Viciados em jogo podem chegar a 20 mil
Os números indicavam uma percentagem idêntica à de outros países.
Em Portugal deve haver entre 15 a 20 mil viciados em jogo, uma dependência que pode demorar até 10 anos a desenvolver-se, de acordo com especialistas presentes numa conferência internacional sobre jogo que nesta quarta-feira começou em Lisboa.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Em Portugal deve haver entre 15 a 20 mil viciados em jogo, uma dependência que pode demorar até 10 anos a desenvolver-se, de acordo com especialistas presentes numa conferência internacional sobre jogo que nesta quarta-feira começou em Lisboa.
Sob o tema “Desenvolvimento do invisível e desconhecido: pesquisa, responsabilidade e regulamentação”, a 11.ª conferência europeia sobre estudo e políticas do jogo junta dezenas de especialistas de outros tantos países até sexta-feira.
Um tema que em Portugal é pouco estudado, lamentou em declarações à Lusa o presidente da Sociedade Científica Ibero Latino-Americana para o Estudo do Jogo, Henrique Lopes, também investigador da Unidade de Saúde Pública do Instituto de Ciências da Saúde, da Universidade Católica.
Foi Henrique Lopes quem há quase uma década avaliou a epidemiologia do jogo em Portugal (e fundamentou a defesa de Portugal num processo no Tribunal Europeu de Justiça, que o país ganhou contra uma empresa austríaca de apostas) mas segundo o especialista mais nada foi feito desde então, quando se concluiu que havia entre 0,16 a 0,20 por cento da população potencialmente dependente.
Os números indicavam uma percentagem idêntica à de outros países e segundo Pieter Remmers, secretário-geral da Associação Europeia para o Estudo do Jogo (EASG, na sigla original) não há na Europa um aumento de viciados em jogo, apesar do aparecimento dos jogos na internet.
“Mais jogadores online não quer dizer mais adições. Há uma pequena minoria de patologias, não há uma grande percentagem e o problema não é tão grande como se pensa”, disse à Lusa, admitindo também que em Portugal a questão é pouco estudada.
E acrescentou Henrique Lopes: “é preciso estudar uma actividade que movimenta milhares de milhões de euros por ano”. Mas de acordo com o especialista nada se tem feito e dá um exemplo: a influência da raspadinha pode ser importante em grupos específicos e isso não se está a estudar.
“Hoje há coisas perversas no mercado como operadores que oferecem jogos de roleta para crianças com seis e sete anos. Quando for a dinheiro, daqui a 10 anos, qual será o resultado? Há novos riscos que não estão acautelados, há situações de saúde mental que aumentam enormemente a probabilidade de viciação”, alertou.
Faltam técnicos, faltam estudos epidemiológicos, falta trabalho em rede, disse explicando que em alguns países são os operadores de jogo quem têm de financiar esses estudos, uma questão de responsabilidade social que em Portugal não existe.
Mas em Portugal, como noutros países, quem mais joga é quem menos dinheiro tem. E há cinco anos foram mais de 10 mil os casos em tribunal ligados ao jogo. Henrique Lopes deixa ainda outro número: a probabilidade de suicídio em viciados em jogo é 30 vezes superior ao considerado normal (população relativa).
Portugal tem desde o ano passado uma nova lei do jogo e por causa dela foram fechadas dezenas de páginas de jogos na internet. Luís Coelho, director do Serviço de Regulação e Inspecção de Jogos, disse à Lusa que até agora já foram licenciados dois operadores para apostas desportivas e um para jogos de casino, havendo outros pedidos a ser analisados.
O responsável disse que a Inspecção mandou encerrar “uma quantidade assinalável” de páginas de jogos e admitiu que é “difícil monitorizar” a ilegalidade, sendo que as páginas ilegais são apetecíveis porque “ao não pagarem impostos podem pagar prémios mais elevados”.
A regulamentação do sector, disse, teve também como objectivo controlar comportamentos aditivos, por exemplo de crianças.
João Goulão, director do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD), disse que o jogo, um tema ainda pouco estudado, entrou pela primeira vez no plano de combate às dependências. “Tem aumentado os pedidos de ajuda”, disse o responsável à Lusa, acrescentando que o tema estará contemplado no relatório de 2017.