma cidade do estado do Maine.
Os mais terríficos significados dos palhaços no nosso subconsciente colectivo vêm à tona com esta vaga de palhaços assustadores – que já se alargou a mais de uma dezena de estados norte-americanos, sem que se compreenda o que está na sua origem. Da Califórnia a Nova Iorque, o susto tem as autoridades em alerta e há várias hashtags nas redes sociais, como #IfISeeAClown e @ClownSightings no Twitter.
Stephen King, o escritor de suspense e terror que mais influência terá tido sobre o imaginário popular das últimas gerações, sentiu-se obrigado a vir tentar acalmar as massas – apesar de já noutras alturas ter havido ondas de pânico com palhaços. Esta, no entanto, está a ter grandes proporções. “Ei, malta, acalmem-se com a histeria – a maioria [dos palhaços] são bons, alegram os miúdos, fazem as pessoas rir”, disse no Twitter.
O palhaço assassino Pennywise inventado por King assombra os sonhos de muitos, em especial depois da adaptação televisiva de 1990 – e há um filme na calha, para estrear no próximo ano, com Bill Skarsgård no papel da criatura, o que levou alguns comentadores a sugerir que esta vaga de pânico fosse uma campanha de marketing gigante a preparar a estreia. Os produtores, no entanto, negam que assim seja.
Assustadores
Mas a verdade é que os palhaços estão longe de serem apenas figuras benignas e coloridas que fazem rir a infância. Um estudo de 2008 da Universidade de Sheffield (Reino Unido) analisou as reacções de 250 crianças com idades entre os quatro e os 16 anos, para ver se imagens de palhaços os animariam, durante um internamento hospitalar. Todas as crianças disseram sentir-se assustadas com os palhaços. “Poucas crianças gostam de palhaços. São estranhos e de outra época. Não são engraçados, são apenas esquisitos”, disse na altura à BBC a psicóloga Patricia Dunbar.
Um estudo publicado este ano na revista científica New Ideas in Psychology por investigadores do Knox College, do Illinois (EUA), que procurava determinar o que é que nos assusta ou repugna, chegava à conclusão, através de um inquérito a 1300 pessoas, de que não há ocupação profissional mais inquietante do que a de palhaço. Fica acima até de taxidermista, proprietário de sex-shop ou agente funerário.
“Pessoas que exibam padrões incomuns de comportamento não-verbal, ainda que possam não ser claramente ameaçadores, respostas emocionais invulgares ou características físicas altamente distintivas são fora do normal, e por definição imprevisíveis. Isto pode activar o nosso ‘detector de repugnância’ e levar-nos a aumentar os níveis de vigilância, para tentarmos discernir se há de facto algo a temer por parte da pessoa em questão”, escrevem os autores do artigo, Francis McAndrew e Sara Koehnke.
McAndrew disse ao Washington Post que algumas personagens da cultura popular, como o palhaço psicótico Twisty, da série televisiva American Horror Story, têm ajudado a espalhar o que parece ser uma complexa teia de pânico – alimentada tanto pelos que se vestem de palhaço para assustar como pelos que se assustam. “Os palhaços combinam numa tempestade perfeita uma série de coisas estranhas. São maliciosos e imprevisíveis, não se consegue dizer quem são ou o que são realmente, e há uma associação entre os palhaços e assassinos em série na vida real e nos filmes”, comentou.
Por isso, disse o professor de Psicologia Social, não é de esperar que esta vaga de palhaços assustadores se desvaneça rapidamente. “Pode acontecer em qualquer sítio, parece que toda a gente se diverte ou fica interessada com esta história. E provavelmente haverá um número suficiente de imitadores inspirados a continuar a vaga. Tem os ingredientes perfeitos para criar uma lenda urbana.”
Profissionais indignados
Pais, professores e polícia não ficarão contentes com esta avaliação. E muito menos os verdadeiros palhaços, que começam a organizar-se para ripostarem, dar uma contra-resposta organizada. O presidente da Organização Mundial de Palhaços, Randy Christensen, disponibilizou uma declaração no YouTube apelando à comunidade para que actue contra “os falsos palhaços”. “Façam-nos rir, provem que os palhaços não são assustadores, que é o lado que os media estão a evidenciar.”
“Quem está a fazer isto não é um palhaço, está a tentar usar uma forma de arte para se aproximar de crianças. Quero deixar isto claro”, diz Christensen. “Se alguém vier ter consigo com uma bata branca, dizendo que é um médico, mas trouxer uma serra eléctrica, não é um médico…”
Marsha Gallhagher, palhaça desde 1976, afirma que a paranóia tem feito com que os palhaços sejam menos requisitados e logo, tenham menos trabalho.
“Está a chegar a um ponto em que nos sentimos desconfortáveis em sair à rua vestidos da nossa personagem”, disse. “Mais do que perdermos o nosso rendimento, o que está em causa é perdermos a oportunidade de espalhar a alegria e ver os rostos das pessoas sorrir quando entramos na sala”, diz Gallhagher.
Talvez prova da loucura em torno das partidas dos palhaços assustadores, as lojas online que vendem disfarces carnavalescos nos EUA registaram um considerável aumento das compras de fantasias de palhaços, diz a Reuters. Na HalloweenCostumes.com, as vendas de fatos de palhaço subiram 40% este ano, e na HalloweenExpress.com venderam três vezes mais máscaras de palhaço, até agora. Oito das dez máscaras mais vendidas este ano são de palhaços maus, quando no ano passado apenas cinco das dez mais vendidas estavam nesta categoria.