Arquitecto Joaquim Massena manda Bolhão para o Ministério Público
Autor de um projecto de requalificação, de 1998, do Mercado do Bolhão, diz que "não se vai calar" sobre o que diz serem "opções erradas"
O arquitecto Joaquim Massena apresentou, esta semana, uma participação ao Ministério Público, no Departamento de Investigação e Acção Penal do Porto, sobre o processo de reabilitação do Mercado do Bolhão. Massena, que é autor de um projecto de 1998 para o mesmo espaço, aponta quatro questões que, defende, merecem ser investigadas. A Câmara do Porto diz que as situações levantadas pelo arquitecto já foram esclarecidas.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
O arquitecto Joaquim Massena apresentou, esta semana, uma participação ao Ministério Público, no Departamento de Investigação e Acção Penal do Porto, sobre o processo de reabilitação do Mercado do Bolhão. Massena, que é autor de um projecto de 1998 para o mesmo espaço, aponta quatro questões que, defende, merecem ser investigadas. A Câmara do Porto diz que as situações levantadas pelo arquitecto já foram esclarecidas.
Para Joaquim Massena há, pelo menos, duas questões relacionadas com o projecto e o processo do Bolhão que violam a Lei de Bases do Património Cultural, e a primeira é a anunciada demolição das barracas do terrado do mercado. “É mentira quando dizem que as barracas não reúnem condições, elas estão impecáveis e são um modelo de construção notável, até ao nível dos materiais, já que têm riga na sua composição”, diz. O arquitecto argumenta que as barracas não estão em ruína nem a sua demolição se dará por causa da “primazia de um bem jurídico superior ao que está presente na tutela dos bens culturais”, pelo que não há justificação para que venham a desaparecer do edifício classificado. Questionado sobre o facto de tanto a Direcção Regional de Cultura do Norte como a Direcção-Geral de Cultura terem emitido pareceres favoráveis a esta demolição, Joaquim Massena argumenta: “A lei diz que são nulos os actos administrativos que infrinjam o que está definido como passível de demolição”.
Questionada pelo PÚBLICO, fonte da assessoria de imprensa da Câmara do Porto diz estar tranquila em relação à participação de Massena, referindo, em relação a este ponto concreto: “Há uma entidade que defende o património e que tem que se pronunciar e isso foi feito”. O mesmo argumento é utilizado para outra questão levantada pelo arquitecto – a inexistência de um estudo de impacto ambiental que acompanhe a intervenção que está já a decorrer, e que implica o desvio de uma linha de água que passa sob o Bolhão.
Joaquim Massena defende que a intervenção pode ser “perigosa”. “Não se desvia um rio assim, até porque as fundações do Bolhão estão assente sobre um aterro, e não lhe podemos retirar a humidade de repente. Esta situação pode criar problemas até às construções envolventes”, diz. A câmara, pela mesma fonte, começa por dizer que o que passa sob o Bolhão “não é um rio” e, de novo, diz ter seguido as indicações das entidades competentes. “A empresa Águas do Porto pediu um parecer à Administração Regional Hidrográfica do Norte, actual Agência Portuguesa do Ambiente, que é a entidade competente nestas matérias, e a obra foi aprovada. Caso fosse necessário um estudo de impacto ambiental por questões legais ou porque eles entendiam que era preciso, tê-lo-iam exigido”, diz.
As outras duas questões apresentadas pelo arquitecto ao Ministério Público prendem-se com o encerramento do mercado e a transferência dos comerciantes para outro espaço, pelo período estimado de dois anos, enquanto decorrem as obras (o que, de acordo com Massena, também viola a lei) e a construção do túnel de acesso à cave técnica, que classifica como “uma obra faraónica” e que, diz, irá sobrecarregar o trânsito da zona. “Não me vou calar, faço isto por uma questão cívica. Não quero que os meus netos e os netos dos meus amigos digam, daqui a uns anos, que ninguém falou, quando estavam a tomar estas opções erradas”, diz. A câmara diz que as opções tomadas nesta matéria já foram "devidamente explicadas", em concreto, na reunião extraordinária do executivo sobre o Mercado do Bolhão.
O arquitecto já fizera uma participação à Procuradoria-Geral da República e ao Tribunal de Contas, em 2015, sobre o processo integral do Mercado do Bolhão, mas o caso foi arquivado. Além de prometer outras iniciativas futuras, Joaquim Massena está a preparar um livro sobre o caso, que deverá estar concluído ainda este ano.