Sem terra fértil, o Japão procura metal no mar
Cientistas identificaram trilhos marítimos com pepitas herdadas da actividade vulcânica. Tecnologia está agora a facilitar a sua extracção.
A uma profundidade de 1600 metros e a 1500 quilómetros de Tóquio, começaram os trabalhos num novo solo para procurar metal no Japão, um país tão desprovido de recursos naturais que a maioria do que necessita tem de ser importado.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
A uma profundidade de 1600 metros e a 1500 quilómetros de Tóquio, começaram os trabalhos num novo solo para procurar metal no Japão, um país tão desprovido de recursos naturais que a maioria do que necessita tem de ser importado.
Como o país esgotou a maior parte dos minerais existentes em terra no boom económico que se seguiu à Segunda Guerra Mundial, os cientistas identificaram trilhos no solo marítimo, cheios de pepitas contendo desde cobre a ouro deixadas pela actividade vulcânica que criou o arquipélago há milhões de anos. A astúcia está em extraí-los com lucro, algo que um consórcio governamental vai começar a testar no próximo ano.
A mineração no oceano não é uma coisa nova – o Japão começou essa exploração nos anos 1970. Mas existem agora novas tecnologias que tornam mais fácil para empresas como a Nautilus Minerals Inc., do Canadá, recolherem do mar rochas ricas em minerais. Calcula-se existirem em águas japonesas mais de 50 milhões de toneladas métricas de minério e o Governo pretende ressuscitar o aprovisionamento interno e reduzir a dependência de importações. Quando Tóquio receber os Jogos Olímpicos de 2020, o precioso metal para as medalhas de ouro poderá vir já das profundezas do oceano.
"A ruptura no aprovisionamento de metais poderá ocorrer num futuro próximo", disse Tetsuro Urabe, geólogo director do programa governamental Tecnologia da Próxima Geração para Exploração de Recursos Oceânicos. "Não queremos entrar em pânico ao sermos confrontados com uma crise de cobre. A menos que desenvolvamos antes várias espécies de novas tecnologias, não vamos estar prontos para o arranque quando precisarmos."
Não é de admirar que os recursos minerais se encontrem intocáveis nas águas profundas que circundam o Japão. O país situa-se na Baía do Pacífico, ao longo de uma linha de vulcões e falhas conhecida como Anel de Fogo – uma região sujeita a tremores de terra e erupções vulcânicas. Quando ocorre actividade vulcânica no mar, o magma é impulsionado da crosta terrestre. Depois de arrefecer, os depósitos contêm minerais numa concentração muito maior do que a extraída da terra. Na escuridão das profundezas do oceano, os engenheiros usaram robôs controlados remotamente e sensores especiais para perscrutar o fundo do mar em busca dos depósitos mais promissores.
Sendo a terceira maior economia do mundo e um grande importador de tudo, desde minério de ferro até petróleo, o país pretende usar dos seus direitos para aceder aos minérios que se encontram no oceano e que um grupo industrial nacional calcula poderem valer 80 biliões de ienes (784 mil milhões de dólares). Ao abrigo da legislação marítima internacional, o Japão mantém uma área de 200 milhas náuticas (230 milhas) da sua costa, constituindo a sexta maior zona económica exclusiva do mundo.
Existem outras empresas a tentar também extrair minérios do leito do mar em águas perto da China, da Coreia do Sul e da América do Norte. Até ao momento, não existe nenhuma produção comercial, embora a Nautilus, com sede em Toronto, tenha em vista um projecto ao largo de Papua Nova Guiné, onde a companhia tenciona começar a mineração de ouro e cobre no primeiro trimestre de 2018.
Um consórcio japonês, liderado pela Mitsubishi Heavy Industries e pela unidade de engenharia da Nippon Steel & Sumitomo Metal Corp., vai levar a cabo a extracção e levantamento de minério nas profundezas de Izena, na área da ilha de Okinawa, no próximo exercício financeiro que começa em Abril. O Japão confirmou que o depósito tem cerca de 7,4 milhões de toneladas de minério, o dobro do que foi detectado há apenas três anos.
"Começaram a ser descobertos novos depósitos, uns a seguir aos outros", disse Mitsuya Hirokawa, director-geral adjunto do departamento tecnológico de extracção de metais da Japan Oil, Gas & Metals National Corp. (Jogmec), a empresa pública que ajuda a garantir o fornecimento de energia e metais e que está a apoiar este empreendimento no leito do mar. A área ao largo de Okinawa apresenta um dos "maiores potenciais", disse Hirokawa.
Extrair minério está a ficar mais barato. A Nautilus Minerals, num estudo efectuado em 2010, calculava que custaria cerca de 480 milhões de dólares construir um sistema de produção no solo marítimo no seu projecto Solwara 1 em 1600 metros de água ao largo da Papua Nova Guiné. Comparado com cerca de 1,5 a 2 mil milhões de dólares por um projecto semelhante em terra, declarou a empresa. Custaria cerca de 70 dólares por tonelada extrair o minério, que conteria uma média de 7% de cobre e seis gramas de ouro, revelou John Elias, um porta-voz da empresa numa mensagem de correio electrónico.
Mesmo com custos mais elevados associados ao facto de se trabalhar na água e ter de transportar o minério para terra para fusão, o gasto vale a pena devido a uma concentração de metal utilizável mais elevada do que a encontrada em terra, disse Yoshio Akiyama, investigador-chefe do departamento de tecnologia para extracção de metais na Jogmec. Recorrendo ao relatório da Nautilus, avalia os custos em 0,75 dólares por quilo para o cobre em comparação com 3,50 dólares numa mina em terra.
Estes empreendimentos comportam algum risco. O preço dos metais caiu abruptamente no ano passado, levando as empresas mineiras a cortar nos gastos e a fechar minas. Segundo Urabe, os projectos no fundo do mar levantam questões ambientais que têm de ser resolvidas. Existem também questões políticas. A zona ao largo de Okinawa fica junto de águas reclamadas, quer pelo Japão, quer pela China, que disputam as ilhas chamadas Senkaku em japonês e Diaoyu em chinês. A China está a pressionar o Japão com centenas de barcos de pesca e mais de uma dúzia de navios da guarda costeira espalhados pela área, enquanto o Japão responde com queixas formais de incursões na zona ao embaixador da China em Tóquio.
O Japão não se pode dar ao luxo de perder o acesso a minerais do solo marítimo, disse Takashi Sakamoto, director-geral do departamento comercial dos recursos submarinos na unidade de engenharia da Nippon Steel.
Bloomberg/PÚBLICO
Traduzido por Ana Isabel Palma da Silva