Santa Teresa de Calcutá, um exemplo da Igreja para os pobres

Perante 120 mil pessoas, Papa canonizou a freira albanesa que se tornou um ícone mundial pelo seu trabalho na Índia - mas é um símbolo cheio de problemas.

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Madre Teresa de Calcutá foi neste domingo declarada santa pelo Papa Francisco, numa cerimónia no Vaticano a que assistiram pelo menos 120 mil pessoas. A freira albanesa “distribuiu generosamente a misericórdia divina” e “fez ouvir a sua voz aos poderosos da terra, para que reconhecessem a sua culpa diante dos crimes da pobreza criada por eles”, afirmou o Papa.

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Madre Teresa de Calcutá foi neste domingo declarada santa pelo Papa Francisco, numa cerimónia no Vaticano a que assistiram pelo menos 120 mil pessoas. A freira albanesa “distribuiu generosamente a misericórdia divina” e “fez ouvir a sua voz aos poderosos da terra, para que reconhecessem a sua culpa diante dos crimes da pobreza criada por eles”, afirmou o Papa.

A canonização foi desacelerada por Bento XVI, depois de ter sido colocada numa via rápida pelo Papa João Paulo II, que a beatificou em 2003 – numa cerimónia que atraiu 300 mil fiéis a Roma. Mas o processo foi novamente apressado pelo Papa argentino, que coloca a ênfase do seu discurso nos pobres. Santa Teresa incarna o seu ideal da Igreja pobre para os pobres – ainda que tenha dito que “teria medo”, se esta pequena mulher determinada fosse sua superior.

“Para a madre Teresa, a misericórdia era o sal que dava sabor ao seu trabalho, a luz que iluminava a escuridão de todos os que não tinham sequer mais lágrimas para chorar pela sua pobreza e sofrimento”, disse o Papa da freira que trabalhou nos bairros de lata de Calcutá, na Índia, tratando dos “mais pobres dos pobres” com doenças infecciosas, e mais tarde abrindo clínicas para tratar os primeiros doentes de sida.

As condições miseráveis em que eram mantidas as suas clínicas, no entanto, despertaram sempre muitas críticas. O médico de Calcutá Aroup Chatterjee descreveu num livro de 2003 como encontrou nas instituições das Missionárias da Caridade, fundadas por madre Teresa, “uma cultura da frugalidade” levada aos extremos. Havia pouco mais que aspirina para apaziguar as doentes à beira da morte, as crianças eram atadas às camas e as seringas eram reutilizadas, recordou recentemente ao New York Times. As instalações eram rudimentares e os doentes tinham de fazer as necessidades à frente um dos outros.

Acusada de pouco fazer para aliviar a dor dos doentes terminais ou para tentar lutar contra as origens da pobreza, foi também acusada de querer converter ao cristianismo os mais pobres dos indianos, maioritariamente hindus.

Essas críticas ao trabalho de madre Teresa foram retomadas, com a virulência que lhe era característica, pelo autor e crítico Christopher Hitchens, ateu confesso, num livro e documentário com o título Hell’s Angel. Chamou-lhe “zelota” e “fanática”, recorda o New York Times, e acusou-a de ser “aliada do status quo”, ao instilar nos pobres a ideia de que a sua condição era permanente, em vez de lhes dar armas para procurar um futuro melhor.

Mas o Papa João Paulo II, que agora também é santo, era um fã do trabalho de madre Teresa, e foi contra o protocolo da Igreja Católica permitindo que se iniciasse o processo para a sua eventual canonização apenas dois anos após a sua morte, e não passados cinco anos, como habitual. Beatificou-a em 2003, reconhecendo um milagre – o da cura de uma mulher indiana cujo cancro desaparecera depois de ter rezado a madre Teresa.

Mas a narrativa de Monica Besra, a mulher que diz ter sido curada, tem sido posta em causa por médicos e autores. Além de ter tomado medicamentos durante vários meses, existe a possibilidade de não ter tido tumor maligno, mas sim um grande quisto.

Um segundo milagre, reconhecido pelo Papa Francisco no ano passado, abriu caminho à canonização. “Estou muito agradecido”, diz Marcílio Haddad Andrino, um brasileiro que garante ter recuperado de uma infecção cerebral que quase o matou em 2008, graças às preces da sua família a madre Teresa. Andrino foi convidado a ir a Roma e a participar numa conferência de imprensa no Vaticano.

Na Índia, no entanto, a nova santa Teresa era já há muito assim considerada. A cerimónia no Vaticano foi seguida com muita atenção em vários locais. Fiéis com ramos de flores agregaram-se junto do túmulo da freira desde bem cedo este domingo para celebrar a canonização. Todos os dias, as Missionárias da Caridade decoram o túmulo, em Calcutá, com uma palavra escrita com pétalas de flores.

“É um dia de alegria, um dia de gratidão, um dia de muitas bênçãos”, disse a irmã Mary Lysa, citada pela AFP. “As Missionárias da Caridade decidiram fazer deste dia uma celebração para fazer avançar a causa de madre Teresa, ao serviço dos pobres, dos que estão moribundos e dos doentes”, explicou.