Ex-comissária europeia omitiu que era directora de offshore nas Baamas
Depois dos Panama Papers, Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação divulga ficheiros de 175 mil empresas sediadas nas Baamas. Há 28 portugueses identificados.
A antiga comissária europeia da Concorrência Neelie Kroes foi directora de uma companhia offshore sediada nas Bahamas durante parte dos mandatos que exerceu em Bruxelas. Tal poderá configurar um incumprimento do Código de Conduta da Comissão Europeia, revela uma nova fuga maciça de documentos de paraísos fiscais divulgada pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação.
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A antiga comissária europeia da Concorrência Neelie Kroes foi directora de uma companhia offshore sediada nas Bahamas durante parte dos mandatos que exerceu em Bruxelas. Tal poderá configurar um incumprimento do Código de Conduta da Comissão Europeia, revela uma nova fuga maciça de documentos de paraísos fiscais divulgada pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação.
Quatro meses e meio depois de ter divulgado mais de 11 milhões de documentos dos ficheiros da firma de advogados Mossack Fonseca, sediada no Panamá, o Consórcio e as dezenas de jornais associados lançam um novo capítulo da investigação ao mundo – conhecido mas obscuro – dos paraísos fiscais, desta vez com epicentro nas Bahamas, outro dos destinos favoritos de particulares e empresas para contornar as máquinas fiscais dos seus países de origem.
Ao todo, nesta nova ronda, adianta o jornal Le Monde, a informação refere-se a um total de 175 mil empresas offshore registadas naquele arquipélago das Caraíbas desde 1990. Os documentos permitem conhecer o nome das sociedades registadas naquele paraíso fiscal e as datas de incorporação ou dissolução dessas empresas, bem como a identidade dos seus administradores e dos seus intermediários – entre os quais, a firma Mossack Fonseca. No entanto, ao contrário do que aconteceu com a fuga dos Panama Papers, a informação disponível não contempla nem a actividade nem o nome dos accionistas e beneficiários das empresas offshore.
Segundo explicam os jornalistas que investigaram os documentos, a principal razão para a constituição de uma sociedade (ou um fundo ou até uma fundação) no paraíso fiscal das Bahamas é a inexistência de impostos – sobre os lucros, o rendimento ou sucessórios. O outro motivo é a garantia de anonimidade, apesar da existência de um registo público.
O português Expresso, outro dos parceiros do Consórcio, identificou 28 portugueses como administradores de empresas ali sediadas, numa lista que não integra políticos, “sendo os nomes mais conhecidos” os de Micael Gulbenkian, sobrinho-neto de Calouste Gulbenkian, e Pedro Morais Leitão, ligado à empresa de telecomunicações brasileira Oi.
O jornal Guardian identifica também na lista (que integra mais de 25 mil nomes) a nova ministra do Interior britânica, Amber Rudd, que surge como directora de duas empresas que ali registadas entre os anos de 1998 e 2000. O diário britânico revela, no entanto, não ter indícios de que Rudd, estrela em ascensão do Partido Conservador, terá cometido qualquer ilícito.
O mesmo não parece ser o caso de Kroes, que foi comissária europeia nos dois executivos chefiados pelo português Durão Barroso – entre 2004 e 2009 como responsável pela pasta da Concorrência, depois à frente da estratégia digital da Comissão. O que o Bahamas Leaks agora revela é que, entre 2000 e 2009, a antiga política holandesa foi também directora da Mint Holdings Limited, um veículo criado por investidores próximos da família real dos Emirados Árabes Unidos para comprar activos da petrolífera americana Enron.
No entanto, o Código de Conduta da Comissão proíbe os membros do Executivo de deterem “qualquer outra actividade profissional, remunerada ou não”, sublinham os jornais do Consórcio, acrescentando que Kroes omitiu o nome da sociedade offshore quando, cumprindo as formalidades exigidas, apresentou em 2004 a lista de empresas para as quais tinha trabalhado nos dez anos anteriores. Contactada pelo Consórcio, a antiga comissária, actual consultora do Bank of America e da Uber, respondeu que foi apenas “directora não executiva” da sociedade.
Outros dirigentes internacionais cujo nome aparece nas listas obtidas pelo diário alemão Süddeutsche Zeitung como directores de empresas offshore das Bahamas são o vice-presidente de Angola, Manuel Vicente; o ministro das Finanças do Canadá, Bill Morneau, ou o ex-ministro das Minas da Colômbia, Carlos Caballero Argaez.