O poeta regressa ao Sul e Querença presta-lhe homenagem
Casimiro de Brito, com mais de 40 livros publicados, traduzidos em 30 línguas, vai ser homenageado neste sábado no Festival Literário de Querença, que reúne autores portugueses e espanhóis na aldeia da sua infância. As cigarras deram-lhe as boas-vindas ao revisitar a casa do avô.
Durante três dias, a aldeia de Querença vai respirar poesia. Dos ramos das oliveiras vão nascer versos, suspensos em folhas de papel. O cenário está montado, aguardam-se os “autores em palco” para as conversas com os leitores, cruzando as culturas do Algarve e Andaluzia. A primeira edição do Festival Literário de Querença (FLIQ), a decorrer desta sexta-feira a domingo, vai homenagear Casimiro de Brito - um escritor algarvio com mais de 40 livros publicados, traduzidos em 30 línguas. Em casa do avô - fonte de inspiração do autor – a leitura disponível, noutros tempos, resumia-se a cinco livros de cordel.
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Durante três dias, a aldeia de Querença vai respirar poesia. Dos ramos das oliveiras vão nascer versos, suspensos em folhas de papel. O cenário está montado, aguardam-se os “autores em palco” para as conversas com os leitores, cruzando as culturas do Algarve e Andaluzia. A primeira edição do Festival Literário de Querença (FLIQ), a decorrer desta sexta-feira a domingo, vai homenagear Casimiro de Brito - um escritor algarvio com mais de 40 livros publicados, traduzidos em 30 línguas. Em casa do avô - fonte de inspiração do autor – a leitura disponível, noutros tempos, resumia-se a cinco livros de cordel.
A escolha do primeiro escritor a homenagear neste festival, Casimiro de Brito, foi “consensual”, refere Patrícia de Jesus Palma, coordenadora do festival e também comissária da exposição “Entre Mil Águas – A Vida Literária de Casimiro de Brito”, a inaugurar neste sábado. Foi nesta aldeia, em casa dos avôs, que o poeta aprendeu a “olhar o mundo”, da serra para o mar. Nesta quinta-feira, ao subir ao Cerro do Bufo, no sítio dos Corcitos, numa visita acompanhada pelo PÚBLICO, redescobriu o canto das cigarras. “Podia viver na Gronelândia, andar pelos mais de 70 países que conheço, mas há sempre uma coisa que se chama regresso ao Sul”, confidenciou, enquanto os insectos faziam uma pausa.
Esse “regresso” à casa centenária da sua infância, explica, percorre as suas criações. Mas, agora, ao pisar o chão da eira onde o avô debulhava o trigo, veio-lhe à memória as vozes da terra. “Um encanto maravilhoso, que ultrapassa o âmbito da escrita”, confessou. Ao longo de 62 anos de vida literária, Casimiro de Brito reparte a escrita entre a poesia, ensaio e a filosofia. De repente, nesta espécie de itinerância pelos caminhos da infância, dá um salto de Querença para Loulé, onde o pai possuía uma taberna: “Foi ao colo de António Aleixo que ouvi o primeiro poema”, recorda. O poeta, guardador de rebanhos, ia todas as manhãs dizer a “quadra do dia” à tasca do pai. “Quando for grande, quero ser isto [poeta]”, jurou o então miúdo. O sonho cumpriu-se e depois de ter recebido várias distinções no país e no estrangeiro, finalmente recebe reconhecimento público no concelho onde nasceu. “Satisfaz muito o meu ego a minha terra lembrar-se que eu existo”, comentou
Os livros de cordel, cinco na totalidade, constituíam a biblioteca do avô, em Querença. O trabalho no campo não deixava tempo para leituras, mas as vivências davam lições de filosofia que passavam de geração para geração. “Há mais mundos, dizia o meu avô – e ele nunca tinha saído daqui”. Casimiro de Brito confessa que, na altura, não percebia o alcance da frase. Com o decorrer dos anos, este e outros ensinamentos, desenterrados do pó da memória, diz, “ocupam um espaço central" na sua vida.
Este ano passam 60 anos sobre a publicação dos seus primeiros textos, dados à estampa na Voz de Loulé, onde fundou e dirigiu a página literária “Prisma de Cristal”. Dando início, nesse espaço, a uma “polifonia dramática que é a marca da sua obra”. Patrícia de Jesus Palma lembra ainda que, a partir do Algarve, na década de 1960, foi autor de obras “marcantes” na literatura portuguesa – Cadernos do Meio-Dia, colecções como A Palavra e Silex ou Poesia 61.
Os diálogos à volta da escrita, no decorrer do Festival, não se fazem só com palavras. Ao fim da tarde, depois das conferências, as histórias são acompanhadas com vinho da região e petiscos, em ambiente poético. O primeiro dia é dedicado aos escritores andaluzes. Por isso, no Jardim das Oliveiras, da Fundação Manuel Viegas Guerreiro (FMVG) – entidade promotora da iniciativa – haverá ainda uma Feira do Livro Ibérico e sessões de autógrafos. No conjunto das iniciativas programadas, a decorrer em vários espaços públicos da aldeia, participam cerca de duas dezenas de escritores, oito dos quais espanhóis. No domingo à tarde, na Igreja Matriz, chega o momento dos autores debaterem a presença de “Deus na poesia”. Do outro lado do átrio da Igreja, no Pólo Museológico da Água, a investigadora Sónia Tomé falará sobre “Poética(s) da água”.
Patrícia de Jesus Palma explica que a ideia de convidar autores espanhóis partiu da necessidade de “aprofundar o diálogo dos escritores que vivem no Algarve (não necessariamente algarvios)” com os colegas da vizinha Andaluzia. O Algarve, sublinha, “conhece na actualidade um pujante movimento criativo que alcança a expressão literária". Neste festival das letras, à sombra das árvores ou no auditório da FMVG, diz a organização, não faltarão motivos para discutir a literatura portuguesa contemporânea. O Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias da Faculdade de Letras de Lisboa (CLEPUL) é outra das entidades parceiras do FLIQ - evento que todos os anos pretende vir a distinguir um autor.