Divulgação de informações pessoais dos emigrantes foi vedada
Comissão Nacional de Protecção de Dados pronunciou-se contra facultação de moradas, contactos e outras informações por parte dos consulados de forma indiscriminada.
A Comissão Nacional de Protecção de Dados vedou o acesso generalizado por parte de terceiros a dados pessoais dos portugueses residentes no estrangeiro e inscritos nos postos consulares, por considerar tratar-se de informação pessoal.
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A Comissão Nacional de Protecção de Dados vedou o acesso generalizado por parte de terceiros a dados pessoais dos portugueses residentes no estrangeiro e inscritos nos postos consulares, por considerar tratar-se de informação pessoal.
Como o PÚBLICO noticiou em Agosto, pelo menos um consulado português, o de Madrid, avisou os emigrantes aí registados de que iria passar a facultar os seus dados — nome, filiação, morada, contactos, número de cartão de cidadão e de passaporte — a quem lhos pedisse, a não ser que o próprio manifestasse expressamente a sua vontade de manter essa informação em sigilo. Uma decisão tomada na sequência de um parecer da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos.
O objectivo do Ministério dos Negócios Estrangeiros ao facultar a informação a quem lha pedisse era responder aos pedidos de paradeiro que lhe chegam para tentar localizar portugueses residentes fora do país, provenientes na maior parte dos casos de "familiares e amigos", que precisam desses contactos para "poderem intentar uma acção judicial, enviarem um convite para um encontro ou evento e, no geral, para tratarem de assuntos de natureza particular".
Já depois de a situação ter sido noticiada, a Secretaria de Estado das Comunidades veio dizer que havia suspendido a disponibilização desta informação até que a Comissão da Protecção de Dados se pronunciasse sobre o assunto. Foi o que sucedeu no final do mês passado. Numa deliberação datada de 29 de Setembro, mas só esta sexta-feira tornada pública, a Protecção de Dados — que é uma entidade administrativa independente e funciona junto da Assembleia da República — começa por salientar não existir qualquer razão para os portugueses no estrangeiro terem os seus dados pessoais menos protegidos do que os residentes em território nacional. A ir por diante, esta seria por isso uma discriminação contrária à lei.
Ninguém pode deslocar-se a uma conservatória do registo civil, por exemplo, para obter a morada de terceiros. Sob pena de constituir devassa da vida privada, o acesso a esse tipo de dados só pode ser facultado pelas autoridades em situações muito excepcionais. Mesmo quando se trata de descendentes, ascendentes ou cônjuges, a divulgação do paradeiro de alguém depende dos motivos alegados em cada situação concreta, que têm de ser de força maior: "Mesmo os familiares apenas terão legitimidade [em aceder aos dados pessoais] se demonstrarem um interesse legítimo e se daí não decorrer um risco de intromissão na vida privada." Afinal, quem desapareceu pode não querer ser encontrado.
No caso de quem se encontra do país existem pelo menos duas situações em que estas regras podem não se aplicar: durante a ocorrência de catástrofes e em períodos de campanha eleitoral. "A lei reconhece legitimidade aos partidos políticos para obterem, junto do Ministério dos Negócios Estrangeiros, cópias dos cadernos de recenseamento, exclusivamente para promoção eleitoral — o que lhes permite enviar correspondência durante esse período, devendo os partidos eliminar a informação pessoal quando ele termina", explica a presidente da comissão nesta deliberação.
Em caso de catástrofe, calamidade pública ou outras situações de emergência, esta entidade reconhece também a possibilidade de serem preteridos alguns mecanismos de salvaguarda da privacidade para os familiares dos envolvidos poderem inteirar-se do seu estado de saúde. Mas não admite que isso suceda nas situações invocadas pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, a não ser que o posto consular se disponibilize a perguntar ao próprio se deseja ser localizado.
Por muito que possa ser boa a intenção de quem quer convidar alguém para um evento, e mesmo admitindo que a morada seja uma informação frequentemente divulgável na relação com entidades quer públicas quer privadas, "pode haver casos em que o acesso a esta informação constitua uma ameaça à segurança" do próprio e da sua família. É o que poderá suceder em relação à morada de professores de uma escola, dos árbitros dos clubes de futebol, dos titulares de cargos políticos ou de altos cargos públicos, exemplifica a Protecção de Dados.
ana.henriques@publico.pt