Os Jogos da superação política
Há barreiras físicas, mas também há barreiras políticas. Os Jogos Olímpicos servem para nos mostrar algumas das injustiças do mundo.
Nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro houve recordes incríveis, que nos fazem imaginar corpos biónicos com exosqueletos invisíveis.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro houve recordes incríveis, que nos fazem imaginar corpos biónicos com exosqueletos invisíveis.
Nelson Évora, que aos 32 anos era o atleta mais velho dos 12 que competiram na final do triplo salto (um tem 18 anos e quase todos andam pelos 25), ficou em sexto no ranking olímpico. Depois de todas as dificuldades e da brutal lesão que o afastou dos jogos de Londres, o resultado – o seu melhor do ano – teve sabor a medalha. Évora não está sozinho.
Os jogos do Rio estão a ser um exercício de incrível auto-superação para dezenas de atletas. Shaunae Miller, atleta das Bahamas, conseguiu ser campeã olímpica dos 400 metros com um raro mergulho para a meta – atirou-se em voo para o chão e o tronco (a parte do corpo que conta, segundo as regras) ultrapassou a meta antes dos pés. E conseguiu vencer. O velocista sul-africano Wayne van Niekerk, o novo recordista dos 400 metros, derrubou a marca “imbatível” de 43,18s que Michael Johnson conseguira há 17 anos e que era tida como um “recorde eterno”. Katie Ledecky, na natação, bateu recordes e venceu de uma forma inesquecível: terminou a prova, virou-se para trás, começou a festejar e só depois chegou a medalha de prata. Nos 10.000m, a etíope Almaz Ayana, outro ouro do Rio, tirou mais de 14 segundos à anterior melhor marca. O britânico Adam Peaty, de 21 anos, bateu o recorde mundial na prova dos 100 metros bruços não uma, mas duas vezes.
Mas as provas de auto-superação não são apenas físicas. Há duas mulheres cujas conquistas têm uma profunda força política. A brasileira Rafaela Silva, que cresceu na favela Cidade de Deus, no Rio, que Fernando Meirelles imortalizou em filme, e Simone Manuel, que é “a nadadora negra” dos EUA.
A primeira cresceu a ouvir que quem nasce pobre morre pobre e sem chegar a ter futuro pelo meio. Ganhou a medalha de ouro no judo. A segunda cresceu a ouvir dizer que “os negros não sabem nadar”. Por causa do racismo e da dificuldade que os negros tiveram em entrar em piscinas públicas durante décadas, já muito depois do fim da segregação oficial, ainda hoje as crianças negras morrem cinco vezes mais do que as crianças brancas por afogamento. Para que servem os Jogos Olímpicos? Também para mostrar ao mundo que o mundo deve mudar.