Guia para uma noite de combate
Um think tank fez uma lista a lembrar as regras que os candidatos à Casa Branca terão de cumprir. Há quem lance dicas aos moderadores. Ou ajude os espectadores a decidir onde seguir o duelo.
Conselhos aos candidatos
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Conselhos aos candidatos
Se as previsões se confirmarem, o confronto televisivo presidencial entre Hillary Clinton e Donald Trump (o primeiro de três) será o mais visto da história americana. Esperam-se 100 milhões de espectadores, só nos Estados Unidos. Convém não cometer erros. O think tank Brookings Institution aponta para seis regras que os candidatos deverão seguir. Elaborou-as olhando para as lições trazidas por 56 anos de debates.
A primeira: “Seja telegénico”. É lendário o confronto de 1960 entre o então vice-Presidente Richard Nixon e o senador democrata John F. Kennedy – “o primeiro debate presidencial da era da televisão”, recorda o instituto. Kennedy era jovem, bonito, talhado para a TV e com um aspecto descontraído. Nixon não usou maquilhagem, parecia mais velho do que era, tinha um ar exausto. Quem seguiu o confronto na rádio, achou que o republicano saíra vitorioso. Mas quem viu as imagens não teve dúvidas de que JFK ia ser o próximo Presidente dos EUA. O artigo do Brookings lembra que “ninguém, jamais, irá repetir os erros de Nixon” e que tudo agora, desde luzes a ângulos das câmaras, guarda-roupa, cabelos, é meticulosamente planeado.
Só 16 anos mais tarde os candidatos à Casa Branca concordariam em digladiar-se novamente em frente às câmaras. Mas quando o fizeram, em 1976, deixaram novas lições aos sucessores. A segunda regra manda “não cometer erros que reforcem as percepções negativas”. Na sua curta presidência, Gerald Ford era visto como alguém desajeitado, com tendência para tropeções. Ao dizer duas vezes a frase “não há um domínio soviético na Europa de Leste” apenas reforçou a imagem que os americanos tinham dele e foi o democrata Jimmy Carter quem ocupou a presidência.
A terceira regra aconselha a “aproveitar o debate para dar a volta à narrativa instalada à volta do candidato”. Em 1984, o Presidente Ronald Reagan tinha 73 anos e a sua idade era um tema de discussão na campanha. Quando no segundo debate a questão voltou a ser abordada, Reagan respondeu: “Não vou explorar a juventude e inexperiência do meu opositor para fins políticos”. Todos riram, incluindo o democrata Walter Mondale, que de qualquer forma tinha poucas hipóteses de vencer.
A quarta regra do Brookings: “Uma boa deixa na altura certa pode safar”. O democrata Michael Dukakis não teve jogo de cintura no debate de 1988 com George Bush, quando o moderador lhe perguntou: “Governador, se Kitty Dukakis fosse violada e assassinada, defenderia uma pena de morte irrevogável para o assassino?” A pergunta poderia ser de mau gosto, mas a frieza com que Dukakis respondeu, tendo em conta que o cenário colocado envolvia a sua mulher, deixou muitos eleitores mal impressionados.
O que leva à quinta regra: “Responder primeiro como um ser humano afectuoso e depois como um político sério”. Em 1992, Bush pai enfrentava Bill Clinton em frente às câmaras e a uma plateia em estúdio. Depois de olhar para o relógio, num gesto que parecia querer dizer que se dependesse dele o debate estaria terminado, George Bush teve dificuldade em responder à pergunta de uma mulher afro-americana sobre como a crise afectara os candidatos. Já Clinton dirigiu-se à mulher e mostrou “sentir a sua dor”, num gesto que ficou célebre, adianta o Brookings.
A sexta regra é parecida: “A empatia é importante”. Em 2000, o vice-Presidente Al Gore conseguiu a nomeação democrata e enfrentou George W. Bush. Se era verdade que Gore parecia talhado para a liderança, Bush, “o tipo que parecia não saber o nome dos líderes estrangeiros ou das capitais, era aquele com quem todos queriam ir beber uma cerveja”.
A última regra não precisa de grandes enquadramentos: “Nunca partir do princípio que a câmara não o está a filmar”.
Aos aconselhamentos do think tank podemos acrescentar uma dica dirigida a Donald Trump: Não mostrar condescendência, nem atacar abertamente Hillary Clinton. Um artigo da Time abordava a dificuldade de candidatos masculinos travarem combates políticos com mulheres. “A maioria dos eleitores não gostam de ver as candidatas serem atacadas nem tratadas com condescendência”, lê-se na revista. “E uma vez que os debates são muitas vezes o único espaço onde os candidatos partilham o mesmo espaço físico, a dinâmica de género pode tornar-se mais óbvia – e mais arriscada.”
No debate entre aspirantes à vice-presidência, em 2008, Joe Biden foi muito cauteloso e dirigiu todas as suas críticas e ofensivas não contra Sarah Palin, com quem debatia, mas contra o candidato à presidência John McCain. A Time refere que a táctica funcionou, apesar de o debate – que teve 70 milhões de espectadores (mais do que qualquer dos que juntou Barack Obama e McCain nessas eleições) – não ter tido grande interesse.
Para quem quiser rever todos os debates presidenciais desde 1960, o PBSNewsHour e a Microsoft criaram um site interactivo, escreve a revista Wired.
Avisos aos moderadores
Nem só os candidatos preparam intensamente estes momentos televisivos. Os moderadores também. O site Daily Beast ouviu jornalistas que conduziram várias emissões, tal como fará esta segunda-feira Lester Holt, da NBC, e lança sugestões. “O papel do moderador é manter a lei e a ordem”, comentou o antigo pivot da CNN Bernard Shaw (o mesmo que fez a pergunta a Dukakis sobre a pena de morte e que para alguns analistas continua a ser a pergunta mais controversa da história dos debates).
Jim Lehrer, da ex-PBS, moderou 11 debates presidenciais (um recorde) e aconselha: “A primeira coisa a fazer é ir ao espelho e dizer ‘isto não é sobre mim, isto não é sobre mim, isto não é sobre mim’. Depois de nos livrarmos disso, já podemos moderar”. E acrescenta: “Não é um espectáculo televisivo, é um acontecimento vital no gesto mais vital que temos enquanto cidadãos, que é votar, eleger o Presidente dos EUA. Todos os moderadores têm que ter isto em mente”.
Ambos insistem que a sua missão não inclui fazer a prova dos factos. “Não é o nosso papel corrigir um candidato”, afirma Shaw à Time. Lehrer adianta que actualmente os candidatos têm muito menos influência na escolha dos jornalistas, formatos, locais e datas dos debates. “A tarefa do moderador é ajudar a revelar quem são estas pessoas”.
Num blogue do Huffington Post, Matthew Chapman, director do ScienceDebate.Org, dá outro aviso: façam perguntas sobre ciência e tecnologia. O tema está sistematicamente afastado da conversa, afirma, mas os inquéritos mostram que é uma das preocupações dos eleitores: 91% dos democratas e 88% dos republicanos querem ver o assunto ser discutido.
Guia para os espectadores
Os três debates presidenciais vão ser transmitidos em directo pelas principais estações e canais por cabo: ABC, NBC, Fox, CBS, MSNBC, Fox News, CNN, Univision, ou C-SPAN, enumera a revista Wired. Para quem quiser seguir na Internet por streaming pode ir ao Buzzfeed News, The Daily Caller, Huffington Post, Politico, Yahoo, Telemundo ou Wall Street Journal. O debate realiza-se às 9h locais em Nova Iorque (2h em Portugal continental).
As redes sociais também vão estar em cima do assunto: Facebook Live, Twitter, Snapchat, e YouTube. Mas para quem quiser dar um passo mais ousado, a NBC vai fazer uma transmissão streaming em 360 graus, numa parceria com a AltspaceVR, que tem aplicações para várias plataformas: Oculus Rift, HTC Vive, e Gear VR. Mas escreve a própria Wired: “Não recomendamos a ninguém seguir o debate assim”.