De militante do PS a fornecedor do Estado e do Governo
Dono da AEDIS tem um conjunto de empresas que têm trabalhado com o Estado quando o PS está no poder, quase sempre por ajuste directo. O mais recente trabalho registado no portal base foi para o encerramento da Volta Nacional do Simplex.
O que têm em comum o Congresso Mundial do Presunto de 2013 em Ourique, a tomada de posse de António Costa como presidente da Câmara de Lisboa em Novembro de 2009, o spot televisivo de apelo ao voto antecipado dos estudantes nas regionais dos Açores de 2008 e o encerramento da Volta Nacional de Apresentação do Programa Simplex 2016? A mão de empresas de Domingos Ferreira, um militante e ex-funcionário do PS.
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O que têm em comum o Congresso Mundial do Presunto de 2013 em Ourique, a tomada de posse de António Costa como presidente da Câmara de Lisboa em Novembro de 2009, o spot televisivo de apelo ao voto antecipado dos estudantes nas regionais dos Açores de 2008 e o encerramento da Volta Nacional de Apresentação do Programa Simplex 2016? A mão de empresas de Domingos Ferreira, um militante e ex-funcionário do PS.
Domingos Ferreira é o sócio-gerente da AEDIS – Assessoria e Estudos de Imagem, que é sistematicamente uma das maiores empresas fornecedoras do PS nas campanhas eleitorais sem que para isso passe por concursos. Dado os valores avultados que tem acumulado – só nas quatro eleições realizadas entre 2009 e 2011 chegou aos quatro milhões de euros –, o Tribunal Constitucional já “puxou” as orelhas ao PS, mas a avaliar pelas despesas das últimas legislativas nada mudou na relação do partido do Largo do Rato com as empresas do seu militante.
Uma consulta ao Portal Base, onde são registados todos os contratos do Estado, permite fazer algumas contas: seis das 17 empresas de que Domingos Ferreira é sócio tiveram nos últimos anos contratos no valor de um milhão de euros. Só António Costa pagou 117 mil.
A AEDIS cobrou 16.916,67 euros pelo aluguer do “equipamento de som e iluminação da tomada de posse dos eleitos locais pelo município de Lisboa” em 2009 e dois meses depois receberia 16.725 euros por fornecer, montar e desmontar o equipamento para a cerimónia da entrega de viaturas à PSP e à GNR, pagos pelo Governo Civil de Lisboa, liderado então pelo também socialista António Galamba. A somar aos 34.640 euros pelo evento do Simplex, a AEDIS facturou 68.281 euros.
À boleia da AEDIS, a Grandevento cobrou 25 mil euros pelo “serviço de registo e projecção de imagem” na tomada de posse de Costa em Lisboa. E a mesma câmara pagou a esta empresa 75 mil euros pela montagem do som e luz das comemorações do centenário da República (2010). Ao todo, a Grandevento recebeu do Estado 279 mil euros. Neste total estão 73.600 euros pelo aluguer de tendas para o Congresso do Presunto, em Ourique (autarquia PS).
Mas este congresso foi um repasto para Domingos Ferreira, que ainda facturou mais 52.300 euros pelo som e luz através da Servicepack. Esta empresa, que fornece audiovisuais e serviços e equipamentos informáticos e de som, teve 20 contratos no valor de 372 mil euros – e incluem oito com o Cefosap-Centro de Formação Sindical e Aperfeiçoamento Profissional, mas também com as câmaras de Matosinhos (independente) e Baião (PS), e a AICEP e a CCDR Norte no tempo de Sócrates.
A Sino AZ – Publicidade e Design fez em 2008 o spot televisivo do apelo ao voto (14.600 euros) e em 2010 recebeu 37.090 euros por serviços publicitários para reformular a identidade da Agência para a Modernização e Qualidade do Serviço ao Cidadão da região dos Açores.
Cinco contratos com a CCDO – Comunicação renderam a esta empresa do universo de Domingos Ferreira 149 mil euros. São todos já no tempo do Governo de Passos, mas o segundo mais caro (35 mil) é com a Fundação Inatel, presidida pelo socialista Vítor Ramalho. Os restantes são com a AEP (dois, por 37 mil), a Adene– Agência para a Energia (59 mil) e com o Turismo do Alentejo (18 mil).
E há ainda a Longo Alcance, de gestão de imagem e comunicação, que facturou com o Estado 209 mil euros entre 2008 e Março de 2011 – incluindo 100 mil euros da Câmara de Lisboa (75 mil pelas comemorações da República e 25 mil na cerimónia da tomada de posse de Costa).
Nos bastidores
A ligação ao PS é muito antiga e foi quase sempre mantida na sombra – e isto não é uma ironia. Há praticamente quatro décadas que Domingos de Pinho Ferreira é um dos homens dos bastidores socialistas – primeiro no Porto, depois em Lisboa. Regressado de Angola no pós-revolução, trabalhou no FAOJ, percursor do Instituto Português da Juventude. Filiou-se no PS em 1979 e no ano seguinte já é funcionário dos quadros do partido; ajudou a montar a máquina das campanhas e da angariação de fundos para o partido, chegou a ajudar a fazer o mesmo em Angola, no MPLA. Trabalhou com líderes socialistas como Jorge Sampaio, António Guterres, José Sócrates, António José Seguro. A AEDIS foi fundada há 19 anos para formalizar o que Domingos Ferreira fazia para o partido enquanto seu empregado: organizar os eventos.
Mas agora, em 2015, o universo do empresário é muito mais vasto. Em parte das 17 empresas de que é sócio-gerente tem como sócios os três filhos e há outras em que é sócio com outros empresários. E a actividade das várias empresas é muito diversificada: vai da assessoria e estudos de imagem à mediação imobiliária, passando por móveis e decoração, consultoria, organização de eventos, cabeleireiro, produção de espectáculos, informática, sistemas de som, impressão e comunicação. A larga maioria tem sede no Porto ou arredores (Matosinhos, Penafiel, Vila Nova de Gaia, Recarei), mas há também outra de Lisboa e uma de Ponta Delgada.
A AEDIS, que cobrou ao PS pelo menos 751 mil euros pela organização de dúzia e meia de grandes comícios da campanha eleitoral – essencialmente decoração e equipamento das salas, sistemas de som e iluminação – dedica-se à organização de feiras, congressos e eventos similares e está sedeada no Porto. Tem 12 empregados e em 2015 facturou 1,031 milhões de euros, o que faz do PS, de longe, o seu principal cliente – e apresentou lucros de apenas 1218 euros. Em 2014 os resultados tinham sido melhores: facturou 1,425 milhões e em 2013 chegara mesmo aos 3,164 milhões de euros.
O PÚBLICO contactou Domingos Ferreira mas não obteve resposta até ao fecho desta edição.