Como se reutilizam manuais riscando-os?
Governo deu orientações às escolas para que alunos usem manuais de forma “normal e máxima”.
Estamos no primeiro ano de uma nova política para os manuais escolares e ninguém espera milagres. O próprio Ministério da Educação admite não ser expectável ter uma taxa de reutilização dos livros “muito significativa”.
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Estamos no primeiro ano de uma nova política para os manuais escolares e ninguém espera milagres. O próprio Ministério da Educação admite não ser expectável ter uma taxa de reutilização dos livros “muito significativa”.
O que os pais não esperavam era descobrir tão cedo o paradoxo de uma medida que, em teoria, parecia inatacável.
Preocupado com o desperdício — eticamente errado —, o Governo de António Costa investiu três milhões e ofereceu os manuais a cada uma das 80 mil crianças que entraram no primeiro ano do básico. A proposta é simples: os alunos usam os manuais nos próximos nove meses e entregam-nos em bom estado às escolas no fim do ano lectivo. Aos pais, o ministério pediu apenas que comprassem os livros de fichas, por definição o lugar dos exercícios. Os manuais perduram, os livros de actividades vão para o lixo.
O início das aulas revelou no entanto uma questão prática que ultrapassa o desejo de mudança de mentalidades: os manuais adoptados pelas escolas estão carregados de exercícios. Têm aliás quase tantos exercícios como os livros de fichas. As crianças — que têm seis e sete anos — são convidadas a escrever, a colar, a rodear e até a pintar em praticamente todas as páginas.
Esta parte não é nova. Os truques usados pelas editoras para dificultar a reutilização dos manuais são velhos e bem conhecidos. O que é novo é a armadilha em que caímos agora. Entrámos num novo ciclo que pretende abanar o sistema e, no limite, poderia permitir que as famílias comprassem menos 240 mil manuais no próximo ano. Mas o ministério não pediu às escolas para encontrarem alternativas ao uso dos manuais e pediu até que haja uma utilização “normal e máxima” dos mesmos. E os professores insistem em dizer que é importante “exercitar a motricidade”, quando a motricidade pode ser explorada de muitas formas e não necessariamente dentro dos manuais. Se não quer pagar três milhões por ano em manuais novos, o Governo vai ter de fazer mais para pôr a reutilização em marcha.