Haitong propôs ao BdP solução para o Novo Banco à margem do concurso
Banco chinês e Fundo de Resolução vão conversar em Setembro. Novo Banco terá a partir desta semana o terceiro presidente em dois anos.
O presidente executivo do Banco Haitong, José Maria Ricciardi, informou o Fundo de Resolução de que este banco, associado a outros investidores, pode avançar com uma oferta de capitalização e de aquisição parcial do Novo Banco. Ficou já acordado que Ricciardi regressará ao Banco de Portugal em Setembro para formalizar a proposta.
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O presidente executivo do Banco Haitong, José Maria Ricciardi, informou o Fundo de Resolução de que este banco, associado a outros investidores, pode avançar com uma oferta de capitalização e de aquisição parcial do Novo Banco. Ficou já acordado que Ricciardi regressará ao Banco de Portugal em Setembro para formalizar a proposta.
Dias antes de 30 de Junho, a data limite para os grupos que tinham levantado o caderno de encargos de venda do Novo Banco apresentarem ofertas vinculativas, o Fundo de Resolução, gerido pelo Banco de Portugal (BdP), foi contactado pelo Banco Haitong (ex-BESI). A iniciativa deu-se à margem do concurso público e quando se avolumavam os sinais de que as autoridades enfrentavam dificuldades em passar a instituição para a esfera privada nos termos planeados.
O PÚBLICO tentou confirmar a informação junto do BdP e do Haitong, mas ambos declinaram pronunciar-se. O PÚBLICO apurou, no entanto, que o encontro decorreu nas instalações do BdP no final de Junho e teve como protagonistas José Maria Ricciardi e o ex-secretário de Estado das Obras Públicas, Sérgio Monteiro, que está encarregue de vender o Novo Banco. Monteiro fez-se acompanhar de membros da sua equipa.
Na altura, Ricciardi explicou que o Haitong admitia promover a entrada de novos investidores no Novo Banco, por subscrição de um aumento de capital entre 1500 e 2000 milhões de euros, passando a deter à volta de 30% das acções. O Fundo de Resolução, um instrumento público dotado de verbas injectadas pelo resto do sector, que teve financiamento estatal, manter-se-ia maioritário no Novo Banco até à dispersão em bolsa dos títulos na sua posse. Para Ricciardi, esta alternativa dotaria a instituição de transição de uma marca e dava tempo para a reorganizar e a reestruturar.
Na mesma reunião realizada em Junho, Sérgio Monteiro solicitou então a Ricciardi que formalizasse uma proposta detalhada, tendo o banqueiro adiantado que precisava de tempo para o fazer. E os dois combinaram voltar a sentar-se à mesa em Setembro, caso o concurso público de venda, ainda a decorrer, não tenha sucesso – um cenário que obrigará o BdP a activar o plano B: disseminar em bolsa parte do capital do Novo Banco, abrindo a porta a vários interessados.
Embora os contactos oficiosos do Banco Haitong com o Fundo de Resolução não fossem conhecidos, Ricciardi já tinha levantado o véu sobre o que pretendia. A 8 de Junho, ao Expresso, defendeu um modelo semelhante ao seguido na privatização da TAP e disse ainda que procurava um comprador: “Primeiro devia ser feita uma capitalização, com um aumento de capital. Mais tarde, far-se-ia uma venda, através de uma oferta pública (IPO) em bolsa, já com o banco a gerar rentabilidade.” O Haitong adquiriu em 2015, por 379 milhões de euros, o banco de investimento BESI, ao Novo Banco.
O plano do Haitong tem pontos idênticos ao plano que foi defendido no Verão de 2014 por Vítor Bento, o primeiro presidente do Novo Banco, e que foi na altura recusado pelo supervisor e pela ex-ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque. O Governo de Passos Coelho estava apostado em fechar o dossier antes das eleições de 2015, o que se acabou por revelar um erro, na medida em que o concurso público ficou vazio.
Vítor Bento deixou o Novo Banco em Setembro de 2014, para dar entrada a Eduardo Stock da Cunha, que volta agora para o britânico Lloyds Bank. Nesta segunda-feira, António Ramalho assume a presidência do Novo Banco, tornando-se o terceiro presidente em dois anos. É um regresso ao sistema financeiro, depois de, entre 2010 e 2012, ter integrado a Comissão Executiva do BCP, como vice-presidente de Carlos Santos Ferreira. Antes passou pela Unicre (2006 a 2010) e pelo antigo Banco Totta, agora Santander.
Desconhece-se que missão concreta e que projecto foi pedido a Ramalho, mas não é previsível que o gestor, com larga experiência na banca, tenha deixado a liderança da empresa pública Infraestruturas de Portugal (que resultou da fusão da Rede Ferroviária Nacional com a Estradas de Portugal) para promover a liquidação do Novo Banco ou para ficar por seis meses para preparar a venda rápida. Tudo indica que Sérgio Monteiro confia em Ramalho para “comandar” o Novo Banco nos próximos anos, num contexto em que o Fundo de Resolução se manterá no capital. A criação do grupo empresarial do Estado, Infraestruturas de Portugal, foi apadrinhada pelo ex-secretário de Estado das Obras Públicas. Na altura, Ramalho estava na CP e Estradas de Portugal, tendo sido o escolhido para ser o número um do IP, após a fusão entre a empresa de estradas e a gestora da rede ferroviária.
BdP decide em Setembro
No começo de 2016, o Fundo de Resolução abriu pela segunda vez um concurso público para alienar o Novo Banco. Foram levantar o caderno de encargos o Santander (que entretanto desistiu), o BCP (que acabou por entregar apenas “uma carta de interesse com um determinado perfil”), o BPI e os fundos de investimento anglo-saxónicos Centerbridge, Apollo e Lone Star. Mas apenas concretizaram as intenções o BPI, o Centerbridge e, em conjunto, os fundos Apollo e Lone Star.
Inicialmente o BdP admitia que o processo negocial estaria fechado no começo de Agosto, o que está mais uma vez comprometido. Desde logo porque as três propostas exibem diferenças substanciais de valores e de conteúdos. E também estão protegidas por muitas condicionantes, o que, na prática, se pode traduzir em não ofertas. Este quadro já obrigou o Fundo Resolução a nova ronda de conversas (que estão a decorrer) e que, a não ter sucesso, vai culminar no plano B: a dispersão das acções em mercado de capitais.
O BdP já comunicou que anunciará a sua decisão em Setembro. E é a opção pelo plano B que vai ao encontro da posição do Haitong, e também do Millennium BCP, cujo presidente, Nuno Amado, já mostrou interesse na possibilidade de entrar no Novo Banco, mas por via da compra de acções no mercado de capitais.
O BCP, entretanto, anunciou que a chinesa Fosun (que em Portugal é dona da seguradora Fidelidade e da Luz Saúde) está interessada em tornar-se accionista deste banco. Neste sábado, num comunicado à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, o BCP informou ter recebido uma proposta firme de investimento daquele grupo chinês, que pretende subscrever um aumento de capital do banco, reservado apenas a si, de modo a ficar com 16,7% da instituição. A Fosun manifestou interesse em subir mais tarde essa participação para valores entre os 20 e os 30%. Uma eventual entrada da Fosun no capital do BCP – e o consequente aumento de capital – pode ajudar o BCP na corrida à compra do Novo Banco.
Os atrasos no fecho do dossier Novo Banco fizeram disparar a pressão sobre as autoridades e sobre o banco. O Governo já informou Bruxelas que “não considera a possibilidade” de nova ajuda estatal e adiantou que se o banco não for vendido até Agosto de 2017, entrará num processo ordeiro de liquidação. Em Agosto de 2014, a instituição foi capitalizada com 4900 milhões de euros: o Estado português entrou com 3900 milhões e os restantes bancos do sistema com 1000 milhões. Em 2015, Stock da Cunha anunciou prejuízos de 980,6 milhões. No primeiro semestre deste ano, os prejuízos foram de 362,6 milhões de euros.