“A indústria do fogo dá dinheiro a muita gente”, admite secretário de Estado

Ouvido no Parlamento, Jorge Gomes avisou que “a previsão para os próximos dias é assustadora” e realçou que até agora se conseguiu “atingir o objectivo de não ter qualquer vítima entre os operacionais e a população” no continente.

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O secretário de Estado da Administração Interna foi ouvido no Parlamento Daniel Rocha/Arquivo

O aviso está feito: “A previsão [meteorológica] para os próximos dias é assustadora”, afirmou o secretário de Estado da Administração Interna esta tarde no Parlamento, que acrescentou que o alerta laranja vai ser prolongado pelo menos até domingo, dia 14. Mas garantiu que, apesar de os bombeiros estarem “exaustos”, o dispositivo “responde e está bem organizado”.

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O aviso está feito: “A previsão [meteorológica] para os próximos dias é assustadora”, afirmou o secretário de Estado da Administração Interna esta tarde no Parlamento, que acrescentou que o alerta laranja vai ser prolongado pelo menos até domingo, dia 14. Mas garantiu que, apesar de os bombeiros estarem “exaustos”, o dispositivo “responde e está bem organizado”.

Ouvido pelos deputados que o convocaram para fazer o ponto da situação dos incêndios que assolam o país, Jorge Gomes deixou algumas críticas ao facto de os incendiários apanhados em flagrante delito serem de imediato libertados e à extinção dos governos civis – “uma peça fundamental que conciliava muitos esforços” -, mas também outras mais indirectas.

“Há muito interesse por detrás disto tudo. Não me compete dizê-lo aqui; é um pensamento pessoal. Mas há quem diga que a indústria do fogo dá dinheiro a muita gente”, afirmou o governante depois de descrever o caso de Águeda, cujo incêndio” deflagrou às 4h05 com uma frente de cinco quilómetros de extensão”. E questionou-se: “Como se faz isto? Que recursos foram usados para fazer uma frente de arranque desta dimensão?”.

Jorge Gomes apontou as dificuldades acrescidas decorrentes do clima – o tempo seco e o vento -, da falta de alguns meios aéreos  por indisponibilidade dos parceiros europeus, da desertificação do meio rural que deixa boa parte do país “sem gente para vigiar”, da extinção dos governos civis – “uma peça fundamental que conciliava muitos esforços” -, da quantidade de material de combustão e da alta taxa de criminalidade nesta área – pelo menos 35% dos fogos começam de noite, ou seja, são “criminosos”.

Sobre esta questão, deixou uma crítica em forma de lamento. “Custa-me entender que um criminoso que é apanhado em flagrante delito pela GNR ou PJ seja apresentado a tribunal e vá para casa com obrigação de apresentação periódica às autoridades”, afirmou, recordando que quando foi governador civil do distrito de Bragança, neste tipo de situação o tribunal decretava prisão preventiva e os incendiários estavam fora de acção “pelo menos até Outubro”. Jorge Gomes vincou não estar a dizer mal da Justiça ou dos tribunais e que esta é apenas uma opinião pessoal. A ministra da Administração Interna já disse que se deve analisar “seriamente” a possibilidade de agravar as penas para crimes de incêndio.

Noutra matéria, o secretário de Estado contrariou, porém, as declarações da ministra que esta manhã, de visita à região Norte, a mais afectada no continente, se queixou da falta de solidariedade dos parceiros europeus. O secretário de Estado contou que o pedido de ajuda é feito através de uma plataforma europeia e que são os restantes Estados-membros que respondem sobre quais os meios que podem emprestar. De facto, não houve grande adesão. Então, Jorge Gomes descreveu que pegou no telefone e ligou para Itália. Que recusou porque o país está a ajudar a França que, por ter tido um acidente detectou um problema de segurança nos seus Canadair, os tem todos parados. A Croácia ofereceu um avião, mas entretanto precisou dele; a Espanha disponibilizou dois mas não dispõe de mais porque também está assolada por incêndios. Marrocos também se disponibilizou e já cá estão. À saída, aos jornalistas, haveria de admitir que os outros países poderiam ter feito um “esforço”.

Apesar de os últimos dez dias terem sido extremamente complicados em matéria de combate aos incêndios em Portugal continental, o secretário de Estado considera que se “verificou uma grande capacidade de reposta dos dispositivos e uma grande capacidade de reforço” dos meios operacionais. Realçou que se conseguiu “atingir o objectivo de não ter qualquer vítima entre os operacionais e a população” em território continental.

Durante a exposição inicial que fez perante os deputados, o secretário de Estado da Administração Interna deixou vários números de comparação entre o mês de Julho e os primeiros dez dias de Agosto para mostrar como toda a situação se complicou na passagem do mês. Jorge Gomes diz que o dispositivo actual “é idêntico ao de 2015” nesta fase Charlie (entre 1 de Julho e 30 de Setembro) – há 9800 operacionais efectivos, mas de 2000 veículos e 47 meios aéreos. O dispositivo de reserva chega também aos 10.000 bombeiros voluntários.

Até ao final de Julho registaram-se menos 41% de ocorrências (um total de 5158 este ano face às 8626 da média dos últimos dez anos) e ardeu um terço da área (7461 hectares este ano; 23.106 hectares em média na última década). Mas entre 1 e 10 de Agosto, nos dias mais calmos houve 250 ocorrências por dia e entre os dias 7 e 9 foram superiores a 400.