FMI prevê PIB de 2017 com menos 4000 milhões do que o planeado pelo Governo

Alertas vindos de Washington sobem de tom. O FMI diz que um pequeno choque é tudo o que basta para Portugal sofrer um “efeito de espiral negativo”.

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Subir Lall, chefe de missão do FMI, esteve em Lisboa em Junho MIGUEL MANSO

Com uma visão muito mais pessimista do que o Governo em relação à capacidade da economia portuguesa para crescer, o Fundo Monetário Internacional (FMI) está a apontar para um valor do PIB em 2017 que é 4000 milhões de euros mais baixo do que o estimado pelo Governo no último Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC). Um valor que, não só ilustra a diferença abismal de expectativas entre as duas entidades, como representa o principal factor de risco para o cumprimento das metas orçamentais por parte do Executivo.

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Com uma visão muito mais pessimista do que o Governo em relação à capacidade da economia portuguesa para crescer, o Fundo Monetário Internacional (FMI) está a apontar para um valor do PIB em 2017 que é 4000 milhões de euros mais baixo do que o estimado pelo Governo no último Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC). Um valor que, não só ilustra a diferença abismal de expectativas entre as duas entidades, como representa o principal factor de risco para o cumprimento das metas orçamentais por parte do Executivo.

No relatório da quarta avaliação pós-programa a Portugal publicado esta quinta-feira, o FMI volta a mostrar de forma clara que não acredita que o país, nas actuais condições, consiga aumentar a velocidade da sua economia. Sem novas reformas estruturais, diz o Fundo, repetindo as previsões apresentadas já no passado mês de Junho, o PIB português não irá crescer em termos reais mais do que 1% este ano e 1,1% no próximo. No relatório, afirma-se que “a actual fraqueza no investimento e o abrandamento das exportações devem provavelmente manter-se durante algum tempo”, ao mesmo tempo que “a recuperação baseada no consumo pode ficar sem combustível num futuro próximo”.

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Do lado do Governo, pelo contrário, acredita-se sobretudo numa recuperação do investimento e das exportações, que poderá começar já nos últimos meses de 2016. No PEC, o plano do Executivo apontava para um crescimento económico de 1,8% tanto este ano como no próximo.

Mas o cenário negativo traçado pelo FMI não fica por aqui. Quando analisa os riscos que ainda se podem sobrepor a este cenário base já sombrio, a entidade liderada por Christine Lagarde deixa um aviso: basta que alguma coisa corra ainda pior no Orçamento, no crescimento ou nos bancos e Portugal pode ficar sujeito a um “efeito de espiral negativo” que colocaria a economia numa situação de grande debilidade, colocando mesmo em causa o acesso do país ao financiamento dos mercados.

Em comparação com as anteriores avaliações feitas a seguir à saída da troika– que já tinham um tom crítico e também pediam mais reformas estruturais e cortes na despesa pública – nota-se no relatório agora publicado uma subida de tom dos alertas em relação àquilo que que pode correr mal ao país se as políticas que têm vindo a ser seguidas não forem modificadas. Os técnicos do Fundo falam, nomeadamente, do risco de Portugal ficar com uma situação muito difícil de controlar, se o país se deparar com algum imprevisto.

“Portugal enfrenta uma multiplicidade de vulnerabilidades que se reforçam mutuamente”, afirma a entidade com sede em Washington, assinalando a existência de “três grandes áreas de fragilidade: o sistema bancário, as finanças públicas e o cenário macroeconómico”. “Problemas que surjam em alguma destas áreas podem produzir impactos nas outras, conduzindo potencialmente a um efeito de espiral”, avisa-se no relatório.

Nas finanças públicas – área em que o FMI volta a pedir uma consolidação do lado da despesa e em particular nos salários e nas pensões – o receio está centrado na reacção dos mercados e das agências de rating. “Qualquer desenvolvimento que piore a dinâmica da dívida pública pode desencadear uma mudança repentina no sentimento do mercado”, afirma, alertando para o efeito na economia e nos bancos de uma subida das taxas de juro.

Do lado dos bancos, mais uma notícia negativa de um sector que é considerado frágil pode significar mais um impacto negativo nas finanças públicas devido à necessidade de injectar capital e um efeito recessivo na economia, uma vez que as condições de acesso ao crédito se poderiam deteriorar.

Por fim, na economia, são vários os riscos assinalados, que se podem agravar no caso de ocorrência de uma crise inesperada no exterior. Um cenário dessa natureza pode significar um regresso à recessão com efeitos negativos óbvios nas finanças públicas e nos bancos.

É seguindo esta lógica que o FMI reforça o seu apelo a uma mudança de políticas. “Mesmo na ausência de qualquer desafio imediato, o fracasso em enfrentar estas fragilidades pode pôr Portugal numa trajectória de médio prazo insustentável e deixar o país vulnerável a choques”, afirma. E deixa um aviso que aponta claramente para o fantasma de um segundo resgate: "O baixo crescimento, a despesa pública por reformar e bancos frágeis (..) poderão levar à perda de acesso ao mercado, mesmo perante pequenos choques."

Numa reacção imediata ao relatório publicado pelo FMI, o Ministério das Finanças emitiu um comunicado em que responde às críticas, garantindo que "a actuação do Governo se pauta pelo rigor com que tem executado o Orçamento do Estado e o vigor com que tem implementado reformas estruturais, que visam dar resposta aos desafios da economia nacional". A equipa liderada por Mário Centeno reitera ainda "o compromisso assumido perante a Assembleia da República e os parceiros europeus" e defende que "os mais recentes dados da execução orçamental comprovam que o objectivo de consolidação orçamental será atingido".