Taxis vs. Uber, uma questão “insanável” na maioria

PCP admite levar ao Parlamento a legislação que regulamenta a actividade das empresas que se apresentam como alternativa aos táxis. PS considera que não será possível conciliar posições, embora diga que respeita a “autonomia” dos comunistas

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Um protesto contra “a lei da selva”, diz o PCP, e um “direito inalienável”, segundo o Bloco DR

Quando, no final da manhã de segunda-feira, os taxistas chegarem ao Parlamento para protestar contra a actividade das plataformas tecnológicas de transporte de passageiros, como a Uber e a Cabify, que o Governo se prepara para regulamentar, não vão ter à sua espera uma delegação de deputados do PCP. Mas não é por falta de solidariedade, pelo contrário…

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Quando, no final da manhã de segunda-feira, os taxistas chegarem ao Parlamento para protestar contra a actividade das plataformas tecnológicas de transporte de passageiros, como a Uber e a Cabify, que o Governo se prepara para regulamentar, não vão ter à sua espera uma delegação de deputados do PCP. Mas não é por falta de solidariedade, pelo contrário…

“Vamos estar no Porto, nas Jornadas Parlamentares do PCP, mas também desta vez iremos transmitir-lhes pessoalmente a nossa solidariedade”, esclarece o deputado Bruno Dias. O PCP tem uma posição muito clara sobre o assunto, e é oposta à do Governo. Enquanto o ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, considera no artigo que escreve no PÚBLICO que os taxistas estão a realizar “um protesto injusto”, Bruno Dias não podia estar mais em desacordo.

Para o deputado comunista, este é “um protesto contra a actividade ilegal, contra a legalização da concorrência desleal e contra a consagração de um estatuto de privilégio para multinacionais que agrava a precariedade e impõe a lei da selva”. Para Matos Fernandes, o serviço prestado pela Uber e a Cabify explica-se com outros argumentos: “Este é um fenómeno mundial, filho da sociedade da informação, e como qualquer serviço económico com esta génese cresce apenas com as regras do mercado, existindo porque os clientes o desejam.”

O Bloco de Esquerda não tem uma posição tão assertiva. O deputado Heitor de Sousa considera que os taxistas vão exercer na segunda-feira “um direito de expressão e de manifestação inalienável” e manifesta “toda a disponibilidade” para os receber em São Bento. Mas não escolhe um lado evidente neste debate: “Os taxistas e as suas organizações tiveram razão quando denunciaram a actividade ilegal que tem vindo a ser exercida pela Uber e empresas afins. Devem existir condições de equidade nas normas de acesso à actividade do táxi (exigência esta que não está salvaguardada na actual proposta do Governo, que considera tratamentos diferenciados para as várias empresas). É, no entanto, uma evidência que o sector do táxi precisa de ser modernizado. Este processo de modernização terá que garantir transparência na determinação das tarifas e percursos, assim como a utilização de plataformas electrónicas em tempo real e a alteração das regras de acesso à actividade, para acabar com o comércio subterrâneo de licenças. Além disso, preocupa-nos muito as situações de sobre-exploração e precariedade existentes nas várias empresas.”

O Governo pretende regulamentar a actividade destas novas empresas, concorrentes dos táxis, impondo algumas regras para a sua legalização. O diploma prevê, entre outras, a exigência de 30 horas de formação para os motoristas – quando aos taxistas são exigidas 150 horas de formação – e que disponham de um certificado de condução. Os carros usados neste serviço não podem ter mais de sete anos, têm de ser identificados com um dístico e pagar um seguro como os táxis. Será também obrigatória a passagem de facturas electrónicas para, afirma o ministro, impedir “a fuga ao fisco”.

Os taxistas consideram que esta legislação “abre as portas” na Europa à legalização deste tipo de concorrentes. E o PCP dá-lhes razão. “O sector do táxi está a defender que a lei seja igual para todos. Isso nem devia levantar dúvidas."

O assunto foi, por diversas vezes, abordado entre os comunistas e o PS. Bruno Dias lembra que “a posição do PCP é suficientemente conhecida para o Governo não a poder ignorar, por mais de uma vez confrontámos o Governo com a necessidade de encontrar uma resposta para estes problemas”, acrescenta o deputado. Fonte do PS, contactada pelo PÚBLICO, confirma que o assunto já foi discutido, mas considera que a divergência é “insanável”. No entanto, garante que este não é um tema que afecte as relações entre a maioria, sendo antes um ponto onde é possível a cada um dos partidos “mostrar a sua autonomia”. O ministro do Ambiente parece corroborar esta ideia: “Tivemos reuniões sérias e produtivas, ficando também claro que não estamos sempre de acordo.”

Bruno Dias ainda vê uma remota esperança num entendimento. “Se o Governo tomar a posição justa, não haverá decretos a legalizar a concorrência desleal e a colocar as pessoas nas mãos de multinacionais”, adianta ao PÚBLICO o deputado comunista. “Esperamos que assim seja. Isso resolveria o problema.”

Mas o Governo não vê as coisas da mesma forma, como prova a posição do ministro do Ambiente, Matos Fernandes, que garante pretender “propor para aprovação” em Conselho de Ministros, o diploma que o PCP contesta. Nesse caso, Bruno Dias deixa no ar a hipótese de o PCP não aceitar o decreto. “Se necessário faremos questão de não prescindir de nenhum dos instrumentos legais que estão ao nosso dispor”, afirma o deputado, quanto à hipótese de o seu partido levar o diploma a votos no Parlamento. O Bloco afirma que “em momento oportuno” levará ao Parlamento uma proposta própria. Sem o apoio explícito de nenhum parceiro, e com a oposição declarada do PCP, o Governo ficaria dependente dos votos de PSD e CDS para viabilizar a sua política.

paulo.pena@publico.pt