Revolta olímpica
Quando um atleta português atinge um quarto, quinto, décimo ou 15.º lugar nos Jogos, eu tiro o chapéu. Ele está onde eu nunca estarei
Se a crítica injustificada fosse modalidade olímpica, nós tínhamos mais medalhas, certamente. Tivemos vários atletas, em diversas modalidades, que atingiram finais olímpicas e classificações entre os dez primeiros. Entrando nesse antro de excelência que são as redes sociais ou alguns jornais, lemos críticas aos atletas por falta de medalhas.
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Se a crítica injustificada fosse modalidade olímpica, nós tínhamos mais medalhas, certamente. Tivemos vários atletas, em diversas modalidades, que atingiram finais olímpicas e classificações entre os dez primeiros. Entrando nesse antro de excelência que são as redes sociais ou alguns jornais, lemos críticas aos atletas por falta de medalhas.
Como não percebo de desporto, vou escrever sobre um tema que me é caro: a estupidez. Por vezes, sou um distinto praticante da estupidez, pelo que irei escrever com conhecimento de causa. Escrever sobre uma área na qual tenho mérito comprovado é suficiente para me colocar, em termos de credibilidade, acima de ilustres escribas como Miguel Sousa Tavares, Vasco Pulido Valente ou Pacheco Pereira.
Os nossos atletas fazem um grande esforço mental, físico e financeiro (não recebem as fortunas dos futebolistas) para serem os melhores nas suas modalidades e chegarem aos Jogos Olímpicos. Lá chegados, alguns obtêm classificações que os colocam nos dez melhores do mundo. E muitos de nós, que não estão entre os dez melhores do mundo em nada, criticam a falta de medalhas.
Eu não estou entre os melhores do mundo em nada. Talvez pudesse estar no enfardamento de panados mas, mesmo aí, haverá indivíduos com muito melhores resultados do que eu. Por isso, quando um atleta português atinge um quarto, quinto, décimo ou 15.º lugar nos Jogos, eu tiro o chapéu. Ele está onde eu nunca estarei.
Se tivéssemos, para connosco, o mesmo grau de exigência que temos para com os desportistas, não havia "Miguéis Relvas" na política; as jotas não seriam bordéis de betos; conduzir em Portugal não seria como estar no "Velocidade Furiosa 16"; pagar impostos não seria motivo de uma comenda do presidente; ir a uma repartição pública para resolver um problema não seria como tentar descobrir onde está o Santo Graal; trabalhar não seria lidar com tanta gente que só tem pica para ler recibos de vencimento.
Mas queremos medalhas. Se as medalhas são tudo o que interessa, podemos contar com as dos nossos generais que, quando vão à televisão, vão caregados delas. Quando um general fala na televisão, o ecrã fica com tanta cor que sinto que estou a ver o "Star Wars".
Deixemos de tratar os nossos atletas como se o desporto fosse o único meio de sermos bons. Lutemos pelas medalhas nas provas que disputamos ao longo da vida. Tentemos realizar as proezas que interessam. Como, por exemplo, sermos capazes de enunciar, de memória, todos os campeões olímpicos dos 100 metros, desde 1896.